ESTRANHO CAMINHO.
"Que estranho caminho, pai, eu tive de trilhar para te encontrar". Esta frase se encontra no novo filme de Guto Parente - não vou dizer se no início, meio ou fim. Dá título ao filme e, de imediato, durante a projeção, me lembra de outra frase famosa, pelo menos parecida a esta: "Não está vendo, pai,que eu queimo?" Essa frase foi relatada a Freud por um paciente. O homem perde o filho e, exausto, adormece durante o velório. Em seu sonho, o filho o admoesta com a frase famosa: "não está vendo que eu queimo?" Assustado, o homem desperta e vê que, de fato, uma vela havia caído sobre o caixão do filho e ateado fogo aos tecidos que vestiam o corpo do menino. A história comovente está no clássico da psicanálise, A interpretação dos sonhos.
Também na ficção de Guto Parente comparecem os elementos do fantástico e do onírico nessa história de reencontro entre pai e filho. David (Lucas Limeira) é cineasta, mora em Portugal e volta a Fortaleza para apresentar seu filme em um festival. Chega a pandemia e tudo é suspenso. Mas ele quer também encontrar o pai, Geraldo (Carlos Francisco), que não vê há muitos anos.
O fantástico, introduzido de forma abrupta numa trama naturalista (e muito bem filmada) produz certo pasmo. Mas talvez seja essa mesma a ideia do fantástico: ser um raio em céu azul, gerar o estranho quando menos se espera por ele.
Na história, mas sem entregar muito, o pai de David é um autor de livros de auto-ajuda. Aconselha famílias a serem mais unidas e os seres humanos, mais generosos entre si. Há aí uma dissonância que será percebida pelo espectador na comparação entre o que Geraldo escreve e como se comporta como pai. E mais não digo.
Apenas uma coisa: assistam a esse belo e contundente filme.
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