Uma das grandes dores da indústria da moda global são as condições de trabalho de uma parcela significativa da mão de obra do setor. A cadeia de produção é longa e complexa, com etapas intensas que nascem no plantio do insumo e passam por tratamento dos fios, tecelagem, tinturaria e confecção.
Uma parte das empresas do mercado ainda tem fornecedores e fábricas com funcionários que muitas vezes vivem em situações análogas à escravidão ou na informalidade. Segundo dados de 2018 do Global Slavery Index, pesquisa que expõe fatos sobre escravidão moderna no planeta, a indústria do vestuário é a segunda que mais produz nessa situação.
O assunto também foi tema de documentários, caso do The True Cost (2015), que em uma hora e meia expõe como algumas marcas lucram com a exploração dos trabalhadores, entre eles mulheres e crianças. A obra retrata as difíceis condições de sobrevivência de todos.
No Brasil, dados da Fundação Walk Free revelam que 369 mil pessoas vivem como escravos modernos e trabalham em diversos setores econômicos, incluindo a moda. Ciente desta questão, a ABVTEX, Associação Brasileira do Varejo Têxtil, se uniu a grandes representantes da moda brasileira para liderar o movimento ModaComverso, o primeiro selo que promete garantir uma moda socialmente responsável.
“Hoje, 80%, em média, do que é comercializado no País, é produzido nacionalmente. Queremos mostrar a complexidade dessa cadeia e todo o trabalho que vem sendo feito para garantir uma origem sustentável, o respeito à dignidade das pessoas que estão trabalhando e de certa forma conscientizar o consumidor para que ele busque essa cadeia produtiva mais humana, ética e transparente”, afirma Edmundo Lima, diretor executivo da ABVTEX.
Para ele, é importante que toda a sociedade civil se envolva, cobrando atitudes das marcas que escolhem vestir. O selo, segundo Lima, pode contribuir como se fosse uma bússola para as escolhas individuais.
A consciência como fator relevante para o processo de decisão de compra é algo que se intensificou durante a pandemia, como mostra o relatório divulgado pela Accenture, que diz: “Consumidores estão mais atentos ao que estão comprando. Marcas precisarão fazer disso uma parte-chave de sua oferta”. A transformação foi notada também pela ABVTEX que, na quinta-feira, 16, lança o projeto que está em conexão com os desejos dos consumidores.
“Percebemos uma mudança drástica nos hábitos de consumo. As pessoas estão com um alerta maior em relação a questões de sustentabilidade, que incluem o meio ambiente e também as questões sociais”, afirma o diretor executivo.
A associação realiza o programa de auditoria desde 2010, abrangendo diversos elos da cadeia produtiva de moda, do plantio e tecelagem à confecção. Agora, com a criação do ModaComVerso, a entidade passa a dar mais visibilidade a empresas que estão trabalhando de forma socialmente sustentável, entre elas marcas como Renner e Reserva.
“Auditamos 100% das fábricas que fornecem para essas grifes associadas, para garantir formalização, boas condições de trabalho, adequação às leis trabalhistas, às questões de saúde e segurança deste trabalhador e à parte estrutural do fornecedor.
Também entrevistamos esses trabalhadores para identificar questões de abuso, assédio, violência e outros problemas”, diz o empresário. “Hoje, esse monitoramento é feito por 70 auditores em nível nacional, que monitoram mais de 3.500 empresas aprovadas no programa. Desde que o trabalho foi iniciado, ultrapassamos 42 mil auditorias”, afirma Lima.
A intenção do projeto é avançar no desenho de um futuro mais consciente. É uma resposta necessária aos desejos de um novo consumidor que se preocupa com o planeta e com a sociedade. O ModaComverso chega para dar destaque para quem está fazendo certo e para estimular a mudança em marcas que ainda não trabalham desta forma.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.