Cada vez mais, a alta-costura levanta questões que dizem respeito ao seu lugar no mundo. É o único lugar onde as roupas viram obras de arte e as clientes são chamadas de colecionadoras. É onde a moda se compromete com inovação, criatividade e excelência técnica, mantendo vivos saberes manuais de artesãos e artesãs que muitas vezes ultrapassam os limites de suas habilidades. Terreno fértil para que designers trabalhem livremente sem se preocupar com budget, tempo ou demanda de massa. Esse é o papel que cabe à alta-costura hoje: um sonho de dentro pra fora.
Mas ela precisa dialogar com o presente. A temporada mais recente, de Verão 21 – com a maior parte das apresentações em formato digital –, revela um grupo disposto a criar diálogos e aproveitar os privilégios da alta-costura para levá-la um passo adiante. São os guardiões de sua permanência neste mundo cada vez mais fragmentado e digital. Ao todo, 18 marcas desfilaram, mas apenas algumas se destacam nesse contexto.
Valentino e Schiaparelli são bons casos de marcas tradicionais que romperam com a alta-costura à moda antiga, introduzindo uma abordagem mais moderna. Enquanto Pierpaolo Piccioli cria peças que parecem casuais e simples na silhueta, mas são complexas e elaboradas no fazer, Daniel Roseberry impacta com sua interpretação contemporânea do surrealismo que inspirava Elsa Schiaparelli.
Da turma nova que está chegando, vale destacar os mais disruptivos, como Sterling Ruby e Charles de Vilmorin que, aos 24 anos, é o novo prodígio da couture, apadrinhado por Jean Paul Gaultier e seguido nas redes por nomes como Marc Jacobs e Alessandro Michele.
Em última análise, a atribuição de laboratório criativo é o que mantém a alta-costura influente. Um espaço onde a criatividade possa florescer sem amarras, não apenas para as poucas pessoas que compram, mas também para quem busca na moda uma amostra de quão longe ela pode ir.
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