Ela tinha um trabalho tedioso, passava a noite escrevendo e hoje é best-seller; conheça Lynn Painter

Escritora americana que é sucesso entre a geração Z fala de novo livro, relembra passagem pela Bienal do Rio, comenta referências a Taylor Swift e opina sobre espaço das histórias de amor no mercado editorial

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Foto do author Julia Queiroz
Atualização:

Qual é o segredo para conquistar milhares de leitores da geração Z? Para a escritora norte-americana Lynn Painter, que já vendeu mais de 50 mil exemplares no Brasil, parece ser uma tarefa fácil, apesar de o sucesso ainda a surpreender.

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Um dia, ela tinha um trabalho tradicional na área administrativa de uma imobiliária na cidade em que mora no estado do Nebraska, nos Estados Unidos. Em outro, estava cercada de jovens e adolescentes gritando por ela e por seus livros na Bienal do Livro do Rio de Janeiro.

“Os leitores brasileiros são incrivelmente engajados. Foi tão bonito”, diz Lynn, que foi uma das atrações do evento em setembro de 2023, em entrevista ao Estadão. “É uma bela combinação de comunidade, família e literatura. Foi a melhor experiência”.

A escritora Lynn Painter com fãs segurando exemplares de 'Melhor do que nos filmes' e 'Amor por engano' na Bienal do Livro 2023. Foto: Rafaela Cassiano/Intrínseca

Ela é autora de seis romances - três estão disponíveis no Brasil. O primeiro deles, Melhor do que nos filmes, foi publicado em 2021 nos EUA, mas virou um sucesso comercial mais recentemente. A história é simples, sobre uma jovem apaixonada por comédias românticas que acaba se envolvendo com o vizinho irritante após pedir ajuda para conquistar um garoto da sua turma.

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No entanto, impulsionado pelo BookTok - o nicho de literatura do TikTok (saiba mais aqui) - o livro chegou a milhões de leitores ao redor do mundo. Na plataforma, a hashtag #BetterThanTheMovies, título original da obra, soma mais de 172 milhões de visualizações, enquanto #LynnPainter tem quase 83 milhões.

Depois do sucesso com leitores adolescentes, Lynn se aventurou com o público adulto em Amor por engano, que chegou aqui pela Intrínseca em 2023. Já no início de janeiro, a editora publicou o retorno dela à literatura jovem adulta, com Mil Vezes Amor, que explora aquela tradicional história de uma personagem que vive o mesmo dia desastroso repetidas vezes - neste caso, o Dia dos Namorados.

A escritora estava assistindo a um desses filmes no estilo do clássico Feitiço do Tempo (1993) quando teve a ideia. Ela queria, mais do que explorar a noção de estar presa no mesmo dia, imaginar o que aconteceria se a personagem acordasse no dia seguinte àquele em que ela decidiu “sair dos trilhos”. A personagem, então, tem que lidar com as consequências das ações que tomou enquanto achava que ficaria presa ali para sempre.

Capa de 'Mil Vezes Amor', livro de Lynn Painter que chegou ao Brasil em janeiro. Foto: Intrínseca/Divulgação

“Esse é mais o foco dos dois segundos atos do livro e os dias de repetição são apenas o primeiro, para tentar torná-lo um pouco diferente. É sempre um pouco difícil saber se você conseguiu, vamos ver o que as pessoas acham”, reflete.

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Lá fora, funcionou: o livro, junto com Melhor do que nos filmes, aparece na lista de títulos voltados para o público jovem adulto mais vendidos no mês de dezembro de 2023 do jornal The New York Times - eles ocupam a sétima e a quinta posição, respectivamente.

Apesar da história de Mil Vezes Amor ser sobre a experiência sobrenatural da protagonista Emilie e do romance que ela desenvolve com seu colega de classe, Joshua, a trama também aborda tensões familiares e temas como divórcio e luto. É o tipo de livro com enredo e linguagem voltados para adolescentes, mas que tenta discutir conflitos universais de maneira discreta.

“O engraçado é que eu nem tinha percebido que fazia isso. E então vi um crítico dizer algo como ‘Lynn Painter está escrevendo livros para filhos de divorciados’”, brinca a autora, que diz ter vivido a separação dos pais quando já estava na faculdade.

“Mas sinto que sempre fui muito consciente sobre os meus amigos cujos pais eram divorciados e como é viver em duas casas e sua mãe ter um namorado. Como seria essa sensação? Talvez eu estivesse esperando que isso acontece comigo, então estava muito concentrada em como seria. Acho que isso aparece nos meus livros mais adolescentes”, explica.

