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Coluna semanal do historiador Leandro Karnal, com crônicas e textos sobre ética, religião, comportamento e atualidades

Opinião|Estamos nos passos iniciais do uso em larga escala da AI. E como a iremos chamar?

O julgamento mais comum é dizer diante de um quadro: “Isto parece real!”. É como se o real fosse a verdade, e o artista apenas um hábil reprodutor da única fonte de beleza

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Atualização:

Entre 1928 e 1929, o belga René Magritte fez um quadro famoso. A imagem é um cachimbo muito bem representado. Porém, logo abaixo, a frase em francês diz: “Isto não é um cachimbo (Ceci n’est pas une pipe)”. O quadro está no LACMA, em Los Angeles.

Grande parte da história da arte foi a capacidade de ilusão proporcionada pela perspectiva, sombreamento, etc. O julgamento mais comum (e muito questionável) é dizer diante de um quadro: “Isto parece real!”. É como se o real fosse a verdade, e o artista apenas um hábil reprodutor da única fonte de beleza (aquilo que nossos olhos conseguem perceber na natureza).

'A Traição das Imagens' (1929), com a inscrição 'Isto não é um cachimbo', é uma das obras mais conhecidas de René Magritte. Foto: Adagp, Paris 2016/Divulgação

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Agora, observe o trecho seguinte (não é da minha autoria): “A intenção de Magritte ao criar essa obra era questionar a relação entre imagem e realidade, e explorar os conceitos de representação e linguagem. Ele estava fazendo uma provocação conceitual, mostrando que a pintura de um objeto não é o objeto em si, mas apenas uma representação. Ele estava desafiando a ideia de que uma imagem é uma representação direta da realidade e destacando a natureza ilusória da representação artística”. Gostou? Bem, a citação resultou de uma pergunta minha ao ChatGPT, a famosa inteligência artificial de textos. Indaguei sobre qual análise poderíamos fazer da citada obra de Magritte. Agora vem a grande questão: o pintor desejou revelar a ilusão que sentimos ao julgar a arte pela verossimilhança, pela vontade mimética que dominou uma parte da história da arte. A AI (Artificial Intelligence) faz o caminho contrário: ela oculta os andaimes da construção e revela o prédio pronto. A AI é julgada como boa à medida que nos convence de que é um cachimbo real o que lemos.

Estamos nos primeiros passos do uso em larga escala da AI. A possibilidade de aperfeiçoamento é exponencial. Milhões de usuários estão fazendo textos e imagens com os recursos abertos pela inteligência artificial. O aprendizado é constante. Em poucos meses, teremos saltos enormes. Muita gente fica indignada com a luta por pronomes neutros em gênero na Língua Portuguesa. Acho essa uma questão irrelevante diante da verdadeira: o pronome da AI será “She” ou “It”?

“She”, ela, indicaria uma pessoa de gênero feminino. “It” é para coisas. Saberemos a diferença daqui a dois anos? E ainda existe gente achando que o desafio está no uso de todes... A AI deve rir, em breve, quando adquirir a capacidade humana de ironizar.

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Espero que a AI tenha alguma esperança...

Opinião por Leandro Karnal

É historiador, escritor, membro da Academia Paulista de Letras, colunista do Estadão desde 2016 e autor de 'A Coragem da Esperança', entre outros

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