Encerraremos o ano de 2024 com uma crônica histórica. O mérito central do texto não é meu, mas de grandes mulheres e homens que colaboraram gentilmente. Perguntei a pessoas muito envolvidas com livros: gostaria de indicações para jovens que estão querendo ler. Meu pedido foi: “Quais são os dois livros prediletos na sua trajetória de leitor/escritor que poderiam ajudar jovens leitores a descobrirem coisas maravilhosas?”. Alguns responderam imediatamente; outros demandaram semanas para pensar. Eis o resultado.
Maria Adelaide Amaral é consagrada criadora de minisséries, como A Casa das Sete Mulheres. Também é escritora das obras literárias Aos Meus Amigos e o lindo texto Luísa. Ela pensou nos jovens e indicou: A Elegância do Ouriço (Muriel Barbery) e o clássico O Apanhador no Campo de Centeio (J. Salinger).
Pedro Pacífico, o mais celebrado bookster do Brasil, lançou suas memórias Trinta Segundos Sem Pensar no Medo. Seu gosto recaiu sobre Um Defeito de Cor, de Ana Maria Gonçalves, e Frankenstein, de Mary Shelley.
Rodrigo Lacerda é um editor experiente e autor premiado, conhecido por sucessos: O Fazedor de Velhos e Outra Vida. Seus dois livros fundamentais indicados foram Viva o Povo Brasileiro (João Ubaldo Ribeiro) e Palmeiras Selvagens (William Faulkner).
Luiz Schwarcz, que analisou a depressão de forma tocante em O Ar Que Me Falta, é um dos mais consagrados editores do Brasil. Ele indicou três obras: O Barão nas Árvores (Ítalo Calvino), Triste Fim de Policarpo Quaresma (Lima Barreto) e O Estrangeiro (Albert Camus).
Minha colega da Academia Paulista de Letras, Betty Milan, autora das obras Lacan Ainda, O Clarão e A Trilogia do Amor, enviou, direto da França: Notre-Dame de Paris (Victor Hugo) e O Processo (Franz Kafka).
Thalita Rebouças é conhecida do público jovem por muitas obras. Escreveu o livro Natali e Sua Vontade Idiota de Agradar Todo Mundo. Ela aconselhou: Feliz Ano Velho, de Marcelo Rubens Paiva, e Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago.
Autora e apresentadora de sucesso, Gabriela Prioli tornou-se best-seller com seus textos Política para Todos e Ideologias. Compartilhando comigo a experiência de um Clube do Livro, há vários anos, ela pensou em O Olho Mais Azul (Toni Morrison) e O Livro do Desassossego (Fernando Pessoa).
A atriz Fernanda Torres, conhecida por A Glória e Seu Cortejo de Horrores e Fim, escolheu uma tríade variada: Tristes Trópicos (Lévi-Strauss), Ascensão e Queda de Adão e Eva (Stephen Greenblatt) e O Despertar de Tudo (David Graeber e David Wengrow).
Martha Medeiros, destacada por Divã e Conversa na Sala, apontou o livro da The School of Life: Relacionamentos e, novamente, O Livro do Desassossego (Fernando Pessoa).
O celebrado autor angolano José Eduardo Agualusa, conhecido por Teoria Geral do Esquecimento e Manual Prático de Levitação, enviou, de Moçambique, as indicações: Os Maias (Eça de Queirós) e Ficções (Jorge Luis Borges).
Um dos maiores sucessos do universo literário brasileiro, Itamar Vieira Júnior causou furor ao lançar Torto Arado. Ele escolheu o incontestável Dom Casmurro (Machado de Assis) e o livro da vencedora do Prêmio Nobel: Amada (Toni Morrison).
Encerro com uma surpresa. Pedi dois títulos ao querido Ignácio de Loyola Brandão. Ele pensou bastante e enviou um texto intitulado: Liberdade da Mente e Criatividade para Nos Mantermos Vivos. Eis um trecho:
“Ainda hoje, 78 anos depois, reverbera pulsante o presente que minha madrinha Ignácia me deu, Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. Eu tinha 10 anos. Livro de espantos, sustos, gargalhadas, suspiros, ironia e liberdade total de imaginação. Fantasias sem coerção. Como fui feliz ao ver a personagem percorrer com naturalidade um alucinante mundo de contrários debaixo da Terra. (...) Esta foi a primeira maravilha para mim, criança. Logo elas se amontoaram. Coelhos falantes, lagartas que adquirem tamanhos variados e só dizem frases curtas, animais que não são o que são (hoje vejo humanos que não são o que são), o corpo de Alice mudando de forma, crescendo e diminuindo, gatos ingleses que sorriem, uma terra onde todos estavam habituados a cortar a cabeça dos outros. (...) Carroll me libertou. E assim escrevi Não Verás País Nenhum e outros quantos eu quiser, do jeito que desejar, me apetecer. Sou livre como criador. Vejo a realidade como quero e desejo que seja. E como é real minha realidade inventada. Já Robinson Crusoé (Daniel Defoe), vivendo 28 anos sozinho em uma ilha deserta, me ensinou a enfrentar a solidão, essa que nos desespera e que me acometeu (como a todo mundo) em múltiplas ocasiões. Cada vez que estava – e ainda hoje – em desespero, vazio, lembro-me de Robinson fazendo, trabalhando, criando, construindo, para preencher seu mundo. Estar ativo para ficar vivo, não se matar, não se entregar ao desespero, para manter-se de pé. Pertinaz, Robinson enfrentava o nada ao seu redor. E ele transformava o nada em tudo. Ensina a termos inventividade e ação para nos salvarmos a cada dia”. Ler Ignácio traz muita esperança.
Você já tem seu programa de livros para 2025? Feliz Ano-Novo!
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.