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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

"As novas gerações não irão permitir esse 'ecocídio' planetário", diz o cientista Carlos Nobre

O pesquisador brasileiro, referência mundial em estudos sobre mudanças climáticas, foi anunciado como novo integrante do grupo Planetary Guardians (Guardiões Planetários)

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Foto do author Gilberto Amendola
Atualização:

O cientista brasileiro Carlos Nobre, referência mundial em estudos sobre mudanças climáticas, foi anunciado como novo integrante do grupo Planetary Guardians (Guardiões Planetários), coletivo que reúne pesquisadores e ativistas em prol de estudos e análises sobre ação climática e proteção de comunidades vulneráveis. Nesta entrevista, Nobre fala sobre a missão dos Guardiões, os riscos da vida no planeta e o negacionismo. Ainda assim, o professor se declara otimista: “As novas gerações não irão permitir que caminhemos para o ecocídio”. A seguir:

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Qual a missão de um ‘Guardião Planetário’?

Esse é um grupo muito interessante – que tem poucos cientistas, mas tem políticos muito importantes, como o ex-presidente da Colômbia Juan Manuel Santos, representantes do setor empresarial, jovens indígenas e outros. Nossa missão é mostrar que estamos, no planeta todo, correndo muitos riscos. Falamos, logicamente, de mudanças climáticas e do enorme risco para a nossa biodiversidade. Sem soluções sustentáveis, nós vamos causar a extinção de espécies de bilhões de anos.

Salvar a Amazônia tem um papel fundamental nesta missão?

Entre 20 e 50 anos, podemos perder de 50% a 70% da floresta. A estação seca está ficando mais longa. Se continuar assim, o clima de floresta tropical pode se transformar em clima de savana tropical e de cerrado. Se passarmos deste limite, jogaremos na atmosfera uma quantidade tão grande de gás carbônico que não haverá como evitar que o aquecimento global ultrapasse um aumento de 1,5°C. Zerar o desmatamento e restaurar a floresta vai reduzir os nossos riscos.

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Vamos precisar aprender a conviver com os eventos climáticos extremos, como o que aconteceu no Rio Grande do Sul?

Os eventos extremos estão ficando mais comuns. Por exemplo, um estudo comparou alguém que nasceu em 1960/70 e outro que nasceu em 2020. O primeiro enfrentaria de 5 a 7 ondas de calor durante toda a vida. Já o segundo, de 25 a mais de 30 ondas de calor.

O que acontece se a temperatura do planeta subir ainda mais?

Mesmo que a gente consiga manter a temperatura em 1,5°C, todos esses fenômenos que antes aconteciam a cada 100, 200 anos, podem acontecer em poucas décadas. As populações que moram nas margens dos rios precisam ser deslocadas para lugares seguros. Esse eventos de agora não deixaram mais de existir. Se a temperatura do planeta chegar a 2 ,5°C ou 3 °C, esses eventos viram o novo normal. E o mundo vai ficar mais perigoso.

Carlos Nobre é um ' Guardião Planetário' Foto: Ale virgilio

O planeta corre risco?

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É correto dizer que a vida em todo o planeta corre risco. Se a temperatura atingir os 4°C ou mais, todas as cidades tropicais vão se tornar inabitáveis. A temperatura pode passar do limite do corpo humano. Se isso acontecer, 50% das espécies vivas irão se extinguir. Não podemos deixar de diminuir ou zerar as emissões.

Com todo esse quadro ainda é preciso lidar com o negacionismo...

Isso é um fenômeno cultural que existe desde que a ciência avança no planeta. Ainda há políticos negacionistas que ganham eleições, como o ex-presidente dos EUA (Donald Trump), ex-presidente do Brasil (Jair Bolsonaro) e o atual da Argentina (Javier Milei).

Você se transformou em um pessimista?

Essa é uma questão filosófica importante. Eu fiquei mais de 40 anos trabalhando com pesquisa na Amazônia, fui o primeiro cientista a chamar atenção sobre o ponto de não retorno da floresta. Tudo isso me fazia muito pessimista e mal-humorado Aí, nos últimos anos, eu decidi focar na busca de soluções. Vi uma pesquisa que mostra que pessoas acima de 75 anos, e eu tenho 73, deixam de ser pessimistas. Sou otimista porque as novas gerações são quase nada negacionistas. Acredito que as novas gerações não irão permitir que caminhemos para o ecocídio planetário.

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O que podemos fazer cotidianamente?

Nós temos que ter noção que depende da gente – não só de políticas governamentais ou de empresas diminuindo suas emissões. Temos responsabilidade democrática. Nas eleições, independente de ideologia, de direita, centro ou esquerda, não devemos votar em políticos negacionistas. Além disso, o consumidor precisa passar a consumir mais carne da pecuária sustentável e regenerativa. E outro ponto importante é a energia renovável nos transportes. Migrar para os veículos elétricos vai salvar a vida de milhares de brasileiros.

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