Cresce a leitura entre crianças, mas 48% dos brasileiros não leem, aponta a Retratos da Leitura

A pesquisa Retratos da Leitura revela, em sua 5ª edição, que o número de brasileiros que se dizem leitores caiu

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Foto do author Maria Fernanda Rodrigues

Pedro Fortes Costa tem 7 anos e está muito orgulhoso de suas conquistas. Na quarentena, em São Paulo, ele começou a ler livros sozinho e tem encarado volumes dos mais variados tamanhos e gêneros. Das tiras de Mafalda e Snoopy a lendas brasileiras e biografias que ele vai listando com sua vozinha: Rasa Parks, Mandela, Obama, Carolina Maria de Jesus. “Ler é divertido como ver TV. Mas gosto mais de ler. Eu amo livros”, conta. 

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O incentivo que recebeu dos pais desde bebê ganhou reforço quando o avô, que mora no Rio, depois de muito debater com as filhas qual livro poderia agradar o garoto, mandou pelo correio uma coletânea do Snoopy no aniversário do neto, em junho. Ele devorou. Nascia aí um combinado entre os dois: quando Pedro acaba um livro, o avô manda outro.

“Acho que me empolguei com isso. Tive uma experiência parecida aos 8, 9 anos, quando uma tia se mudou para longe e começou a me enviar livros. Isso foi extraordinário para mim. Além da questão da descoberta da leitura, receber uma correspondência no próprio nome dá uma noção de lugar de mundo diferente para a criança”, diz Alexandre Fortes, professor universitário de história que hoje, aos 54 anos, faz a triste constatação: “Nunca vou conseguir ler o quanto eu gostaria”. Falta tempo.

Pedro Costa descobriu que podia ler sozinho na quarentena e ganhou um aliado importante em suas descobertas: o avô que mora longe Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Maia, de 32 anos, mãe de Pedro e Jorge, de 2 anos, que já escolhe histórias para o irmão contar, está na mesma situação do pai. “Hoje, sou mais leitora de livro infantil”, brinca – e faz uma ponderação interessante. “Nós sempre tivemos a rotina de leitura aqui, mas a escola tem um papel muito importante na sala de aula e com as bibliotecas circulantes, que levam o livro para dentro de casa.”

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O irmãos Manuela, 10, e Karim, 13, também sempre foram bons leitores. “Tentamos equilibrar o que eles querem ler com o que achamos importante que eles leiam. E assim a leitura fica diversificada: vai de biografia de youtuber a lendas africanas, O Diário de Anne Frank e Anarquistas, Graças a Deus, de Zélia Gattai”, explica a jornalista Carla Nascimento. Influenciada pelo irmão, Manuela adora mangá. E pais e crianças se revezam, à noite, na leitura em voz alta de Gregor, de Susanne Collins. “Dá um pouco de dor de garganta em quem está lendo, mas é um momento gostoso em família, diz Karim, que está experimentando algo não muito diferente de meninos e meninas de sua idade. “Estou lendo menos em comparação a antes. Desde o ano passado, tenho me interessado mais por vídeo game e estou focado em criar meus personagens e histórias para jogos. Quando eu crescer, quero ser desenvolvedor de jogos”, diz.

Os irmãos Karim Marinho, 13 anos, e Manuela, de 10, sempre tiveram uma rotina de leitura Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Essas histórias refletem algumas das principais descobertas da 5.ª Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, coordenada pelo Instituto Pró-Livro em parceria, pela primeira vez, com o Itaú Cultural e realizada pelo Ibope.

São muitos dados ruins – e o principal é que diminuiu de 56% para 52% o número de leitores no Brasil. A pesquisa entende o leitor como alguém que leu, inteiro ou em partes, pelo menos um livro nos três meses anteriores ao levantamento. Quem não leu deu os seguintes motivos, entre outros menos significativos: falta de tempo (34%), não gosta (28%), não tem paciência (14%), prefere outras atividades (8%), tem dificuldade para ler (6%).

