O presidente do Hospital Albert Einstein, Sidney Klajner, participou na última quinta-feira de um debate na sede da ONU sobre como os sistemas de saúde podem responder aos desafios do clima. Nesta entrevista, Klajner fala dos impactos das emergências climáticas na saúde, na formação dos médicos e o papel da tecnologia para mitigar o sofrimento da população mais vulnerável. Leia a seguir:
Qual a importância de trazer a questão da crise climática e seus impactos na saúde para um palco como o da ONU?
Trazer os chefes de estado para perto deste tema. A estimativa é que a mortalidade, relacionada às questões climáticas, daqui até 2030, fique em torno de 5 milhões de mortes por ano em países de média e baixa renda, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Ao mesmo tempo, o que precisa ser investido para responder essas demandas é algo em torno de 2 a 4 bilhões de dólares. Hoje, o que está sendo colocado não chega a 2% deste valor.
Quais seriam os impactos mais diretos?
Se eu sou de uma organização que está lá com o foco único no atendimento dos pacientes, esse impacto vai acontecer no aumento da demanda de pessoas atingidas por uma determinada catástrofe – ou pelo calor ou pela seca. Temos também um aumento de pelo menos 25% a 30% na demanda de pacientes com questões respiratórias.
E no caso de uma organização como o Einstein?
Na nossa organização, que tem como propósito impactar a saúde da nossa cidade, estado e País, as alterações climáticas são objeto de uma série de iniciativas onde o objetivo é levar uma vida mais saudável a um número cada vez maior de pessoas. Então, a gente precisa trabalhar na necessidade de tentar mitigar o efeito dessa emergência climática no sistema de saúde como um todo e, principalmente, naqueles lugares onde as populações estão mais expostas e vulneráveis. As queimadas, por exemplo, resultaram no fechamento de algumas unidades de saúde nessas regiões.
E como atuar de forma efetiva nessa questão?
Hoje, a ideia é agregar mais organizações para que se desenhe um modo de preparar os sistemas de saúde – que precisam ser mais resilientes em meio à probabilidade do impacto que as alterações climáticas já produzem. Isso inclui o preparo das equipes, tanto médica como multiprofissional. Precisamos preparar o sistema para que os pacientes mais vulneráveis sejam encaminhados para atendimentos de emergência em uma catástrofe, é preciso preparo para que a infraestrutura hospitalar de regiões atingidas não sejam perdidas ou o atendimento interrompido. É preciso que, em situações de emergência, a gente consiga seguir dando atendimento para quem possui doenças crônicas. Dentro do Einstein existe uma reunião mensal do grupo de catástrofes que cria situações de discussão sobre a melhor forma de atender a população nestas situações.
Qual é o papel da tecnologia neste contexto?
Nós temos utilizado bastante tecnologia – como o teleatendimento para assistir populações ribeirinhas. Estamos expandindo nossa área de inovação e criamos um hub na região de Manaus. Temos um programa que visa mapear populações vulneráveis – reconhecendo a qualidade da água, a qualidade da assistência e seus impactos. Por meio de predição por satélite, você consegue prever a probabilidade de uma catástrofe e criar um mapa de vulnerabilidade.
A questão climática também está afetando a formação do médico?
Quanto a capacitação, cada vez mais, nós devemos incluir nos modelos pedagógicos a questão ambiental. Isso também já está na própria seleção dos alunos que estudam medicina na nossa Faculdade. Nós queremos alunos capazes de liderar transformações no sistema de saúde. Esse profissional precisa ir além do consultório, estetoscópio e da caneta. As novas gerações de médicos ou enfermeiros, psicólogos, psicoterapeutas precisam de uma formação para atendimento de emergências climáticas.
Como o Einstein ‘olha para dentro’ em relação à sustentabilidade?
Não adianta você dar um sinal para fora se dentro de casa está aquela bagunça. Nós temos essa preocupação: 74% da energia que o Einstein usa é energia renovável. Estamos investindo em energia eólica. A gente sabe que uma organização de saúde tem que ter a preocupação do que fazer com o descarte. Trabalhamos na substituição de tudo que é plástico para algo que possa ser reciclado.
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