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A escritora Lynn Painter, autora de 'Melhor do que nos filmes' e 'Mil vezes amor' Foto: Jackson Okun/Divulgação

Escrevendo para a geração Z

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Apesar do sucesso, Lynn demorou para se aventurar na literatura. “Eu meio que me sinto uma idiota. Levei muito tempo para descobrir. Eu sempre gostei de ler, e escrever era fácil para mim na escola, mas nunca percebi que aquela luzinha se acendeu e que eu deveria ser escritora. Foi só depois que me casei e tive filhos que minha irmã disse: ‘você lê o tempo todo, você deveria tentar escrever’”, lembra.

Mesmo com a publicação de seus primeiros livros, ela manteve o trabalho na imobiliária e escrevia no tempo livre, quando não estava cuidando dos filhos. “Eu trabalhava seis horas por dia no meu emprego, levava e buscava as crianças na escola e, basicamente, à noite, tomava energéticos e ficava acordada escrevendo até dormir no teclado”, diz.

Agora, isso mudou: “Na semana que vem, faz oficialmente um ano que sou escritora em tempo integral e tem sido incrível. Todos os dias tenho que me beliscar para acreditar que posso sentar em frente ao meu computador e escrever o dia todo”.

Lynn Painter com exemplares de 'Melhor do que nos filmes' e 'Amor por engano' durante a Bienal do Livro do Rio em 2023. Foto: Rafaela Cassiano/Intrínseca/Divulgação

Para Lynn, ser mãe de adolescentes a ajudou a desenvolver uma linguagem para esse público. “Parece que estou constantemente cercada por eles, então sinto que isso acaba se infiltrando. Não tento pensar em como posso me conectar com esses jovens, mas acho que quando você está no TikTok e nessas coisas, você está tão cercado por eles que não é tão difícil quanto teria sido em outro momento”.

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Apesar de não tentar diretamente, ela parece ter um jeito para se relacionar com esse público. Basta reparar que seus livros têm referências constantes a produtos culturais, de Harry Potter a Star Wars, e a artistas como Taylor Swift - em Mil Vezes Amor, uma frase da cantora vira até tatuagem da protagonista.

“Isso é totalmente meu lado de fã aparecendo e a conexão que criei com os leitores [por conta disso] é como um bônus”, diz. A escritora diz, entretanto, que tudo isso precisa ser medido com parcimônia. “Também é complicado porque tudo muda muito rápido. A sua rede social favorita de hoje, daqui a um ano, pode ter desaparecido. Tento deixar muita coisa de fora ou generalizar”, explica.

Há 15 anos, se alguém falasse sobre estar no Facebook, hoje você já diria: não, a geração Z não está no Facebook. As gírias mudam tão rapidamente que, se você abusar delas, de repente o livro fica completamente datado. Portanto, há uma espécie de linha tênue de generalidades e imprecisões, mas também de familiaridade com o que está sendo usado na época”.

Lynn Painter

Histórias de amor no mercado editorial de hoje

Lynn só é uma novata no mercado das histórias românticas se considerarmos o tempo em que seus títulos estão nas livrarias. Suas referências vão de clássicos como Jane Austen, nomes consolidados como Julia Quinn (responsável pelas obras que deram origem à série Bridgerton), a até fenômenos recentes, como Ali Hazelwood, cujo livro A Hipótese do Amor, de 2022, já vendeu mais de 100 mil exemplares só no Brasil.

Lynn Painter durante sessão de autógrafos na Bienal do Livro do Rio em 2023. Foto: Rafaela Cassiano/Intrínseca

“Sinto que o mercado editorial está reconhecendo que é o que muitas pessoas gostam. Por isso, acredito que eles estão se apegando a isso e publicando muitos desses tipos de romances. Isso é ótimo para os escritores do gênero, mas não sei se o estigma que ele sofre está diminuindo”, aponta.

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Para ela, esse gênero de romance ainda é prejudicado por generalizações ou pessoas que tendem a ver o estilo como menor. “A maioria destes livros é escrito a partir do olhar feminino. Acho que essa é uma grande parte do motivo pelo qual eles são visto como inferiores”, argumenta Lynn.

“Não sei se isso vai mudar, mas acho que o mercado editorial sabe que é uma fonte de dinheiro. Pelo menos está sendo divulgado”, completa.

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