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Pedro Herz, dono da Livraria Cultura, morre aos 83 anos; relembre trajetória do livreiro

A morte de um dos mais conhecidos livreiros brasileiros foi confirmada por Sérgio Herz, filho do empresário e atual CEO da Cultura

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Foto do author Julia Queiroz
Foto do author Gabriela Caputo
Atualização:

Pedro Herz, livreiro e empresário - e dono da Livraria Cultura -, morreu nesta terça-feira, 19, aos 83 anos. Ele foi o responsável por transformar a empresa, fundada pela mãe, Eva Herz, em uma das maiores potências do mercado literário brasileiro - hoje, em declínio.

Sergio Herz, filho do livreiro e atual CEO da Cultura, confirmou a morte ao Estadão e revelou que o pai sofreu um ataque cardíaco fulminante durante a madrugada. O velório vai ocorrer nesta quarta-feira, 20, às 10h, no Cemitério Israelita do Butantã, seguido do enterro, às 12h.

Pedro Herz em outubro de 2017. Dono da Livraria Cultura morreu nesta terça, 19 de março. Foto: Nilton Fukuda/Estadão

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Em 2017, Pedro Herz publicou O Livreiro (Editora Planeta), em que narra sua trajetória de vida, sempre atrelada à Livraria Cultura. No livro, ele conta desde a chegada de sua família ao Brasil, judeus alemães que fugiam dos horrores da Segunda Guerra Mundial.

Sua mãe, Eva, começou a trabalhar com livros importados com a Biblioteca Circulante, oferecendo um serviço de aluguel de títulos em alemão para seus compatriotas que também sentiam falta de ler na língua de origem. Com o tempo, acrescentou obras nacionais ao acervo, e logo decidiu abrir uma livraria. O primeiro endereço foi a Rua Augusta.

Conforme narra em seu livro, Pedro Herz cresceu em um ambiente familiar restrito, com os pais e os tios alemães, além de um primo e do irmão mais novo, Joaquim, na região dos Jardins. Estudou em escolas particulares de São Paulo, como o Externato Jardim América, na infância.

Aos 18 anos, foi incentivado pelos pais a viajar para o exterior, passando cerca de dois anos na Europa. Lá trabalhou como livreiro na Suíça, balconista em Paris e locutor de rádio da BBC em Londres. De volta ao Brasil, trabalhou no Guia Quatro Rodas, da Editora Abril, antes de se juntar à mãe como sócio da livraria.

Pedro e Eva levaram a Livraria Cultura para o Conjunto Nacional, em 1969. Ali, encerraram os serviços de aluguel de livros, focando na comercialização de títulos diversos.

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Pedro Hertz fotografado pelo Estadão em janeiro de 1999. Foto: Paulo Liebert/Estadão

A Cultura, que naquela época ocupava um espaço menor no Conjunto Nacional, virou ponto de encontro de pessoas influentes: políticos, escritores, jornalistas e intelectuais diversos. Os eventos eram agitados e, durante a ditadura, chegavam a receber visitas de militares disfarçados, conforme Herz contou em sua biografia.

A livraria se expandiu e passou a ocupar várias lojas no edifício. Foi somente em maio de 2007 que elas se agruparam para formar a famosa e gigantesca unidade, com três níveis, rampas e escadas, tornando-se atração imperdível da Avenida Paulista – e da cidade como um todo. Nos vários anos em que esteve à frente da empresa, Herz era visto na loja com frequência, entre funcionários e clientes.

Pedro Herz no canto de leitura de sua casa em 2008. Foto: ZECA WITTNER/ESTADÃO

A Cultura atraía grandes eventos, como concorridas noites de autógrafo - Rita Lee, Jô Soares, José Saramago e até o cineasta David Lynch foram alguns artistas cujos lançamentos movimentaram enormes filas.

Crise e recuperação judicial

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Após anos de uma política de expansão pela cidade e por outros estados brasileiros, nos anos 2000, a Cultura mergulhou em uma crise. Em 2018, pediu recuperação judicial, com uma dívida de R$ 285,4 milhões com fornecedores e bancos. Na mesma época, a Saraiva, então a maior rede de livrarias do País, foi pelo mesmo caminho. As duas empresas sofreram os reflexões da recessão em que o mercado editorial entrava e os efeitos da crise macroeconômica que abalou o país entre 2014 e 2017.

Mas, o que levou ao triste fim das empresas (a Saraiva teve a falência decretada e a Cultura ainda tenta uma sobrevida, entre ameaças de falência e despejo), segundo avaliação do próprio mercado editorial, foi a ambição e problemas de gestão.

Movimentação na frente da Livraria Cultura do Conjunto Nacional em 30 de junho de 2023 após liminar que permitia a sua reabertura.  Foto: TABA BENEDICTO / ESTADAO

A Cultura chegou a ter 17 lojas e 1,5 mil funcionários, e já enfrentava dificuldades quando resolveu adquirir as operações da rede francesa Fnac, que estava deixando o País, e comprar a Estante Virtual. Os atrasos de pagamento a editoras e as dívidas aumentaram. Todas as unidades da livraria da família Herz foram sendo fechadas gradativamente desde então, restando apenas a unidade do Conjunto Nacional - que, neste processo, já fechou e reabriu.

Em 2023, foi decretada a falência da Cultura duas vezes, ambas revertidas: primeiro em fevereiro, sendo suspensa alguns dias depois, e depois em maio. A empresa não teria cumprido os compromissos do plano de recuperação firmado nos anos anteriores, havendo ainda indícios de fraude em movimentações financeiras dos sócios. Em 26 de junho, a unidade do Conjunto Nacional foi fechada, o que gerou grande repercussão e comoção no mundo livreiro.

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Situação atual da Livraria Cultura

A loja foi reaberta em 6 de julho. Mas, em agosto, a livraria ainda enfrentou uma ordem de despejo, revertida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Em fevereiro de 2024, no entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou um recurso da livraria e autorizou a continuidade da ordem de despejo. Por enquanto, a Cultura segue funcionando normalmente.

Livraria Cultura, que atingiu ápice sob direção de Pedro Herz, mantém apenas 2 lojas abertas. Foto: Silvana Garzaro/ESTADAO

‘Se você não lê, como você quer que seu filho leia?’

Em 2016, Herz falou ao Estadão sobre a crise na Cultura e retração econômica que o País sofria. Naquela época, em que os e-books começaram a se popularizar no mercado nacional e as lojas de varejo online ganhavam maior espaço, ele dizia que o momento era de conservadorismo, de colocar para funcionar o que já existia e de fazer bem o que se propôs a fazer.

O livreiro contou que era muito questionado sobre o futuro do livro em papel. Para ele, no entanto, essa era a pergunta errada. “Não é o livro que vai acabar. É o leitor que vai acabar. E isso preocupa”, disse. Para Herz, a iniciação na literatura devia começar desde cedo: “Meus filhos passaram a pegar livros sem serem alfabetizados. Eles imitavam o que eu estava fazendo. A campanha que deveria ser feita é mais ou menos assim: Se você não lê, como você quer que seu filho leia?”. Lembre aqui a entrevista.

Dois anos antes, em 2014, ele esteve na redação do Estadão e falou sobre negócios familiares e o mercado de livros no País. Assista:

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