Morre aos 97 anos o editor e crítico Jacó Guinsburg

Intelectual foi fundador da editora Perspectiva, até hoje referência em obras ensaísticas

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

O editor e crítico de teatro Jacó Guinsburg morreu na tarde desse domingo, 21, em São Paulo, vítima de insuficiência renal. 

O editor e crítico Jacó Guinsburg, morto aos 97 anos 

PUBLICIDADE

Jacó, que estava internado no hospital Albert Einstein, veio para o Brasil aos três anos de idade, em 1924, vindo da cidade de Rîșcani, na Bessarábia, região que atualmente fica entre a Ucrânia e a Moldávia.

O intelectual escreveu sobre literatura judaica no Estado e começou sua atividade editorial já na década de 1940.

Em 1965, após uma temporada na França, onde cursou filosofia em Sorbonne, Guinsburg fundou a editora Perspectiva, da qual era diretor-presidente até sua morte. 

A Perspectiva se tornou uma das casas editoriais de referência para a publicação de crítica literária, teatral e ensaios.

Publicidade

Guinsburg foi editor de autores brasileiros como Antonio José Saraiva, Anatol Rosenfeld, os irmãos Augusto e Haroldo de Campos, e Décio de Almeida Prado; além de estrangeiros como Umberto Eco, Roman Jakobson,  Tzvetan Todorov e Fernand Braudel.

Nos anos 1980, Guinsburg publicou teses sobre teatro e, em 2000, explorou a própria faceta de escritor e publicou O Que Aconteceu, Aconteceu, livro de contos com memórias e sátiras sobre a cultura judaica, e, este ano, Jogo de Palavras, que reuniu seus poemas, ambos pela Ateliê Editorial. 

A última entrevista que Guinsburg concedeu à imprensa foi publicada pelo jornal Cândido, da Biblioteca Pública do Paraná, na série Os Editores. A conversa com o escritor Ronaldo Bressane revelou que o maior livro que ele editou foi O Judeu da Babilônia, de Issac Bashevis Singer, em 1948, ainda na editora Rampa. “Ele era absolutamente desconhecido”, afirmou o editor na ocasião. 

Bressane relembra a entrevista: “O Jacó me deu uma entrevista de duas horas. Parecia frágil, mas demonstrava muita vontade de conversar”, disse ao Estado. “Ele falava sem parar, uma conversa em vaivém cheia de digressões pela história, filosofia, literatura e teatro, sempre desviando para um paradoxo ou uma piada autodepreciativa, bem judaica. Fiquei particularmente impressionado quando, ao pedir pra ele analisar o momento político atual, Jacó, que viveu duas guerras mundiais, disse: ‘Sinto cheiro de 1938’”, relembra o escritor. “A Gita, mulher dele, estava junto, e ele sempre se referia a ela com admiração, dizendo que a Perspectiva só estava de pé porque a mulher do editor é matemática.” 

O escritor, crítico e ensaísta Braulio Tavares lamentou a perda para a literatura brasileira: “Não o conheci pessoalmente, mas como todo leitor de teoria literária e de ciências sociais tenho uma enorme dívida com a editora dele”, disse o autor.

Publicidade

PUBLICIDADE

“Para nós, das ciências humanas, o catálogo da Perspectiva é de valor inestimável. Guinsburg marcou nossa vida intelectual de forma decisiva”, lamentou o jornalista e tradutor Irineu Franco Perpétuo. “O estudo da literatura russa deve-lhe muito pelas traduções de Maiakovski dos irmãos Campos com Boris Schnaiderman, que estabeleceram um paradigma de excelência inigualável. Na música de concerto, a Perspectiva também lançou títulos indispensáveis na estante ou na bibliografia de qualquer estudioso ou interessado. Por fim, gostaria de ressaltar os trabalhos do próprio Guinsburg, como o sensacional Büchner: na pena e na cena, volume com a obra teatral, literária e correspondências do dramaturgo alemão do século 19”, acrescentou Perpétuo.

O poeta, escritor e ensaísta Sérgio Medeiros conheceu Jacó quando foi aluno de pós-graduação em Letras na USP. "Ele tinha grande interesse em mitos indígenas, o tema o entusiasmava. Dessas conversas com ele nasceu a ideia de reunirmos num só volume grandes clássicos da literatura ameríndia, sobretudo os contos protagonizados por Macunaíma, recolhidos por Koch-Grünberg, e as aventuras de Jurupari, postos em circulação por Ermanno Stradelli. Quando o livro saiu, sob o título Makunaíma e Jurupari: cosmogonias ameríndias, o próprio Jacó escolheu as cores da capa, inspiradas na bandeira brasileira, e escreveu o texto de apresentação. Ele sabia perfeitamente que, sem a leitura desses textos, Mario de Andrade não teria escrito jamais seu romance mais famoso, que reconta tradições orais latino-americanas. Assim, posso dizer que, graças ao leque de interesses desse grande intelectual, a Perspectiva soube acolher entre suas publicações importantes narrativas indígenas que há muito estavam fora de circulação. Devemos isso a Jacó Guinsburg."

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.