Alçado à fama como repórter do extinto CQC, programa que foi sucesso nos anos 2010, Rafael Cortez usa justamente os ‘altos e baixos’ da própria carreira em sua nova empreitada profissional. O ator, músico, apresentador, mestre de cerimônias e, agora, palestrante, fala – em suas apresentações em empresas e universidades – sobre como a atitude e, principalmente, o jogo de cintura para encarar as mudanças e os problemas podem ser ótimas ferramentas na administração de carreiras. Leia a entrevista à repórter Marcela Paes.
Como surgiu a ideia de fazer palestras motivacionais?
A palestra nasceu justamente com o intuito de não ser assim uma palestra motivacional. Há muito tempo trabalho como mestre de cerimônias de eventos corporativos e sempre gostei de ver os conteúdos. Vi palestras incríveis e vi outras palestras muito duvidosas. Fiquei com vontade de criar a palestra porque observei que existia um excesso de motivação, um excesso de ‘tudo depende de você’. Eu, particularmente, discordo disso, porque às vezes o funcionário está no meio de um tremendo furacão porque tem uma concorrência desleal, ou houve uma mudança externa que prejudicou todo mundo, mudanças de governo, mudanças na economia. Isso não depende dele, né? Aí quis fazer uma coisa mais humana.
Como é a sua palestra?
Minha palestra é honesta porque tenta compreender o contexto. É uma palestra que fala também sobre a grande chance das coisas não darem certo, mas eu explico que se usarmos a tal da atitude, que é uma ferramenta que todo mundo tem dentro de si, à favor da proatividade, podemos chegar a lugares que nem imaginamos. A ideia é incentivar o uso dos seus melhores valores, dos seus atributos. A ferramenta da atitude é muito subestimada. É diferente de ser motivacional, é funcional.
Então você não virou um coach?
Não. Nem poderia. Tenho respeito pelos bons coachs. Eu não gosto desse estereótipo de que coach não funciona, mas eu não virei um coach não porque eu não saberia fazer isso. Eu seria picareta se virasse coach, sabe?
Tem algo que te incomoda na cultura dos coachs? E o que você vê de positivo?
Os coachs orbitam em torno de bons valores. Para fazer as palestras, assisti a muitas outras e naturalmente passei pelo trabalho dos coachs. No universo das palestras, é impossível não haver uma positividade contagiante, os palestrantes estão imbuídos de uma energia e querem passar isso, seja de maneira gananciosa ou picareta, seja de maneira honesta. A coisa que eu não gosto dos coachs é a simplificação dos problemas. É simplista dizer ‘cabe a você mudar tudo’. Têm pessoas que estão reféns de situações e por melhor que sejam suas índoles, não controlam algumas circunstâncias.
Traz muito da sua experiência profissional na sua apresentação?
100%. Inclusive a minha palestra é um testemunho mesmo. Hoje eu não sou famoso, mas ainda sou uma pessoa pública. Conto como a minha carreira foi orientada através das atitudes mesmo antes do CQC. Falo sobre o dia que de fato eu botei dois pés no peito e pedi pra ser repórter do CQC quando me convidaram pra ser produtor. É a minha história, como continuar trabalhando com ou sem mídia, com o telefone tocando ou não tocando. Não é uma palestra de sucesso, mas é uma palestra que ensina como a gente continuar trabalhando mesmo nas entressafras de carreira.
Você disse que não é mais famoso, como na época do CQC. Como lida com isso?
Eu venho de uma família de artistas, tanto do lado do meu pai, quanto da minha mãe. Tem pintores, escritores, atrizes. O Raul Cortez, por exemplo, que era primo de primeiro grau do meu pai. A referência da arte sempre foi muito presente na minha vida, eu sempre soube que seria artista. Fui preparado pra saber ter cabeça boa quando o furacão passasse. Meu tio pintor vendeu incrivelmente bem nos anos 1970 e não vendeu nada nos anos 2000. Do mesmo modo que eu vi a minha tia Isadora ser uma grande dama do teatro também nos anos 1970 e amargar a falta de trabalho em outros anos.
Já esperava viver essas mudanças?
Eles me diziam ‘se um dia você fizer sucesso, tenha a cabeça boa porque vai passar’. E eu tive certeza absoluta que ia passar. Têm entrevistas minhas no auge do CQC, em que eu dizia que a fama ia passar e que outro cara mais jovem, mais barato e que seria novidade, chegaria no meu lugar. Sabia que ia passar, porque o sucesso é um bastão que vai de mão em mão, ele tá cada hora em outra mão. Fazer sucesso não significa ter solidez de carreira, significa que você tem uma grande oportunidade, se você não souber administrar isso, você pode ser um ressentido, um louco, uma pessoa doente, tóxica e que fica numa amargura, numa reminiscência.
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