EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Pequenas neuroses contemporâneas

Opinião | Casamento não monogâmico é solução?

De Madame Bovary, Anna Karenina, Capitu às influencers e famosas que recheiam as telas de sites de notícias com confissões de ‘traições’, ‘trisal’, o adultério não parece exceção

PUBLICIDADE

Foto do author Marcelo Rubens Paiva

Só se fala nisso nas redes sociais, bares, consultórios, entre quatro paredes: o casamento deve ser não monogâmico? Quantas vezes você já escutou ou leu: “Fulano e sicrana abriram o casamento”.

PUBLICIDADE

Se der uma busca, “casamento aberto” tem mais visualizações do que “casamento feliz”. Pelo menos na região do Vale Encantado do Rio Pinheiros onde moram liberais progressistas, gente de esquerda e eleitores da Tebet, onde a liderança tucana é vizinha da petista, se conhece Marta Suplicy como a primeira telessexóloga do Brasil e se aprendeu sobre as amarras da sociedade patriarcal com Simone de Beauvoir. Aliás, ela e Jean-Paul Sartre formaram o primeiro casal assumidamente aberto.

Sou do tempo e de uma bolha em que se dizia que o casamento era uma instituição falida; a monogamia, uma imposição pequeno-burguesa; depilação, uma obrigação autoritária; e, tomar vinho no copo de plástico, uma grande heresia.

Suruba era um ato tropicalista, revolucionário. Indígenas não são monogâmicos. O modernismo trai pela antropofagia o conceito de casamento. O psicólogo reichiano Roberto Freire pregava: “Sem tesão não há solução”.


Casamento Foto: Pixabay/ @debowscyfoto


É dele o livro Ame e Dê Vexame e a somaterapia, processo terapêutico e pedagógico feito em grupo e com ênfase na articulação entre o trabalho corporal e o uso da linguagem, que buscava no pensamento anarquista uma crítica a variadas formas de poder impregnadas no comportamento individual e nas relações sociais.

Publicidade

No seu retiro, na paradisíaca Visconde de Mauá, o grupo se reunia e, como um laboratório social, desenvolvia uma análise libertária do comportamento de cada um a partir da relação junto ao outro. Que dava em sexo.

De Madame Bovary, Anna Karenina, Capitu às influencers e famosas que recheiam as telas de sites de notícias com confissões de “traições”, “trisal”, o adultério não parece exceção.

Esther Perel escreveu no livro Casos e Casos que onde há regras há transgressões ou, como aprendemos desde criança, “o proibido é que é gostoso”. A monogamia pode não ser natural dos seres humanos, mas a transgressão é. “Quebrar as regras é emocionante e erótico.” Até a estrutura conjugal mais flexível pode sofrer um revés. Portanto, o casamento não monogâmico não é o suco verde que tudo cura. Talvez seja a admissão de que fracassamos.

Tem razão quem diz que a não monogamia não é a cura do patriarcado nem a solução heterossexual do milênio. Porém, convenhamos, a monogamia provou ser incapaz de “cadear” a corrente do amor eterno, a salvação contra as rígidas leis bíblicas. Que venha uma terceira via no amor.

Opinião por Marcelo Rubens Paiva

É escritor, dramaturgo e autor de 'Feliz Ano Velho', entre outros

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.