THE WASHINGTON POST - Deixe-me ser sincero com você: uma ajudinha seria bem-vinda. Talvez muito.
Como a maioria das pessoas, todo mês de janeiro eu tomo a decisão de melhorar a mim mesmo no ano que se inicia. Como as pessoas mais sábias, tento manter essas resoluções modestas. E, como todas as pessoas, falho em tudo o que me proponho a fazer.
Este ano, prometi comprar menos roupas, o que me pareceu uma meta atingível, especialmente porque não há mais espaço no meu armário e há muito espaço vazio na minha conta bancária. Infelizmente, parei para comprar uma calça e duas camisetas enquanto escrevia este parágrafo.
À medida que deslizo pelo escorregador dos meus 40 anos, fico cada vez mais preocupado com a possibilidade de não conseguir mudar nada. Claro, parei de fumar há uma década (e, sim, novamente cinco anos depois disso). E, claro, comprei uma bicicleta ergométrica durante o início da pandemia que ainda uso às vezes.
Mas seria mais fácil falar sobre as coisas em que fui ruim durante toda a minha vida, apesar de fazer todos os esforços (ok, alguns esforços) para melhorar: sou desleixado e nunca descobri como sorrir em fotografias. Sou péssimo tanto para comprar presentes quanto para escrever bilhetes de agradecimento. É possível que eu beba demais. Certamente fofoco mais do que deveria. Geralmente me sinto triste.
Mas se há uma coisa em que sempre fui bom - além da humildade melancólica, é claro - é ler. E embora essa aptidão tenha me proporcionado a maior parte de meus empregos na vida adulta, pouco fez para amenizar minhas falhas ou evitar meus fracassos. De modo geral, ler muitos livros serve principalmente para torná-lo mais insuportável - o que, como qualquer pessoa que me conhece desde a adolescência pode dizer, é outra coisa com a qual eu precisaria de ajuda.
Em circunstâncias ideais, ler muito apenas o torna melhor na leitura e, embora isso não seja pouca coisa, não ajuda aqueles de nós que querem, digamos, endireitar a coluna e recuar os ombros. Na verdade, todos esses livros provavelmente pioraram minha postura.
Há, no entanto, um gênero de livros que nunca me preocupei em explorar e que promete fazer uma diferença prática: a autoajuda. Como Jessica Lamb-Shapiro escreve em Promise Land (”Terra Prometida”, em tradução literal), uma exploração bem-sucedida das culturas de autoajuda, “a expressão ‘autoajuda’ carrega um estigma entre adultos inteligentes e educados”. Ela postula que isso tem algo a ver com nossa relutância em reconhecer nossa impotência, ou seja, nossa necessidade de ajuda. Falando apenas com base em minha própria experiência, eu diria que isso também tem muito a ver com simples esnobismo.
Eu sou um esnobe, mas gostaria de não ser. Essa é parte da razão pela qual estou me propondo a ler uma seleção de títulos canônicos de autoajuda este ano, livros sobre os quais escreverei nestas páginas. Estou planejando examinar pilares históricos do gênero, tal qual Como fazer amigos e influenciar pessoas, bem como sucessos mais recentes, como A arte de fazer acontecer: O método GTD, de David Allen, do qual meu amigo Ben é fã.
Talvez eu até aceite alguma “autoajuda antiajuda” do tipo que Jenny Odell tenta fazer em Resista não faça nada: A Batalha pela Economia da Atenção”, embora eu também seja cético com relação a esses esforços. Ninguém que me conhece acha que isso será fácil.
“Não consigo imaginar você lendo esses livros”, disse meu terapeuta quando lhe expliquei esse projeto. Minha namorada foi ainda mais direta: “Ah, não”, ela me disse por mensagem de texto.
Há, é claro, outros motivos para ser cauteloso com esses títulos. A premissa fundamental da autoajuda moderna, até onde sei, é que você, leitor, está sempre se atrapalhando. É uma fórmula literária com um pé no pensamento mágico. A crença de que você pode melhorar sua vida formulando pensamentos ou hábitos melhores e mais positivos significa inevitavelmente que você - e não, digamos, os efeitos alienantes do capitalismo - é seu pior inimigo.
A autoajuda é a teoria da conspiração ao contrário: os inclinados à conspiração explicam o caos do mundo identificando Outros mal-intencionados orquestrando seus males, uma premissa que oferece um conforto perverso. Por outro lado, a autoajuda lhe diz que você é a principal fonte de todos os seus problemas, que apenas incidentalmente têm causas externas.
Até mesmo as diretrizes mais práticas da autoajuda parecem partir do pressuposto de que o cultivo de rotinas básicas pode mudar toda a sua vida para melhor. Há um otimismo deliberadamente cego nessa premissa: não, seu emprego não paga um salário digno, mas e se você desenvolvesse um aperto de mão mais firme? Claro, a mudança climática parece ruim, mas você já pensou em arrumar sua cama?
Há uma pequena verdade em tudo isso, é claro. Admito, a contragosto, que dormir à noite é mais agradável quando já fechei bem os lençóis logo pela manhã. Mas isso pode ser apenas um consolo, pois é o simples fato de haver outras pessoas - e as muitas maneiras pelas quais elas falham conosco e nós com elas - que mais nos deixa desamparados. “A melhor coisa da autoajuda é que ela o liberta da necessidade de outras pessoas”, escreve Lamb-Shapiro. “A pior coisa da autoajuda é exatamente a mesma coisa.”
No entanto, se eu mantenho alguma esperança para meu ano de autoajuda, ela não reside no presente monomaníaco desses livros, mas em suas origens mais coletivas. Como explica Beth Blum, professora de Harvard, em The Self-Help Compulsion (”A compulsão pela autoajuda”, em tradução livre), uma vívida história literária do gênero, “o termo autoajuda foi popularizado no Reino Unido em guias para o radicalismo da classe trabalhadora”.
Em suas primeiras formas, na primeira metade do século 19, a autoajuda foi moldada pela convicção de que melhorar a si mesmo poderia e deveria ajudar os outros também. Essa crença ainda era evidente no pioneiro Auto-ajuda, de Samuel Smiles, um volume de enorme sucesso publicado pela primeira vez em 1859 que moldou o gênero moderno, mesmo tendo inspirado muitos escritores posteriores a criar guias mais narcisistas.
Hoje, argumenta Blum, “essas duas vertentes da autoajuda - como ferramenta de despolitização e como estratégia de enfrentamento coletiva e autodirigida - continuam a competir e a coexistir”
Ao começar a examinar uma pilha de livros que ninguém em minha vida acha que eu deva (ou possa) ler, espero poder identificar neles um pouco dessa preocupação e cuidado fundamentais com os outros. Sei que não há garantia de que conseguirei algo com essa iniciativa. Afinal, este é um projeto de autoaperfeiçoamento iniciado em janeiro. Há grandes chances de que eu desista dele da mesma forma que desisti de todos os outros. Mas talvez, apenas talvez, eu consiga pelo menos liberar alguns centímetros de espaço no armário antes disso.
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