Dois milhões de exemplares vendidos no Brasil, um livro recém-lançado que já é um best-seller, uma conexão com o público que nem todos os escritores conseguem ter e, a partir de terça-feira, 14, três adaptações cinematográficas disponíveis - sem contar outra, que está em produção. Esses são feitos dos quais Paula Pimenta, escritora mineira de 48 anos, pode se gabar.
Leia também
Ela conquistou uma legião de fãs, especialmente crianças e adolescentes, quando lançou o livro Fazendo Meu Filme, em 2008. A obra, que desde então ganhou mais três volumes e uma série spin-off, inspirou um filme que chega ao Prime Video na terça quase três anos após o fim das filmagens.
Na pré-estreia, no dia 29 de janeiro, em São Paulo, com presença da autora, equipe e elenco, o clima geral era de “finalmente!”. “Os leitores ficavam cobrando muito de mim. ‘Paula, cadê o filme?’ ‘Virou lenda?’ Eu não podia fazer nada. Não era comigo”, disse a escritora ao Estadão, uma semana depois.
Na mesma conversa, Paula explicou a importância do filme para ela e para seus leitores, refletiu sobre os mais de 20 anos de carreira, contou como a maternidade mudou sua vida e seu trabalho e opinou sobre o atual momento do mercado infantojuvenil.
O queridinho
Fazendo Meu Filme é o projeto mais importante de Paula, e ela não esconde. O livro, que conta a história de Fani, uma jovem de 16 anos que descobre que o melhor amigo a ama justamente quando é aprovada em um intercâmbio para a Inglaterra, foi o que a catapultou e a transformou em uma autora best-seller.
“É, de longe, o filme mais fiel [que já fiz]. Está muito igual, fui roteirista também. Tomei conta de cada detalhe e fiz questão, porque Fazendo Meu Filme é meu queridinho e eu não queria que nenhum leitor ficasse decepcionado”, diz.
A autora afirma que o clima de incerteza do cinema nacional durante a pandemia atrasou o lançamento do longa. “Todo mundo ficou meio que esperando o melhor momento para esse filme sair. Tanto que resolveram lançar direto no streaming. Acharam que seria melhor um lançamento mundial”.
De fato, a plataforma permite que espectadores do mundo todo tenham contato com a história, mas Paula confessa que não era bem isso que esperava. “No começo, fiquei bem triste porque eu estava louca para todo mundo ver na tela grande, com som alto”, diz. “Mas demorou tanto que eu já queria que saísse de qualquer jeito.”
Ela já teve dois livros adaptados para o cinema: Cinderela Pop (protagonizado por Maisa Silva e disponível na Netflix) e Um Ano Inesquecível - Inverno (parte da franquia lançada pelo Prime Video em 2023). Princesa Adormecida, inspirado no romance homônimo, teve as filmagens encerradas em junho do último ano e deve chegar às telonas em breve.
Leia também
‘Adolescente quer ler o que tem a ver com a realidade dele’
Como dizem seus leitores, é um bom momento para ser fã de Paula Pimenta. Além do filme, ela lançou em dezembro o quinto volume da série Minha Vida Fora de Série - do mesmo universo de Fazendo Meu Filme -, continuação que os fãs aguardavam desde 2017. Desde então, o livro já vendeu 40 mil exemplares.
Paula classifica esse momento como “um dos mais significativos” de sua carreira. E lista outros, começando com o lançamento de Fazendo Meu Filme 4, em 2012, quando se surpreendeu com o tratamento de celebridade em uma sessão de autógrafos em uma livraria no Rio de Janeiro.
“Eu lembro que ia entrar normalmente, como costumava fazer. E aí os vendedores já chegaram dizendo: ‘Não, você não pode entrar por aqui. A livraria tá muito cheia. A única vez que ficou tão cheia assim foi quando o Fernando Henrique Cardoso veio dar uma palestra’”, ela conta.
Cita também o ano de 2014, em que foi a brasileira que mais vendeu livros no País, ao lado de Augusto Cury, segundo a Nielsen. Nos anos seguintes, ela teve livros publicados em Portugal, Espanha e em alguns países da América Latina. Já em 2019, Cinderela Pop, sua primeira adaptação cinematográfica, chegou aos cinemas.
O sucesso, como quase tudo na vida, não veio do dia para noite. Seu primeiro trabalho foi uma coletânea de poemas intitulada Confissão, lançada em 2001. Só anos mais tarde investiu na escrita juvenil, mas demorou a conseguir a publicação.
Em uma entrevista ao Estadão em 2012, ela já havia contado que recebeu o não de uma editora com a justificava de que adolescentes não liam livros grandes. Agora, com seu romance mais recente chegando às livrarias com suas 621 páginas, ela reflete:
Não existe isso. Eles não querem ler um livro grosso de alguma coisa que não tenha nada a ver com eles, que eles sejam obrigados a ler. Mas um livro que tem a ver com a realidade deles, eles gostam. Não qualquer adolescente, mas um que dê uma chance para aquilo.
Paula Pimenta
Foi com essa noção que Paula conseguiu conquistar tantas pessoas, em especial meninas entre os 10 e 18 anos. Ela também tem alma de jovem, ao menos como você descreveria uma de forma estereotipada: tem fala meiga, adora a cor rosa, assiste comédias românticas e é tão fã da Disney que até se casou lá, em um dos parques em Orlando, nos Estados Unidos.
