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Ele colecionou máquinas de escrever de Hemingway, Lennon e outros gênios. Agora começa a despedida

Steve Soboroff montou uma coleção barulhenta de máquinas que já foram de Ernest Hemingway, John Lennon, Shirley Temple, Andy Rooney e até de um terrorista, que agora vão a leilão; conheça

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Por David Waldstein

THE NEW YORK TIMES - Você nunca sabe o que vai encontrar na máquina de escrever de uma pessoa famosa. A velha máquina de Joe DiMaggio tinha fragmentos cortados de seu cartão de banco vencido. Steve Soboroff, que comprou a máquina de escrever do jogador do Hall da Fama do New York Yankees em 2011, encontrou os pedacinhos embaixo das teclas enquanto as limpava.

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Soboroff também descobriu fotos da infância de Ernest Hemingway na Underwood Standard Portable (1926) do escritor. Mas a maior descoberta de Soboroff com essas máquinas – entre elas máquinas de escrever pertencentes a Maya Angelou, Tennessee Williams, John Lennon e Shirley Temple – foi uma ligação histórica com grandes personalidades.

“Para mim é muito difícil desistir”, disse Soboroff numa videochamada no final de novembro passado.

Soboroff construiu a coleção ao longo de vários anos, muitas vezes encontrando pequenas surpresas dentro das caixas das máquinas de escrever Foto: Desiree Rios/The New York Times

Depois de vinte anos montando aquela que talvez seja a maior coleção de máquinas de escrever do mundo, Soboroff está colocando todas as suas 33 amadas máquinas em leilão. Possui-las foi um privilégio, diz ele, e cada uma vem com uma história singular que alimentou a paixão de Soboroff.

Por exemplo: Soboroff desistiu de um acordo com a atriz Angelina Jolie, recusando-se a se desfazer da máquina de escrever de Hemingway depois que ela concordou em pagar US$ 250 mil pelo item. Embora as reportagens da época indicassem que foi Jolie quem desistiu do negócio, Soboroff disse que cancelou a transação quando soube que ela pretendia dar a máquina ao então marido, Brad Pitt, para ele usar. Soboroff poderia ter permitido que Pitt trabalhasse nas máquinas de Harold Robbins ou Mae West, disse ele, mas a máquina de escrever de Hemingway era sagrada.

“Naquela época, o dinheiro cairia bem”, disse Soboroff.

“Mas ninguém vai tocar na máquina. A máquina de escrever de Ernest Hemingway? Sem chance”.

Agora outra pessoa terá a oportunidade de possuí-la, porque, depois de duas décadas com a responsabilidade de proteger, expor e transportar as máquinas de escrever por todo o país para promover seus legados, Soboroff, 75 anos, já não tem energia para tanto. E o dinheiro ainda cairia bem.

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Parte dos lucros será doada à Jim Murray Memorial Foundation, que homenageia o ex-colunista esportivo do Los Angeles Times concedendo bolsas de estudo para estudantes de jornalismo. Soboroff é fã de longa data dos Los Angeles Dodgers e reverencia a escrita de Murray. A máquina dele foi a primeira que Soboroff comprou, em leilão, ainda em 2005. A partir daí, colecioná-las virou uma devoção.

Empresário radicado em Los Angeles e ex-comissário do Departamento de Polícia de Los Angeles, Soboroff comprou a maior parte das máquinas de escrever em leilões, embora algumas tenham sido adquiridas diretamente de familiares ou do proprietário anterior.

Tom Hanks, ele próprio renomado colecionador, deu a Soboroff sua Hermes 3000 depois que os dois se conheceram e conversaram sobre seu amor por máquinas de escrever. E, em 2012, não muito depois da morte do jornalista Andy Rooney, Soboroff contratou um agente imobiliário de Connecticut para ir à venda de garagem da família na casa de Rooney e oferecer US$ 5.000 pela amada Underwood Model 5, ano 1929, de Rooney.

O colecionador enviou um agente imobiliário, que já havia trabalhado na C.I.A., para conseguir a Underwood Model 5 de 1929 de Andy Rooney em uma venda de garagem Foto: Desiree Rios/The New York Times

O homem que Soboroff contratou era um agente aposentado da CIA e, apesar da fila de três horas para fechar a venda, ele conseguiu entrar e comprar a máquina. Soboroff disse que horas depois recebeu uma oferta de US$ 125 mil da CBS, ex-empregadora de Rooney. Ele recusou.

As máquinas de escrever são pequenas máquinas de gravação imperfeitas, gosta de dizer Soboroff, e exigem mais interação física do que os laptops de hoje. Algumas exalam personalidade, uma alma mecânica, como um carro antigo ou o violino de um maestro. A conexão com seus proprietários originais aumenta a mística.

“É muito difícil encontrá-las porque alguns herdeiros não querem abrir mão delas”, disse Soboroff. “As pessoas vendem roupas, fotos. Mas não vendem a máquina de escrever”.

