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Opinião | Mostra de Gostoso 2024: 'Kubrusly' emociona o público na primeira sessão do festival

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio

 

Maurício Kubrusly em Gostoso (0 segundo da esquerda para a direita), junto com a esposa e os diretores do evento  

 

São Miguel do Gostoso/RN - Foi muito emocionante a abertura da 11ª Mostra de Cinema de Gostoso com o documentário Kubrusly - Mistério Sempre Há de Pintar por Aí, de Caio Cave chino e Evelyn Kuriki. Kubrusly estava aqui em Gostoso, junto com a esposa Bia Goulart. Foi aplaudido em pé pela plateia na Praia do Maceió.

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E por que seria tão tocante um documentário dedicado a um jornalista, ainda que bastante conhecido no país por seu trabalho na Globo? Por um fato particular, e dramático: Kubrusly sofre de demência frontotemporal, doença que afeta a cognição e a memória. Já não se lembra de quem foi, do que fez ou escreveu.

No entanto, o doc nada tem de depressivo. Lembra, em certos aspectos, outro filme, este chileno, que fez muito sucesso - A Memória Infinita, de Maite Alberdi. No caso, Alberdi retrata o drama de um casal muito conhecido no Chile. O marido, Augusto Góngora, jornalista e guardião da memória do país em sua luta contra a ditadura Pinochet, acaba por ter a sua própria memória comprometida pelo mal de Alzheimer. A esposa, a atriz e ex-ministra da Cultura Paulina Urrutia, lhe dá todo apoio, numa relação amorosa e solidária, que a doença não abala.

Nos dois filmes, temos um ponto comum - a presença de mulheres fortes e amorosas (os termos não são excludentes), que dão suporte aos maridos. Outro ponto: evitam a autopiedade e toda forma de pieguice. Parecem mais celebrações do que aqueles homens foram do que lamentações sobre o que perderam com a doença. Se o termo não for piegas para leitores (e leitoras) contemporâneos, pode-se dizer que também celebram o amor entre pessoas como poderoso remédio para atenuar os efeitos do tempo, do sofrimento, do esquecimento. O senso de humor está presente em ambos. O humor, em circunstâncias difíceis, é o sal da terra. Ou, talvez, a gota de mel ofertada em meio ao amargor da vida.

No debate, Cavechini lembrou que Kubrusly não foi um repórter convencional. Interferia na situação e interagia com os entrevistados, na maior parte das vezes usando humor ou tiradas surpreendentes que davam novo rumo às conversas. "Esse traço de originalidade do personagem tinha de estar presente", diz o diretor.

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Daí, talvez, a vivacidade do filme, que se beneficia também da abundância de material de um personagem cuja carreira se deu em boa parte no âmbito da televisão. Trabalha tanto com imagens contemporâneas do entrevistado como com esse rico material de arquivo. Uma boa mescla, usada com sabedoria na montagem de um longa que, em seus quase 100 minutos de duração, não cansa jamais.

Das imagens atuais de Kubrusly retemos seu relacionamento divertido e carinhoso com a esposa e o encontro com artistas que foram importantes em sua trajetória como Gilberto Gil, Wandi Doratiotto e Luiz Tatit, entre outros. Kubrusly se entusiasma com músicas dos amigos, como se as ouvisse pela primeira vez. Ouve trechos de seus textos como crítico musical e se surpreende: "Eu escrevi isso aí?". Gil responde: "Foi você e não foi você". Gil é um sábio e nessa frase está toda a questão. A pessoa atingida por uma doença desse tipo é o seu eu antigo mas já não é mais. É quase um paradoxo ambulante, um desafio para seus familiares e amigos. O filme vale muito também como reflexão sobre o etarismo e como as pessoas podem proceder quando um ente querido perde sua memória - isto é, sua história, que no entanto é lembrada por todos que o circundam. Mistério - eis a palavra que, silenciosa, atravessa o longa, do princípio ao fim. Inclusive nos versos intuídos por Gilberto Gil e que servem de subtítulo. Kubrusly - Mistério Sempre Há de Pintar por Aí estreia na Globo Play dia 4 de dezembro.

A Mostra de Gostoso prossegue até dia 26.11, com exibições em seu telão montado na Praia do Maceio, e na Sala Petrobrás, espaço em forma geodésica para as projeções diurnas. Veja a programação abaixo.

Longas-metragens (competição)

. "Manas", de Marianna Brennand (PE-PA) . "Kasa Branca", de Luciano Vidigal (RJ) . "O Deserto de Akin", de Bernard Lessa (ES) . "Tijolo por Tijolo", de Victória Álvares e Quentin Delaroche (PE)

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Curtas-metragens (competicão)

. "Bati da Vila", de Raquel Cardozo . "Raposa", de Margot Leitão e João Fontenele (CE) . "Chibo", de Gabriela Poester e Henrique Lahude (RS) . "Yby Katu", de Kaylany Cordeiro, Jessé Carlos, Ladivan Soares, Geyson Fernandes e Rodrigo Sena . "Hoje Eu Só Volto Amanhã", de Diego Lacerda e equipe (PE) . "Axé meu Amor", de Thiago Costa (PB) . "Caluim", de Marcos Alexandre . "Pequenas Insurreições", de William de Oliveira

Mostra Panorama (longas-metragens)

. "Ainda Não É Amanhã" de Milena Times (PE) . "Baby", de Marcelo Caetano (SP) . "Salão de Baile", de Juru e Vitã (RJ) . "A Transformação de Canuto", de Ariel Kuaray Ortega e Ernesto de Carvalho (PE-RS)

Mostra Panorama (curtas-metragens)

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. "Aquela Criança com Aids", de Hiura Fernandes (RN) . "O Lado de Fora Fica Aqui Dentro", de Larissa Barbosa (MG) . "Mar de Dentro", de Lia Letícia (PE) . "A Menina e o Pote", de Valentina Homem e Tati Bond (PE) . "Se Eu Tô Aqui é Por Mistério", de Clari Ribeiro (RJ) . "Ponto e Vírgula", de Thiago Kistenmacker (RJ) . "Pulmão de Pedra", de Torquato Joel (PB) . "Boi de Conchas", de Daniel Barbosa (SP)

Sessão de abertura

. "Kubrusly: Mistério Sempre Há de Pintar por Aí", de Caio Cavechini e Evelyn Kuriki (SP, 97 min.)

Sessão de encerramento

"Luiz Melodia - No Coração do Brasil", de Alessandra Dorgan (SP, 75 min.)

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Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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