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Reflexões: Passei a vida à toa?

Mario Sergio Cortella cita o poeta Manuel Bandeira para comentar a turbulência atual

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Por Mario Sergio Cortella

Manuel Bandeira, nascido em 19 de abril de 1886, teceu obras memoráveis, ficando (ainda bem!) sempre na moda. Dos seus muitos e intensos poemas, há um, simples na aparência, pequeno só no tamanho, Andorinha, quando se inquietou: “Andorinha lá fora está dizendo: / – Passei o dia à toa, à toa / Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste! / Passei a vida à toa, à toa...”.

Mesmo que de modo incipiente, ainda tímido, nesta turbulência em que as nossas vidas ficam em estágio de suspensão (movidas pelo espanto vindo da consciência da nossa fragilidade, atingidas pela perplexidade ao defrontarmos a nossa impotência e sobressaltadas com a extensão do nosso desconhecimento), o silêncio eventual traz dramática indagação: a vida passa, sem dúvida, mas, e se ela passar à toa?

Mario Sergio Cortella faz reflexões com base em Manuel Bandeira. Foto: Tomás Artuzzi/Nova Escola

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Agora, em tempos de agonias, as batalhas pela preservação das nossas vidas vêm acompanhadas de uma mescla de aflições que nos rondam e desembocam em uma mais direta e “customizada”: essa vida que quero tanto preservar, como tem sido? Como precisa ser? Como farei para que não seja à toa?

Em vários momentos, temos a sensação de encostarmos em precipício, meio espelhado, vislumbrando interior e exterior, lembrando trecho de Nietzsche no livro Além do Bem e do Mal, publicado em 1886, exatamente no ano em que nasceu Manuel Bandeira: “Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você”.

* Mario Sergio Cortella, filósofo e escritor, é autor de mais de 45 livros com edições no Brasil e exterior, entre eles Por Que Fazemos O Que Fazemos? (Planeta), Qual é a tua Obra? (Vozes) e Viver, a que se destina, com Leandro Karnal (Papirus)

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