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Alice Ferraz: De volta ao passado

Encontrar alguém depois de 20, 30 anos acende esses faróis e é tarefa para quem gosta de fortes emoções

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Por Alice Ferraz

Esta coluna só poderá ser entendida por quem tem mais de 40 anos e serei taxativa – mesmo abrindo mão aqui de alguns leitores. Existem sensações e sentimentos que só podem ser vividos com o “farol voltado para trás” como dizia o médico e escritor Pedro Nava. Encontrar alguém depois de 20, 30 anos acende esses faróis e é tarefa para quem gosta de fortes emoções. 

Pode ser que seja uma pessoa que nem foi importante na sua vida, um colega de classe, por exemplo, ou alguém que você sempre pensou em reencontrar, mas absolutamente tudo vai mexer com você de uma forma única. É que esses encontros muito embora pareçam encontros com outros são, na verdade, encontros com nós mesmos. O que fizemos, como nos relacionamos e nossa história com a pessoa no tempo passado vão aparecer como um filme na nossa frente. 

Ilustração para a coluna de Alice Ferraz Foto: Juliana Azevedo

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O que fizemos durante o caminho e quem somos nesse presente, frente a frente com aquele que é testemunha da passagem do tempo, trazem algo ora reconfortante, ora desesperador. A antiga relação parece ter se mantido em suspenso, parada ali no último encontro. 

Daí que sentir raiva, amor, vontade de abraçar ou brigar, falar muito sobre o passado ou tentar resumir a história da sua vida em dois minutos para sair correndo, tudo é possível. O tempo estava lá congelado e, de repente, o encontro faz ele avançar em fast forward em uma montanha-russa de lembranças. 

Em silêncio, nos cobramos e cobramos o outro – e, dependendo de onde acreditamos que estamos nessa gangorra da relação, somos gratidão ou horror, orgulho ou vergonha. Vulneráveis e absolutamente humanos. 

E quando ela viveu tudo isso em poucos minutos em pé, no meio do shopping, sentiu a vida gritar dentro dela e entendeu que levaria dias percorrendo com lupa o caminho passado. Voltou a falar de Pedro Nava, que sabia disso e que a fez intuir esses sentimentos aos 18 anos, quando o leu pela primeira vez. 

“O tempo existe só no plano ideológico, o passado tem uma existência que não é fixa”, dizia o escritor. A frase lida só foi entendida 33 anos depois naquele dia em que o passado que não é fixo se fez presente ali no futuro. 

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