Entenda como o banimento de livros ameaça a democracia

Nos EUA, autoras como Margaret Atwood e Toni Morrison tiveram suas obras ameaçadas

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Por Margaret Sullivan
Atualização:

Quando Suzanne Nossel veio com a PEN America em 2013, a participação de longa data da organização defensora da liberdade de expressão na Semana de Livros Banidos lhe parecia um pouco fora de sintonia com os tempos. “Parecia tão arcaico”, me disse recentemente Nossel, executiva-chefe da PEN. Mas, agora, de repente, “esta é uma questão de urgência nacional”.

Quase todos os dias vemos uma nova notícia sobre conservadores tentando estigmatizar ou remover completamente de escolas ou bibliotecas públicas uma lista crescente de livros. Alguns exemplos deste último front da interminável e exaustiva guerra cultural americana.

A escritora canadense Margaret Atwood Foto: Dylan Martinez/ Reuters

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No sudoeste da Flórida, as escolas públicas do condado de Collier colocaram um adesivo de advertência em 110 livros – entre eles os clássicos literários Amada, de Toni Morrison, e I Know Why the Caged Bird Sings, de Maya Angelou.

No maior distrito escolar de Utah, as autoridades recentemente retiraram das prateleiras das bibliotecas mais de 50 livros, muitos dos quais sobre questões de gênero e homossexuais, depois que os pais reclamaram que não eram adequados. (“Não fizemos queima de livros nem nada”, disse um porta-voz do distrito ao Salt Lake Tribune, observando que alguns livros podem ser devolvidos após uma análise mais aprofundada. “Mas estamos sendo proativos com aqueles sobre os quais ouvimos preocupações”).

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E em Llano, Texas, uma única reclamação de uma única moradora a respeito de livros que falam sobre sexualidade, gênero e raça (“imundice pornográfica”, ela acusou) na seção da biblioteca pública para jovens leitores provocou um expurgo de textos que vão desde In the Night, de Maurice Sendak Kitchen, ao aclamado Between the World and Me, de Ta-Nehisi Coates. Isso desencadeou um alvoroço após o qual as autoridades dissolveram o conselho da biblioteca, fecharam as reuniões ao público e demitiram um bibliotecário que se opôs às medidas.

No Texas, umas única reclamação foi o suficiente para banir um livro

Na semana passada, caminhando por uma exposição da Sociedade Histórica de Nova York, “Um século de defesa da palavra escrita”, relacionada ao centenário da PEN America, fiquei impressionada com uma fotografia em particular: uma imagem perturbadora em preto e branco de livros sendo destruídos numa grande fogueira em Berlim no ano de 1933, com um espectador levantando o braço numa saudação nazista.

Pedi que Nossel colocasse o que está acontecendo agora no contexto histórico. Já vimos isto antes? Ela respondeu que certamente existem paralelos em outros países, como sugere aquela foto de Berlim, mas que ela saiba, nos Estados Unidos, isto nunca aconteceu neste nível de intensidade e alcance.

“O que se destaca agora é um esforço sistemático para travar a guerra política e a guerra cultural usando nossas escolas e bibliotecas como campo de batalha”, disse ela. Apontando para uma pilha de livros que foram proibidos ou ameaçados ao longo dos anos – de O conto da aia, de Margaret Atwood, ao livro de memórias de Maia Kobabe, Gender Queer, alvo preferencial nas bibliotecas escolares hoje em dia – a co-curadora Bridget Colman observou que esta era apenas uma pequena amostra. “Dá para preencher esse espaço todo com livros proibidos”.

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Lombada icônica dos livros da Penguin Random House Foto: Stefan Wermuth/Reuters

O que podem fazer os americanos que valorizam a liberdade de expressão?

Markus Dohle, executivo-chefe da Penguin Random House, que cresceu na Alemanha do pós-guerra e trabalhou em sociedades repressivas na Europa e na Ásia, está fazendo uma doação pessoal de US$ 500.000 para combater a proibição generalizada de livros nos Estados Unidos. “É inacreditável”, disse ele ao New York Times sobre o que vê acontecendo hoje. “É muito urgente e está ligado ao futuro da nossa democracia”.

Pouquíssimas pessoas podem contribuir com meio milhão de dólares, mas mesmo pequenas doações para organizações como a PEN, a Associação Americana de Bibliotecas e a Coalizão Nacional Contra a Censura podem ajudar nos esforços para aumentar a conscientização pública e gerar ações jurídicas e legislativas.

Para as pessoas que vivem nas regiões (sobretudo estados republicanos) onde estão acontecendo os banimentos, é importante expressar publicamente sua discordância e se organizar para reagir.

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“As vozes mais potentes são as vozes locais”, me disse Nossel. Portanto, os habitantes locais devem comparecer às reuniões do conselho escolar para expressar publicamente sua discordância, entrar em contato direto com os administradores da escola para insistir que os procedimentos estabelecidos sejam seguidos antes da remoção sumária dos livros das prateleiras e informar a situação aos legisladores estaduais e locais.

Eles também podem escrever cartas ou artigos de opinião para o jornal local e postar nas redes sociais em apoio à liberdade de expressão e em oposição a banimentos ou rotulagem. Às vezes são necessárias medidas mais extremas: na situação de Llano descrita acima, um grupo de cidadãos processou o condado com base na Primeira Emenda. “As pessoas precisam se mobilizar, porque os esforços para banir os livros são muito ativos e muito organizados”, disse Nossel.

Também é importante ter em mente – e levantar a voz para dizer – que as proibições de livros contrariam um princípio central daquilo que os Estados Unidos deveriam defender. Então, se você está preocupado com ameaças à democracia envolvendo direito ao voto, manipulação e transferência pacífica de poder após as eleições, você precisa guardar um pouco de espaço mental para isto também.

Opor-se à censura na forma de banimento de livros faz parte da mesma luta crucial. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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