Há poucos dias, Maria Stella Splendore, de 76 anos, voltou a desfilar, na São Paulo Fashion Week, após quatro décadas longe das passarelas. Ex-mulher de Dener, que foi referência da moda nos anos 60 e costureiro da então primeira-dama Maria Thereza Goulart, ela se tornou uma celebridade aos 16 anos.
Sílvia Pfeifer, de 66 anos, também participou da última Semana de Moda de São Paulo atuando como modelo 60+. Ambas contam como é a experiência de estar na passarela com muita bagagem, mas já em outra época, com hiatos no meio do caminho. Elas falam ainda dos sentimentos que surgiram durante as apresentações e se os códigos mudaram.
“Eu acho que a Silvia que sobe à passarela não é apenas a modelo, mas também a atriz que todo mundo conhece. É o segundo desfile que faço com Lino Villaventura no último ano e meio, então já havia um certo acolhimento,” conta.
Em relação ao início da carreira, ela observa que desfilar aos 66 anos é completamente diferente: “Hoje não tenho mais a mesma prática, mas, ao mesmo tempo, é como andar de bicicleta. Você nunca esquece. Eu vou descer a ladeira com a mão no guidão; não vou mais descer com a mão livre, mas eu vou descer… Trabalhei tanto nisso na Europa e no Brasil”.
Hoje não tenho mais a mesma prática, mas, ao mesmo tempo, é como andar de bicicleta. Você nunca esquece.
Sílvia Pfeifer
Há 20 anos vivendo em uma fazenda Hare Krishna em Pindamonhangaba, Splendore disse que não lutou para conseguir o convite para desfilar para Normando. Emídio Contente, marido e sócio de Marco Normando, entrou em contato e a segue nas redes sociais. “A única coisa que eu estranhei foi a falta da passarela, porque hoje em dia é no chão. Na nossa época, era realmente uma passarela,” conta.
“Adorei a experiência com essa juventude que está começando. Eles são extremamente carismáticos. O meu vestido foi bastante inspirado no Dener, era de cetim, azul e muito bonito. Foi um desafio porque, embora tivesse fornecido as minhas medidas e tudo estivesse perfeito, o vestido ficou muito comprido. Na prova, antes do desfile, coloquei uma bota alta, mas percebi que não ia dar para usá-la no momento da exibição; eu ia tropeçar. A costureira veio e ajustou, e eu entrei com o vestido cheio de alfinetes. Isso me lembrou muito a época do Dener, pois muitas vezes fui a festas e desfilei alfinetada.”
Eu entrei com o vestido cheio de alfinetes. Isso me lembrou muito a época do Dener, pois muitas vezes fui a festas e desfilei alfinetada
Maria Stella Splendore
Sobre a presença de modelos 60+ nos desfiles de moda e na publicidade, Splendore diz: “Se você tem o dom de fazer isso, eu acho fantástico, porque a moda não é só para os jovens. Como envelhecer de uma forma agradável e elegante, independente de qualquer coisa?”.
Para ela, a idade é tanto física quanto mental: “É um pouco das duas coisas, porque todos os problemas físicos começam na mente. A mente pode te derrubar ou te levantar. Por exemplo, eu tive que ir ao pronto-socorro porque meu gatinho me machucou. Então, depende de mim fazer disso um drama ou encarar como uma situação independente de mim. Vou agir de forma positiva, acreditando que vai passar”.
Silvia Pfeifer endossa: “Acredito que a idade seja mais mental do que física. Se conseguirmos, desde cedo, não nos apegar a padrões pré-estabelecidos como ‘não posso’ ou ‘não faço’, procurando nos superar, não apenas fisicamente, mas também psicoemocionalmente, acredito que o envelhecimento chega depois”.
Por outro lado, ela diz que não dá para ignorar que o corpo muda com o tempo: “Eu tive um congelamento, uma questão no ombro, a mesma causa desde que tenho 20 e poucos anos. Mas tive agora de uma maneira muito forte. Então, o nosso fisiológico já não é mais o mesmo. As células já não se renovam da mesma forma. Não dá para negar a ciência”.
Diversidade etária na moda
Pfeifer ressalta a importância de ter pessoas mais velhas na moda e na publicidade para combater preconceitos. Defende que as campanhas devem buscar também modelos não conhecidas, para que não se foque apenas na fama, mas na diversidade etária. “A gente precisa trabalhar para desmistificar essa ideia de que a beleza é só até uma certa idade e que o mais bonito é sempre o mais retocado. Não que eu não faça procedimentos estéticos. Acredito que podemos e devemos fazer pequenas coisas para retardar o envelhecimento, mas não da forma como normalmente tem sido feito,” afirma.
A atriz acredita que os tempos estão se tornando mais tolerantes, mas ainda são insuficientes as oportunidades para modelos acima de 60 anos na moda e na propaganda : “É fácil falar, sendo que a realidade não caminha na mesma velocidade. Acaba-se procurando pessoas mais jovens com um perfil físico específico para a venda de determinados produtos. Espero que isso melhore e que eu, Zezé Motta e tantas outras pessoas possamos contribuir para essa mudança”.
Confira trecho da entrevista em vídeo com elas:
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.