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Opinião | Gostoso 2024: 'Kasa Branca', as vidas negras importam

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio

 

 

Diário crítico (3) 

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SÃO MIGUEL DO GOSTOSO/RN - Vidas negras importam (Black lives matter). Você pode dizer isso de mil maneiras - e terá sempre razão. Ou, pode, simplesmente, mostrar essas vidas acontecendo, como faz Luciano Vidigal em seu Kasa Branca, terceiro longa concorrente da Mostra de Gostoso. Não é preciso retórica. Basta registrar vidas naquilo que elas têm de simples e comovente. 

Kasa Branca faz seu retrato a partir da periferia carioca e pela ótica de um grupo de amigos. Dé (Big Jaum) mora em Chatuba, com sua avó Dona Almerinda (Teca Pereira) que sofre de Alzheimer e tem pouco tempo de vida. Tem dois amigos inseparáveis, Adrianim (Diego Francisco) e Martins (Ramon Francisco). Dé e a avó moram numa casa em más condições. Estão com o boleto atrasado, pois o pouco dinheiro vai todo para os remédios. A proprietária vem cobrar o aluguel na porta da residência e é chamada pelos rapazes de "bruxa de Blair". 

Há esse lado de molecagem, eles são todos muito jovens, mas no relacionamento entre eles sobressai a amizade e a ternura do neto, que leva a avó em sua cadeira de rodas para todo canto. Outros personagens entram e compõem a cena - as mulheres, o astro local do rap, a vizinhança, o pai distante de Dé, etc. Todo um microcosmo periférico se desenha com traços de generosidade, mas também de malícia e humor. É bom de ver. 

E há uma linha definida de narrativa, que se concentra em Dé, essa figura que precisa superar certos entraves para se situar melhor no mundo. Kasa Branca é, em certo sentido, a história de sua libertação, que vai se completar de maneira inesperada e não isenta de beleza. Um verdadeiro mergulho em direção ao mundo, à vida, simplesmente. 

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Talvez falte a Kasa Branca uma consistência dramática mais definida, que impulsione de vez a narrativa. À força de evitar a retórica ou o ímpeto demonstrativo (elementos que de fato estragam tantos projetos bem-intencionados), em Kasa Branca os acontecimentos vão se somando e fazendo sentido por aproximação - e não porque visem um final determinado e catártico. Essa contenção resulta num estilo limpo, tanto do ponto de vista narrativo quanto visual, mas que dá a impressão de que algo está faltando. O que será?

Em todo caso, com essa estratégia despojada, às vezes rarefeita, Kasa Branca tem conseguido bons resultados em sua trajetória. O Festival do Rio deu o prêmio de direção a Luciano Vidigal, além dos troféus de ator coadjuvante para Diego Francisco e os de melhor fotografia a Arthur Sherman e trilha sonora a Fernando Aranha e Guga Bruno. 

Vidigal não veio a Gostoso; está em Turim, apresentando seu filme ao público italiano. Kasa Branca estreia dia 23 de janeiro. 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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