Coleção de máquinas de escrever de propriedade de Steve Soboroff está indo a leilão. Entre os destaques da oferta estão máquinas que pertenceram a Ernest Hemingway, Andy Rooney, Shirley Temple e Ted Kaczynski Foto: Desiree Rios/The New York Times

Ainda não se sabe o valor total da coleção. A Heritage Auctions está cuidando da venda, que vai até o dia 15 de dezembro em Dallas, e os itens seriam vendidos separadamente. No ano passado, Soboroff doou seis de suas máquinas de escrever ao Smithsonian. Elas tinham pertencido a John Lennon, Elia Kazan, Jerry Siegel (cocriador do Super-Homem), Orson Welles, DiMaggio e Angelou e foram avaliadas em uma média de US$ 250 mil cada.

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“Não cabia a mim ter a máquina de escrever de Maya Angelou”, disse Soboroff. “Ela pertence ao povo americano. Não cabia a mim ter a máquina de escrever de John Lennon”.

Mas ele permitiu que o ator Pierce Brosnan digitasse na máquina de Lennon em troca de uma doação de US$ 5 mil para a fundação Murray. E emprestou a de Siegel para convenções de quadrinhos, onde as pessoas ficavam em filas por horas para escrever notas curtas na mesma máquina de escrever usada para criar diálogos do Super-Homem.

Ao fazer sua doação permanente, Soboroff permitiu que o Smithsonian escolhesse algo de sua coleção. A instituição dispensou as máquinas de escrever de Greta Garbo, John Updike, Philip Roth, Jack London e Gore Vidal, bem como a máquina Braille de Andrea Bocelli. E recusou o modelo de Hemingway porque já possuía uma. Quem comprar esta Hemingway também receberá os negativos, as impressões das fotos e os envelopes guardados dentro da caixa.

Quando Soboroff viu os negativos pela primeira vez, ele os confundiu com tiras de bacon velhas. O primeiro que tocou virou pó, então ele pegou o resto com uma espátula e levou a um restaurador, onde as fotos foram reveladas.

Sandra Spanier, professora de inglês na Penn State University e editora do Hemingway Letters Project, classificou as fotografias como uma “descoberta extraordinária”.

“Encontrar dentro de uma máquina de escrever negativos do início do século 20, quando Hemingway era criança na casa de sua família, é uma ligação bastante sólida com Hemingway”, disse ela.

Soboroff disse que especialistas da Biblioteca e Museu Presidencial John F. Kennedy, que abriga uma vasta coleção de arquivos de Hemingway, compararam o tipo de letra para confirmar que era a máquina de escrever do escritor. Ele disse que a investigação forense mostrou evidências de palavras de desespero gravadas no rolo. Ele acredita que podem ser alguns dos últimos pensamentos datilografados por Hemingway, antes de ele se suicidar, em 1961.

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A Underwood Standard Portable de Hemingway, de 1926, quase foi vendida para a atriz Angelina Jolie, mas Soboroff ficou desconfortável com o negócio quando percebeu que ela pretendia usar a máquina em vez de exibi-la Foto: Desiree Rios/The New York Times

Uma das máquinas de que Soboroff provavelmente não sentirá falta é a Montgomery Ward Signature Portable 440T 1968, de propriedade de Ted Kaczynski, também conhecido como Unabomber. Ele pode tê-la usado para escrever parte de seu manifesto antes de ser capturado e condenado a quatro sentenças de prisão perpétua.

Soboroff comprou a máquina de escrever do governo dos Estados Unidos, em parte porque os lucros iriam para as vítimas e suas famílias. Ele então usou a mesma máquina para escrever uma carta para Kaczynski, já na prisão, e fez três perguntas a respeito. Uma delas era sobre o paradeiro da maleta para transporte, que Soboroff sabia que Kaczynski tinha usado para fazer uma bomba. Kaczynski respondeu – “com uma caligrafia assustadora”, lembrou Soboroff – que só responderia às perguntas depois de verificar a identidade de Soboroff.

Dois meses depois, Soboroff recebeu outro bilhete que dizia: “Você não é quem eu pensava que era. Azar o seu”.

“Estou no Palm em Beverly Hills”, disse Soboroff. “Ele está cumprindo 665 anos em segurança máxima e me diz que o azar é meu? Decidi que não queria mais ter amigos na prisão”.

Máquina de escrever 1968 Montgomery Ward Signature Portable que pertenceu anteriormente a Theodore Kaczynski, também conhecido como Unabomber Foto: Desiree Rios/The New York Times

Soboroff disponibilizou a maior parte da coleção para exibição em museus, universidades e eventos especiais e pede aos compradores que também exibam as máquinas de escrever publicamente. Ele datilografou os pedidos por escrito – com alguns erros de digitação – em sua Monarch 101, de 1937.

A máquina não tem botões para deletar, muito menos para recortar e colar. Só o clique-claque da história. “É emocionante para mim”, disse ele. “Espero que seja para as pessoas que as comprem também”.

Este artigo foi originalmente publicado no New York Times.

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/ TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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