Muita gente se vê nela ou em suas histórias - ou foi influenciada por elas: “Tem cada [relato] que me emociona. Tem gente que fala ‘você foi a responsável por eu estar estudando cinema’, ‘eu fiz intercâmbio por causa da Fani’, ‘quis ser jornalista por causa do Léo’ [personagem de Fazendo Meu Filme]. Fico pensando em como eu mudei a vida dessa pessoa. Noventa por cento me fala que não gostava de ler e começou por causa dos meus livros”.
Ela também deixa claro que a pretensão não era essa. “Meus livros são de entretenimento. Eu nunca tive intenção nenhuma de ensinar, ser didática, passar conselhos ou ser autoajuda. Nada disso; É para se divertir mesmo”, afirma.
Paula também sabe que seus leitores estão crescendo, e que o lançamento de Fazendo Meu Filme no streaming é uma oportunidade de alcançar novas gerações. “Tem esse público fiel que está comigo desde o lançamento, um público que já tem mais de 20 anos. Leitoras que estão comigo desde novinhas. Mas eu estou achando ótimo que eu também vou retomar aquele meu público de dez anos e poucos.”
Maternidade
O ritmo acelerado da vida da mineira diminuiu com o nascimento de sua filha, Mabel, hoje com cinco anos. Até por isso que o volume mais recente de Minha Vida Fora de Série, tão cobrado pelos fãs, demorou a chegar. Ela escrevia melhor durante a noite, revisava de manhã e de tarde começava tudo de novo, mas essa rotina precisou mudar.
“Hoje em dia, eu sou mãe turista. De manhã eu fico por conta dela: balé, ginástica olímpica, teatro. Falo que agora não sou só uma, sou duas. Tenho que dividir o meu tempo”, diz. “Teve o período da gravidez também, a gente fica muito mexida. Eu não consegui me concentrar muito para escrever um livro”.
Outras coisas também mexeram com Paula: a perda do pai, a morte de seu gato, Miu Miu, e, claro, a pandemia de covid-19. Para escrever um novo livro, algo que ela conseguia fazer em apenas três meses, ela contou com uma importante rede de apoio. “Foi bem intenso mesmo. Ficou um livro muito grande e meu marido me ajudou muito. Às vezes, ele dormia no quarto da Mabel para ela não me acordar e eu estar disposta no dia seguinte.”
Apesar de sua escrita não ter mudado, a autora percebe como a maternidade mudou sua forma de ver o mundo. Ela quer ter mais consciência, sabe a importância de cuidar do meio ambiente e pensa constantemente: “O que eu estou deixando para ela?”. E reconhece: “Educar é muito difícil”.
Antes, eu escrevia minhas histórias aos olhos dos adolescentes. Agora, já estou começando a me identificar com as mães daqueles personagens.
Paula Pimenta
Mercado editorial, passado e futuro
Para Rejane Dias, diretora executiva do Grupo Autêntica, que apostou na publicação de Fazendo Meu Filme há quase 15 anos, “a chegada da Paula representou uma mudança de paradigma” para a editora.
“A partir do lançamento dos primeiros livros da Paula entendemos que era fundamental trabalhar melhor a divulgação pelas redes sociais – naquela época, a própria Paula começou a atuar fortemente no Orkut e construir uma comunidade em torno do seu universo literário”, lembra.
Rejane diz que a experiência também guiou o trabalho do selo Gutenberg, que publica os livros de Paula e é, segundo a editora, o que tem o melhor resultado em vendas do grupo. “Percebemos que existia um público ávido pelo consumo de livros que contassem histórias mais próximas de sua realidade, e com isso apostamos mais no segmento de livros para o público jovem”, afirma.
Naquela época, falava-se muito de uma rivalidade com a escritora Thalita Rebouças, que fazia grande sucesso com o público infantojuvenil e a quem hoje Paula chama de amiga. Depois, foram aparecendo outros nomes, como Bruna Vieira e Carina Rissi, até chegarem fenômenos atuais, como Pedro Rhuas e Clara Alves.
Paula se vê como pioneira? Parcialmente. “Só no sentido das editoras darem uma olhada mais atenta”, diz. “Foi a partir do sucesso de Fazendo Meu Filme que até a minha própria editora começou a buscar mais autores nacionais. Antes, só era bom o que era importado. Tinha essa crença tanto dos leitores quanto dos editores.”
Ela também afirma que vê como positiva a crescente diversidade no mercado editorial. Rhuas e Alves, citados anteriormente, publicaram romances LGBT+, por exemplo. “Gostamos de nos identificar quando estamos lendo uma história”, diz. Nesse sentido, ela também aprende com os leitores: “Tento atualizar os personagens, não deixar uma coisa lá de trás. Tento me modernizar”.
Para o futuro, Paula tem planos diversos. A filha, Mabel, lhe inspirou a escrever um livro infantil, que ela pretende publicar ainda esse ano. Além disso, ela também quer tirar da gaveta um projeto que está guardado há 20 anos, com protagonistas adultos. Ela provavelmente sabe que, para onde for, seus leitores a seguirão.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.