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Opinião|Cine BH 2024: Sariri e Bila Burba, a opressão sobre as mulheres e a revolução

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Diário crítico (3)

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BELO HORIZONTE - Prossegue a mostra Território, com dois longas ao dia. Agora foi a vez do chileno Sariri, de Laura Donoso, e do panamenho Bila Burba, de Duiren Wagua. Digo de cara: envolvi-me mais com o segundo, embora não completamente.

Mas vamos por partes. Sariri ambienta-se em La Lágrima, povoado de mineração perdido no meio do deserto e dominado por machos empedernidos. As mulheres sofrem. Dina sente-se oprimida por uma gravidez indesejada e tenta abortar. Sua irmã menor, Sariri, que dá título ao filme, tem as primeiras regras e sente-se igualmente infeliz. Como fugir desse inferno masculino quando se está cercada pelo deserto?

Na conversa após a exibição, a diretora disse que o longa era o desenvolvimento do seu TCC - o trabalho de conclusão de curso. Seria talvez preciso ir além; adensar mais os personagens, tanto femininos quanto masculinos, para mergulhar de fato naquela situação desfavorável. Do jeito como o filme é concebido, parece bastante superficial e não vi grande envolvimento por parte da plateia, mesmo considerando, a priori, que o público de um festival de cinema sensibiliza-se com as denúncias feitas. Talvez mais lucidez e menos vitimismo seja mais eficaz numa luta por causa justa. 

 

Bila Burba engaja-se numa questão histórica - e seu título, que tem de ser traduzido, já o indica: significa algo como "a alma da revolução". E de que revolução estamos falando? Aquela dos habitantes originais do norte do Panamá, que tiveram sua cultura ameaçada quando o país se emancipou da Colômbia e o novo governo panamenho resolveu que unificar um país recém-criado implicava reprimir culturas originárias e divergentes. 

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A revolta se deu em 1925 e portanto completa o centenário no ano que vem. Sua memória continua viva, não apenas na fala de descendentes dos que lutaram contra as forças panamenhas, mas pela tradição do povo Gunadule de reencenar periodicamente a luta. É, portanto, em um teatro a céu aberto que as histórias de batalhas, heróis e vilões, se desenvolvem. 

Bila Burba mantém acesa essa índole revolucionária de que a vida é luta e, em determinadas circunstâncias, faz-se necessário ir até às últimas consequências. As filmagens são um tanto tradicionais e não dão conta do transe de um campo de batalha. O contexto político é confuso e exige de quem vê o filme uma consulta à wikipedia para compreendê-lo melhor. 

Mesmo assim, com essas limitações, Bila Burba é um trabalho de pegada interessante, uma página da história que poucos, exceto os envolvidos e seus descendentes, conhecem. Foram vitoriosos ou derrotados? A história não contempla essas perguntas e respostas taxativas. O fato é que lutaram - e isso está no filme. Preservaram sua cultura, suas cores, sua bandeira, falam seu idioma e têm orgulho de si mesmos e de seu passado. Isso é muita coisa. 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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