Al Jaffee é de antes da Depressão, mas a fome e a escassez cedo o assombrariam – embora não nos Estados Unidos. Essa lenda do cartum nasceu em Savannah, Geórgia, e nos primeiros seis anos teve uma vida confortável. Mas então a mãe, saudosa da terra natal, levou Al e irmãos para a Lituânia, onde foram viver num shetetl, cidadezinha de maioria judaica, onde havia muito pouco para um garoto descobrir ou comprar.
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“Foi como voltar ao século 19”, me disse Al Jaffee quando eu estava moderando uma mesa de discussões na Baltimore Comic-Con, onde ele foi guindado ao Hall da Fama do Harvey Award. O jovem Al passou a maior parte dos seis anos seguintes em Zarasai, a “Sibéria da Lituânia”. Não havia água corrente, faltava comida (ele furtava vegetais) – e Al não tinha brinquedos. Ele me falou do contraste entre essa dura experiência e a vida de volta à Geórgia, onde o pai trabalhava no comércio e, aos sábados, Al e irmãos ficavam à solta na seção de brinquedos de uma loja de departamentos. Foi na Lituânia, porém, que Al Jaffee aprendeu a improvisar. Garimpava peças para fazer ferramentas, ou montar um caniço de pesca.
Como o pai mandava revistas de quadrinhos dos EUA para Zarasai, e Al tinha jeito para desenho, começou a desenhar cartuns no chão de terra usando uma varinha. Desenvolveu então um senso de inovação temperado com desconfiança na autoridade dos adultos, canalizando isso para os cartuns – uma arte rara no shetetl que se provou popular e venceu até os bullies. Tudo isso foi uma combinação ideal para a futura carreira de Al como cartunista da revista MAD, onde vem desenhando há mais de meio século suas inimitáveis páginas “dobre aqui” e suas invenções malucas. Em março, em seu 95º aniversário, o Livro Guinness de Recordes confirmou-o como “o cartunista em atividade há mais tempo” da história dos quadrinhos. “A necessidade é mesmo a mãe da invenção”, disse Al na Baltimore Comic-Con.
Aí eu perguntei: “Então se tivesse continuado em Savannah, você hoje estaria vendendo seguros?”. O pai trouxe os filhos de volta para os EUA para uma vida melhor, enquanto a mãe ficou na Lituânia durante a 2ª Guerra e nunca mais foi vista. Acredito que o que Al passou, com as dificuldades e a indescritível perda da mãe, teve uma profunda influência em sua habilidade de pensar contra a corrente, aprender a adaptar-se e mudar de curso até abrir caminhos que ninguém havia tentado. É uma coisa muito forte conhecer, na infância, a abundância e a súbita falta dela. Mas essa defasagem pode ensinar a reagir com um senso incomum de urgência, adaptabilidade e inovação.
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Não distante do Centro de Convenções de Baltimore fica a Universidade Johns Hopkins, onde Meng Zhu é professor com especialização em comportamento do consumidor. Num recente estudo para o Journal of Consumer Research, Zhu o coautor do estudo, e Ravi Mehta, da Universidade de Illinois – Urbana-Champaign, escreveram: “Ao contrário da crença popular, a abundância de recursos pode ter efeito negativo na criatividade”. E continuaram: “Descobrimos que a escassez força os consumidores a pensarem além da função tradicional de um produto, com aumento da criatividade”.
Al Jaffee, aos 95, é ainda um incrivelmente hábil pensador lateral. A criativa armadilha que é sua mente de aço ainda funciona rápida e aguda. Alguns instintos são tão fortemente forjados no início da vida que se tornam parte central da medula do homem. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