Palavras podem ser “estranhas, difíceis e feias”, diz o protagonista de O Coração às Vezes Para de Bater. Como quando ouvimos uma notícia para a qual não estamos preparados, ou não temos recursos. Mas as palavras nos ajudam a organizar o caos. E é por isso, para entender e suportar a vida que de repente fica séria demais, para lidar com coisas de nomes difíceis e feios, que ele escreve.
O personagem desta breve ficção de Adriana Lisboa não sabe “como começar a escrever o que queria, ou precisava, escrever”. Ele tampouco sabe, de verdade, para quem escreve e se aquilo será de fato uma carta. “Se for uma carta, para ser mesmo carta, ela precisa ser lida. Não precisa?”, questiona no começo, e repete depois.
O livro, lançado originalmente em 2007, volta agora às livrarias pela Maralto – sem o skate que aparecia na capa nas primeiras edições e que dava uma cara mais juvenil à obra. O leitor, adolescente ou não, vai encontrar nesta novela uma sensível história de amadurecimento.
O narrador é um garoto que acaba de fazer 15 anos. Vive com os pais e a irmã num apartamento apertado no bairro do Catete, no Rio. Está às voltas com a descoberta do amor e com sua primeira perda.
Em seu texto, o garoto se dirige a alguém que ele acabara de conhecer na rua e com quem dividiu momentos e conversas sobre skate – um interesse compartilhado pelos dois. Um novo amigo, numa fase em que é difícil fazer amizade.
Ele relembra este encontro ao mesmo tempo que vai se abrindo e contando sobre si. Fala também, e muito, de Paloma, sobre o dia em que a viu pela primeira vez na praia, sozinha. Silêncio e mar: a primeira vez que seu coração parou. E descreve a amizade inesperada que nasceu com aquela manhã, virou amor e o levou, um dia, a pensar em futuro.
É do quarto dela que ele escreve, um refúgio que ele não encontra em seu próprio lar. Este é, também, um livro sobre um adolescente buscando um lugar. E respeito, afeto e conforto emocional. “Na minha casa, quando as coisas não são ditas aos berros, elas simplesmente não são ditas”, ele escreve, e diz que se vê como um estranho, entre estranhos. “Quando é que falamos verdadeiramente de nós mesmos, de nossas vidas, daquilo que faz nossos corações baterem ou pararem de bater?”, divaga.
Um livro sobre um garoto tentando dar conta, sentindo as dores do crescimento, vivendo o que há para viver enquanto tenta entender o compasso da vida: por que as coisas acontecem de um jeito e não de outro? Por que o coração às vezes para de bater?
O Coração às Vezes Para de Bater
Autora: Adriana Lisboa
Editora: Maralto (88 págs.; R$ 44,90)
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