Nova livraria em Perdizes é ‘sonho adormecido’ de filhas de editor que começou nos corredores da PUC

José Xavier Cortez, o ex-lavrador que fez história no mercado editorial com a Cortez - e com sua simpatia - morreu em 2021. Agora, a livraria que ele fundou, e que estava fechada, renasce como Livraria das Perdizes; conheça a nova loja de rua de São Paulo

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Foto do author Sabrina Legramandi

Os corredores da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), em Perdizes, receberam os passos de um idealista em 1968. José Xavier Cortez (1936-2021), então estudante de Economia na universidade, traçou seu novo caminho em um espaço limitado pela ditadura militar. Bastava chegar na “banquinha” de Cortez para conseguir qualquer livro que fosse, até os proibidos pelo regime.

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O livreiro, nascido em Currais Novos, no Rio Grande do Norte, em 1936, usava a venda dos livros para complementar o pagamento da universidade particular. Antes de começar a cursar Economia em 1966, chegou a trabalhar como plantador de algodão, marinheiro e lavador de carros.

Cortez, tanto pela simpatia quanto pelo talento, passou a conquistar uma clientela fiel. Florestan Fernandes, Paulo Freire e Maurício Tragtenberg eram alguns desses clientes. Ele começou a se interessar pela edição até, em 1980, fundar a Livraria Cortez e a Cortez Editora.

O sonho, porém, sofreu um baque em 2016: a livraria paralisou as operações e se tornou apenas uma espécie de showroom da editora. O prédio cinza à frente do Teatro Tuca começou a se apagar entre as mudanças de gerações de universitários que passavam pela calçada sem ao menos se tocarem da riqueza por trás daquelas paredes.

Mara Cortez, filha de José Xavier Cortez, fundador da Cortez Editora, na Livraria das Perdizes. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Isso muda a partir desta segunda-feira, 18, quando a Livraria Cortez, agora com uma fachada colorida, se transforma na Livraria das Perdizes.

A inauguração ocorre no dia do aniversário do sr. Cortez, que morreu em 2021, antes de poder ver a livraria renascer. Seu legado, porém, permaneceu para que suas filhas Miriam, Mara e Marcia Cortez continuassem acreditando na potência dos livros e da leitura. Elas se uniram a Elaine Nunes, diretora comercial, para tocar o novo estabelecimento.

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“A livraria foi uma mudança de vida que refez toda a história da nossa família”, comenta Mara, diretora-presidente da Cortez Editora e integrante do comitê gestor da livraria, que chama a reabertura de “um sonho adormecido”. “Nós acreditamos nesse poder de mudança dos livros. Tudo passa pelos livros. Sempre existe um livro para falar sobre tudo o que está acontecendo no mundo.”

Funcionários organizam livros e estantes na Livraria das Perdizes. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Quando Cortez abriu a livraria, Mara tinha apenas 9 anos. Hoje, com 53 anos, ela enxerga potencial para as novas livrarias de rua que têm surgido em São Paulo. “Nós percebemos que há um momento de valorização dessas livrarias de rua. Há oito anos, quando fechamos, o foco era nas megastores de shopping”, diz.

A família também cita a esperança de que a Lei Cortez, projeto de lei de 2015 atualmente em tramitação no Senado Federal, e que faz uma homenagem a seu pai ao emprestar o nome dele, seja aprovada. Essa lei defende que ao longo do primeiro ano de vida de um livro seu preço seja o mesmo em qualquer livraria. Como acontece na maioria dos países da União Europeia. Isso daria uma oportunidade melhor de livrarias pequenas sobreviverem.

Como será a Livraria das Perdizes?

A data de inauguração foi uma escolha do filósofo Mario Sergio Cortella, autor da Cortez Editora e amigo de Cortez. Cortella chegou a inaugurar a antiga loja e, agora, será patrono da Livraria das Perdizes. Durante o evento, o filósofo fará um bate-papo e uma sessão de autógrafos de todas as suas obras.

A inauguração também contará com uma semana especial pelo Dia da Consciência Negra. Haverá uma mesa com destaque para livros de temáticas negras, como Manual Prático de Educação Antirracista, de Allan Pevirguladez, e Racismo na Infância, de Marcia Eurico, ambos da Cortez.

Livraria das Perdizes será inaugurada nesta segunda, 18, com a presença de Mario Sergio Cortella. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

A nova livraria, porém, não venderá apenas livros da editora: será um espaço todos os gostos e públicos - para “pessoas de 0 a 99 anos”, como define Mara. “Você vai encontrar livros religiosos, autoajuda, literatura... E livros acadêmicos, porque não conseguimos largar essa veia”, explica.

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As obras são dispostas ao longo de um espaço de 111 m². No segundo andar, haverá o Auditório José Xavier Cortez, com capacidade para acomodar 50 pessoas. O auditório vai receber contações de histórias, palestras, oficinas e trabalhos com autores independentes.

Mara também conta que começou a sondar editoras para realizar lançamentos de livros no local. Os eventos na Livraria das Perdizes, segundo ela, começarão a ser divulgados a partir da próxima semana.

Livraria das Perdizes não venderá apenas livros da Cortez Editora Foto: Daniel Teixeira/Estadão

A frente do estabelecimento ganhou um mural pelas mãos do artista João Cobra. Foi ele quem procurou as donas da livraria para sugerir uma fachada colorida. A filha dele estuda ali do lado.

A arte de João Cobra traz livros com cores significativas para as filhas do editor. O tom que prevalece é o roxo, símbolo do feminino e da modernização do espaço. “Em breve, daqui a alguns poucos anos, a Cortez faz 50 anos. Nós também estamos querendo imprimir uma cara mais moderna e com outras cores para a Cortez”, comenta Mara.

A gestora da nova livraria, que já sonha com uma ampliação do espaço, diz perceber que a novidade já chamou a atenção no bairro. “Da janela, eu já vi as pessoas parando ou passando de carro e olhando... Está tendo um encantamento que está sendo muito legal. [...] Eu enxergo um céu de brigadeiros”, celebra.

Onde fica a Livraria das Perdizes?

  • Endereço: Rua Bartira, 317, Perdizes
  • Inauguração: 18/11, segunda, das 18h30 às 21h30
  • Horário de funcionamento: 2ª a 6ª, das 10h às 19h. Sábado, das 9h às 13h. Fecha no domingo
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