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Opinião|Cine BH 2024: Má Reputação e Carropasajero, os dois primeiros concorrentes da mostra Territórios

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Diário crítico (2)

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BELO HORIZONTE - Já rolaram os primeiros filmes da Mostra Territórios, a que estou seguindo mais de perto aqui em BH. Trata-se de mostra competitiva, aberta a cineastas que tenham até dois longas prévios em seus currículos. São, de modo geral, trabalhos de cineastas jovens, em início de carreira. 

Má Reputação, de Marta García e Sol Infante, vem do Uruguai. Traz a personagem Karina, uma figuraça. A certa altura, Karina diz ter sido prostituta até os 26 anos. A partir de então, liderou um movimento pela regularização da atividade e tornou-se uma profissional do sexo. 

Dito assim, poderia parecer apenas uma troca de denominações - uma secularmente pejorativa por outra, respeitosa e profissional, mais adequada aos nossos tempos. Mas é mais do que isso. É uma mudança de status e qualidade de vida, e, sobretudo, de afirmação de cidadania. 

Por sorte, Karina é uma figura carismática, que não faria feio nos filmes de Federico Fellini- tanto que alguns já a chamaram de a Saraghina uruguaia. Alusão à prostituta mítica dos filmes do mestre italiano. Como a outra, Karina é desbocada, alegre, não tem medo das palavras - é um sopro de vida num filme dirigido por mulheres que, visivelmente, temem o tempo todo serem invasivas ou tratarem com falta de respeito uma atividade ligada ao sexo.

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 Numa época pudica como a nossa, contar com uma personagem que não apenas trabalha, mas não tem medo de falar em sexo, e de maneira debochada, sem pudores hipócritas, é um trunfo e tanto e isso faz toda a diferença para a qualidade do filme. 

 

Carropasajero, de Juan Pablo Polanco Carranza e Cesar Alejandro Jaimes joga segundo outras regras. Aposta num formalismo estrito para ambientar seus personagens no deserto La Guajira, na Colômbia. As imagens são belas, parecem pinturas. O trabalho de som é impressionante. Seus personagens falam e se locomovem como fantasmas. O fio narrativo - se é que existe - traz uma mulher da etnia Wayuu que retorna ao seu território depois de anos de exílio causado por um massacre dos paramilitares. 

Mortos e vivos parecem conviver em camadas de significado de limites imprecisos. Para ser franco, em determinados momentos me sentia num ambiente construído pelo mexicano Juan Rulfo em seu clássico Pedro Páramo. Terra dos mortos, da destruição silenciosa, povoada de fantasmas. 

Foi a maneira nada banal encontrada pelos diretores para relembrar massacres acontecidos nessa terra de violência. Tudo muito bonito, mas a estetização excessiva, em diálogo explícito com a videoarte, tendem a afastar o espectador e tornar a tragédia social algo abstrato. É belo. Mas talvez padeça de beleza excessiva.  

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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