Vou dar uma alegria àquele leitor que vive me acusando de narcisista, prepotente e sei lá o que mais. Vou assumir meus limites! Não estou muito certo de ter entendido O Grande Truque, o que não me impediu de gostar bastante do filme do Christopher Nolan, que vi ontem com o coração na mão, angustiado como poucos filmes me fizeram sentir, ultimamente. O cinema comporta múltiplas definições, mas é, ou também é, experiência e o filme do Nolan teve esse efeito para mim. Não conseguia desgrudar o olho da tela, o filme me levava por caminhos que não eram seguros e foi estimulante. Nolan me proporcionou dois grandes prazeres pessoais - acho Christian Bale genial e o filme dele me lembrou isso, mais uma vez (não existe outro ator que expresse tanto a angústia de viver); e o segundo foi ter me devolvido a Scarlet Johansson de que gosto e não é aquela fake mulher fatal do Brian De Palma no horroroso A Dália Negra (que os outros podem gostar o quanto quiserem; eu vou sempre achar o fim). Cheguei hoje no jornal, terminei de redigir as matérias que ainda faltavam para a edição de amanhã e fui atrás da entrevista que o diretor concedeu a Alessandro Giannini, que saiu no Estado. Não ajudou muito. Nolan falou o mínimo e coisas um tanto óbvias que não me esclareceram o truque do filme. O Grande Truque conta a história da obsessão desse mágico que sabe que não é tão bom (Hugh Jackman) e quer se apossar do segredo do melhor truque do outro, que reconhece como seu superior (Christian Bale). A obsessão é o meio, não o fim. Entendo que a chave do filme é o duplo. A mágica da pomba é fundamental na trama. Existem sempre duas pombas e uma delas precisa ser sacrificada para que a outra voe em liberdade. Os mágicos também têm seus duplos, que sacrificam, mas não capto muito bem a derradeira imagem (que não vou dizer qual é). Aquela máquina é de clonar? Quem clonou quem e quem matou quem? A máquina é o cinema? Nolan define um quadro muito específico. A virada do século 19 para o 20, quando o cinema estava nascendo. A rivalidade de Edison com o Tesla (personagem real, interpretado por David Bowie) não está lá por acaso. Edison, historicamente, foi um rival dos irmãos Lumière. Ele patenteou o cinetoscópio antes do cinematógrafo, seu método de captação da imagem era baseado na luz solar e ele brigou o quanto pôde para adquirir o monopólio do que intuiu que viria a ser uma grande indústria. Os irmãos Lumière, pelo contrário, achavam que o invento deles não tinha futuro, mas então surgiu Georges Méliès, que era mágico e também vislumbrou o futuro. A mágica do filme, o truque, é o cinema, claro. De tão simples, fica complexo, incompreensível até. Vou ter de ver de novo para tentar entender. Talvez nunca entenda, mas acho que vou me emocionar sempre com a dualidade do personagem do Christian Bale em relação à mulher (a maravilhosa Rebecca Hall; o que é aquilo; de onde surgiu?). No início, a sinceridade com que ele diz que ama compensa as outras vezes em que ela sabe que o marido está mentindo. Depois, o que dói é o contrário. Pelamor de Deus. O truque pode permanecer fechado, mas a emoção fluiu, para mim. É o segundo filme consecutivo do Nolan de que gosto, após Batman Begins. Não sou muito fã de Amnésia nem de Insônia, mas este cara está melhorando muito.