Cora Coralina, uma das poetas mais queridas do Brasil, morreu no dia 10 de abril de 1985, aos 95, há exatos 38 anos, em Goiânia, por complicações de uma pneumonia. Nascida Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas em 1889, ela viveu altos e baixos, só pôde publicar sua poesia aos 75, ficou famosa nacionalmente quando Carlos Drummond de Andrade escreveu uma crônica sobre ela, e é lembrada até hoje pelos versos de Minha Cidade (leia abaixo) e de O Prato Azul Pombinho, entre outros poemas, e pelas receitas dos doces que fazia em seu fogão a lenha.
Leitura obrigatória dentro e fora da escola, a obra de Cora Coralina é formada por livros de poemas e crônicas, para adultos e crianças.
Confira a seguir curiosidades, histórias, livros, poemas e a receita do doce de leite de Cora Coralina.
Como Cora Coralina começou a escrever poemas
Ainda menina, aos 14 anos, Cora começou a escrever poemas. Isso foi por volta de 1903, quando a produção literária de mulheres não era valorizada, e ela guardou seus escritos na gaveta. Seguiu escrevendo, e guardando - até casada, já que o marido não a deixava mostrar seus poemas. A vida foi seguindo seu rumo, o marido morreu, os filhos cresceram, o dinheiro encurtou, os doces viraram seu ganha-pão e, aos 75 anos, ela finalmente publicou seu primeiro livro: Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais (1965). Sua obra é publicada pela Editora Global.
Os livros de Cora Coralina
Cora Coralina só publicou três livros em vida – Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais (1965), Meu Livro de Cordel (1976) e Vintém de Cobre – Meias Confissões de Aninha (1983). Hoje, são encontrados mais de 15 títulos nas livrarias, incluindo um livro de receita e volumes para crianças.
Cora Coralina na educação
A obra de Cora Coralina é amplamente usada na edução. Em 2019, o Estadão contou a história Ebe Lima Siqueira, professora de Literatura Brasileira da Universidade Estadual de Goiás e uma das fundadoras da Associação Mulheres Coralinas, na cidade de Goiás, que usa a obra de Cora para educar e promover a afirmação de mulheres. Leia aqui a matéria.
Cora, o sapinho
Em 2020, pesquisadores batizaram uma nova espécie de anfíbio encontrado em Goiás com o nome da poeta e doceira mais famosa da região. Trata-se de uma espécie minúscula de um anfíbio, que mede entre 1,25 cm e 1,53 cm, revelada por um grupo de pesquisadores das universidade estaduais de Campinas (Unicamp), Paulista (Unesp), e da Universidade Federal de Uberlândia. Foi o pesquisador Felipe Andrade quem batizou esse pequeno anfíbio de Pseudopaludicola coracoralinae.
Filme sobre Cora: entre a biografia e a ficção
O filme Cora Coralina: Todas as Vidas, de Renato Barbieri, que estreou no final de 2017, buscou retratar a poeta para além da imagem da senhorinha que escrevia poemas e preparava doces na casa às margens do Rio Vermelho, na cidade de Goiás. No elenco, Walderez de Barros, Camila Salles, Maju de Souza, Camila Márdila e Teresa Seiblitz. O filme está disponível na plataforma Looke e Google Play.
Poemas
Leia a seguir o poema Minha Cidade
Goiás, minha cidade...
Eu sou aquela amorosa
de tuas ruas estreitas,
curtas,
indecisas,
entrando,
saindo
uma das outras.
Eu sou aquela menina feia da ponte da Lapa.
Eu sou Aninha.
Eu sou aquela mulher
que ficou velha,
esquecida,
nos teus larguinhos e nos teus becos tristes,
contando estórias,
fazendo adivinhação.
Cantando teu passado.
Cantando teu futuro.
Eu vivo nas tuas igrejas
e sobrados
e telhados
e paredes.
Eu sou aquele teu velho muro
verde de avencas
onde se debruça
um antigo jasmineiro,
cheiroso
na ruinha pobre e suja.
Eu sou estas casas
encostadas
cochichando umas com as outras.
Eu sou a ramada
dessas árvores,
sem nome e sem valia,
sem flores e sem frutos,
de que gostam
a gente cansada e os pássaros vadios.
Eu sou o caule
dessas trepadeiras sem classe,
nascidas na frincha das pedras.
Bravias.
Renitentes.
Indomáveis.
Cortadas.
Maltratadas.
Pisadas.
E renascendo.
Eu sou a dureza desses morros,
revestidos,
enflorados,
lascados a machado,
lanhados, lacerados.
Queimados pelo fogo.
Pastados.
Calcinados
e renascidos.
Minha vida,
meus sentidos,
minha estética,
todas as vibrações
de minha sensibilidade de mulher,
têm, aqui, suas raízes.
Eu sou a menina feia
da ponte da Lapa.
Eu sou Aninha.
Receitas
Cora Coralina era uma cozinheira de mão cheia e foi vendendo seus famosos doces glaceados que ela conseguiu comprar a parte que faltava para ela ser a única dona da Casa Velha da Ponte. Abaixo, a receita de seu doce de leite - a primeira é exatamente como ela escreveu; a segunda, adaptada por outras doceiras para tempos mais light.
Doce de leite
5 litros de leite, 1 quilo de açúcar, pedaços de casca de limão, se gostar, ou canela em pau.Leve ao fogo o tacho com o leite, o açúcar e a canela até que, reduzido e grosso, forme uma massa leve e que deve ser batida, fora do fogo, sempre com uma colher de pau.
O doce deve ser batido mais ou menos, conforme a finalidade: se for para ser cortado empedaços, deverá ser mais batido e, depois, despejado em tabuleiro para esfriar e cortar; se for para ser comido com colher, deverá ser menos batido.
Nota: bater o doce vai torná-lo macio.
Ingredientes:
- 3 litros de leite
- 4 ovos
- 3 xícaras (chá) de açúcar
- 1 pau de canela ou casca de 1 limão
Preparo:
Coloque o leite e o açúcar em uma panela ou tacho e leve ao fogo com um pires virado para baixo (no fundo do tacho) para que o leite não derrame. Deixe ferver até que comece a engrossar, retire o pires, coloque o pau de canela e mexa sem parar, até dar a consistência de um creme. Retire do fogo e coloque em uma compoteira. Sirva gelado. Se preferir o doce em pedaços, deixe mais 20 minutos em fogo baixo, mexendo sempre. Despeje em um tabuleiro para esfriar e corte.
Dica da Vicência, filha de Cora: Para o leite não talhar, coloque uma colherinha (café) de bicarbonato, quando o doce começar a engrossar
Como Cora Coralina morreu
Uma gripe que evoluiu para uma pneumonia foi a causa da morte de Cora Coralina
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