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Opinião|Vitória 2024: Não existe Almoço Grátis. É mesmo?

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
 

Diário crítico (2)

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VITÓRIA - Não existe almoço grátis. A frase do economista Milton Friedman foi inscrita em bronze por 10 entre dez economistas liberais brasileiros. Quer dizer que em nossa sociedade mercantil nada é dado de graça. Qualquer oferta traz consigo algum interesse, explícito ou escondido. Não existe almoço grátis, no entanto, é o título de um documentário que vai ao extremo oposto dessa visão economicista da sociedade humana.

Dirigido por Marcos Nepomuceno e Pedro Charbel, aponta sua câmera para a comunidade do Sol Nascente (DF), a maior favela do Brasil, na qual três mulheres lideram uma das cozinhas solidárias do MTST, que distribuem almoços gratuitamente a pessoas necessitadas.

No tempo do filme, estamos na véspera da posse de Luís Inácio Lula da Silva, para seu terceiro mandato, após derrotar Jair Bolsonaro nas urnas. As três mulheres são encarregadas de cozinhar para a multidão que chegará à capital para a posse do presidente em 1º de janeiro de 2023. Enquanto cozinham, contam suas histórias de vida.

Uma delas diz ter votado em Bolsonaro em 2018. Mas logo se arrependeu. E foi no campo oposto que descobriu sua humanidade. Conta que vivia se sentindo culpada porque, sem marido e com vários filhos para criar, achava que não tinha casa própria por desleixo ou preguiça. Era sua culpa. No movimento, descobriu que ter um teto sobre a cabeça é um direito de todo ser humano.

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São histórias de vida muito bonitas. E nos ajudam a pôr os pés no chão, em especial quando estamos numa bolha como um festival de cinema. Parece que as nossas questões são as mais importantes do mundo. Mas há outro mundo lá fora, com gente real e necessidades concretas. O bonito nessa história é que o próprio cinema nos fornece essa consciência e nos descentra de nossas inquietações de classe média. Nem tudo passa pelo nosso umbigo. Pelo contrário: às vezes é o principal que nos escapa.

Curtas

Saudades em Cor (ES), de Arthur Felipe Fiel é uma bonita animação, que traz um garotinho revisitando a memória de um avô, levado por um vírus estranho.

Quinze Quase Dezesseis (SP), de Thais Fujinaga foi o que achei o mais interessante da noite. A prática do basquete deu à adolescente Tamiris a oportunidade de estudar numa escola particular. Ao mesmo tempo, a turma da escola ensaia para uma apresentação de Sonhos de uma Noite de Verão, de Shakespeare. Num dos ensaios, a garota sofre um abuso sexual. O filme é o tratamento delicado desse tema, que muitas vezes é tratado de maneira sensacionalista, quando não oportunista. A relação entre o enredo da peça e a "vida real" dão um toque especial ao filme, que mantém o estilo alusivo da diretora.

Samuel Foi Trabalhar (AL), de Janderson Felipe e Lucas Litrento. Um garoto trabalha vestindo a fantasia de boneco símbolo de uma construtora. Trabalho mais que árduo. Mas ele está em vésperas de realizar seu sonho - ser contratado "de carteira assinada" pela empresa. Tem sua graça, a denúncia da precariedade vale, mas por vezes soa muito didático e caricatural.

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Se Eu Tô Aqui É por Mistério (RJ), de Clari Ribeiro. No Rio de Janeiro de 2054, a bruxa Dahlia chega ao porto para fundar o clã que poderá derrotar a Ordem da Verdade. Fantasia trans, com produção luxuosa que, de acordo com o diretor, pretende desfazer clichês de representação de pessoas transgênero.

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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