Caiu o número de leitores no geral, mas cresceu o de crianças leitoras entre os 5 e 10 anos – a única faixa etária que teve um desempenho melhor em 2019 do que em 20015 – a Retratos da Leitura é feita a cada quatro anos desde 2007 (veja os resultados da de 2015). Entre elas, 48% disseram que leem por gosto, porcentagem que vai diminuindo gradativamente e aponta para um dado preocupante. Nas duas pesquisas anteriores, de 2011 e 2015, houve uma manutenção no porcentual de leitores dos 11 aos 17 anos. Agora, vemos uma queda a partir dos 11 anos, segundo explica Zoara Failla, coordenadora da pesquisa. Ela, porém, é otimista e acredita que o aumento da leitura entre as crianças menores pode ter impacto positivo na faixa seguinte na próxima pesquisa. Isso se não perdermos esses leitores quando eles chegarem ao Fundamental 2.

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“Temos que olhar para esses dados bons para buscar respostas sobre onde investir. Se a garotada dos 5 aos 10 gosta de ler e está ampliando o número de leitores nessa faixa, alguma coisa está acontecendo aí. O que é?”, questiona Zaoara. Duas respostas: a influência dos pais, sobretudo das mães, e dos professores – dados apontados pela pesquisa. “A família tem uma importância fundamental e está percebendo isso. Quando ela lê para o filho, quando lê na frente das crianças, quando a presenteia com livro, isso faz toda a diferença”, diz. Ela continua: “Mas é fácil ler para uma criança. A outra questão é: estamos conseguindo estabelecer uma mediação com os adolescentes? Como compartilhamos as experiências de leituras com eles? O que comprar?”. 

Somado a isso tem a mudança de dinâmica na escola, um novo currículo, várias disciplinas e não mais um ou dois professores, com quem era possível estabelecer relações de afeto. “O espaço vai ficando menos acolhedor, de menor vínculo. É preciso pensar qual é o ambiente da escola que pode possibilitar o acolhimento para esse leitor em formação. É a biblioteca? Qual leitura pode ser significativa para ele? Do que ele gosta de ler? Conhecer quem é o adolescente que está dentro da minha sala de aula é uma coisa desafiadora, mas fundamental. E é preciso promover o diálogo entre os espaços dentro da escola.” 

E aqui surge outro problema. Quem é esse professor? Ele é leitor? “Percebemos que o repertório de autores lidos é muito parecido com o do brasileiro em geral. Identificamos maior gosto de leitura entre eles e vemos que ele está lendo mais do que a média, mas o que estão lendo? É religioso e autoajuda. A questão é: como eu vou despertar o interesse de um adolescente para a leitura se meu repertório é pequeno?”

A Retratos da Leitura é a mais abrangente pesquisa sobre o hábito de leitura no País e tem como objetivo servir de base para políticas públicas para a formação de leitores. Os dados desta edição serão apresentados na segunda, 14, às 19h, pelo YouTube e Facebook do Itaú Cultural. Entre 22 de setembro e 13 de outubro, todas as terças, às 17h, especialistas vão analisar seus resultados em debates online.

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Destaques da 5ª Pesquisa Retratos da Leitura

  • 8.076 pessoas foram ouvidas em 208 municípios entre outubro de 2019 e janeiro de 2020. Todas as capitais foram contempladas
  • 4,95 é a média de livros lidos pelos brasileiros em um ano – desses, 2,55 livros foram terminados e 0,87 foi leitura obrigatória da escola. Os índices são similares aos da pesquisa anterior
  • 48% dos brasileiros não leem – antes, o índice era de 44%
  • 22% das pessoas não gostam de ler
  • 11ª é a posição que a leitura de livros ocupa na lista do que as pessoas gostam de fazer no tempo livre. TV, internet, música, WhatsApp, ver vídeo ou filme, escrever, reunir-se com amigos ou família, redes sociais, ler jornais e revistas e fazer esportes vêm antes

Os autores preferidos

A Bíblia ainda é a mais citada como último livro lido ou em leitura – e o mais marcante. Os autores preferidos são: Machado de Assis, Monteiro Lobato, Augusto Cury, Mauricio de Sousa e Jorge Amado. 

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