A música clássica continua a se reinventar e a atrair um novo público. Entre releituras de sinfonias tradicionais, reinterpretações de trabalhos revolucionários e gravações corajosas de orquestras, o New York Times separou cinco discos recentes de música erudita que comprovam a renovação constante do gênero e merecem seu tempo e atenção.
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Julius Eastman, Vol. 4: The Holy Presence - Wild Up (New Amsterdam)
Essa quarta parte da vibrante viagem do grupo Wild Up pelas obras de Julius Eastman (1940-90) não foca na visão áspera e ardente de Eastman sobre minimalismo (Stay on It, Femenine e Gay Guerrilla), mas em seu lado sóbrio e espiritual. Este volume apresenta peças que poderiam facilmente se encaixar em uma cerimônia religiosa — embora de forma idiossincrática. A abertura, Our Father, entre suas últimas partituras sobreviventes, é para duas vozes masculinas e possui o som sombrio, remetendo a um canto medieval; Davóne Tines foi sobreposto em dueto de harmonia próxima com ele mesmo, e seu barítono vasto e severo é perfeito para esta música.
Tines também é um modelo de clareza focada na declamação fervorosa de Prelude to the Holy Presence of Joan d’Arc. Eastman pretendia que ela fosse como um complemento a The Holy Presence of Joan d’Arc, 20 minutos fervilhantes e emotivos, gravados aqui na transcrição de Clarice Jensen para 10 violoncelos por um Seth Parker Woods muito sobreposto. Embora o solo Piano 2 não seja explicitamente sagrado, sua qualidade meditativa faz com que ele se sinta em casa nesta companhia. Os momentos pacíficos da peça, até mesmo sussurrantes, continuam caindo em intensidade desconsolada, mas Richard Valitutto mantém um núcleo de serenidade no meio de toda a paixão acalorada. — Zachary Woolfe
John Zorn: ‘Her Melodious Lay’ - Julian Lage e Gyan Riley, guitarras (Tzadik)
A amplitude da atividade de composição de John Zorn ainda pode atordoar aqueles que o conhecem apenas por seu papel na criação e no cultivo da cena do downtown de Nova York nas últimas décadas. A mais recente adição ao seu catálogo sempre em expansão é uma série de duetos de guitarra inspirados em Shakespeare, escritos para Julian Lage e Gyan Riley, dois músicos profundamente familiarizados com seu trabalho. O dialeto musical de Zorn pode variar imensamente, mas esta são algumas das músicas mais gentis e abertamente belas que ele fez.
Essas danças, lamentações e fantasias soam como se pudessem se encaixar em alguma era barroca alternativa, o que faz uma combinação maravilhosamente estranha com sua linguagem musical, que é pontilhada com dicas de jazz modal dos anos 1940 e folk. Sua arquitetura seccionalizada oferece vislumbres tentadores das histórias por trás de seus títulos alusivos (The Enchanted Castle [”O Castelo Encantado”], Shadow to My Sightless View [“Sombra para Minha Visão Invisível”]).
Contra um pano de fundo largamente tonal, a implantação artística de dissonância por Zorn — como em A Cruel Theft of Light and Mercutio — carrega grande peso. Talvez o mais impressionante seja a virtuosidade serena e relaxada com a qual Lage e Riley tocam essas músicas. A espontaneidade de sua interação sugere que parte de seu trabalho é improvisado, mesmo que toda a canção, de acordo com as notas de encarte, seja composta integralmente. — David Weininger
Bruckner: Symphony No. 7; Bates: ‘Resurrexit’ - Pittsburgh Symphony Orchestra; Manfred Honeck, maestro (Reference Recordings)
Em suas notas para esta gravação simplesmente excelente da Sétima Sinfonia de Bruckner, Manfred Honeck escreve de maneira tão inteligente e específica quanto sempre sobre os menores detalhes da partitura em suas mãos, e como tentou ser o mais fiel possível ao espírito deles. Ele destaca que muitos dos ritmos de Bruckner são derivados de danças folclóricas. Ele observa como o grande Adagio está textualmente ligado ao posterior Te Deum. De forma mais provocativa, ele argumenta que uma passagem extraordinária perto do final do primeiro movimento, em que os tímpanos trovejam ao redor de cordas e sopros implorantes, ilustra diretamente o momento de consagração que está no coração da Missa.
Qualquer que seja a inspiração, o efeito na prática é mágico. Se esta Sétima é uma das interpretações menos intervencionistas de Honeck, ela não é menos formidável do que suas leituras de Beethoven ou de Tchaikovsky. Mais do que em sua versão aterrorizante da Nona de Bruckner, você tem a sensação de que ele tem uma admiração reverente pelo compositor. E é difícil não sentir uma reverência similar pelos músicos da Orquestra Sinfônica de Pittsburgh, também. Que tensão e corpo há nas longas linhas legato que eles desenham, e que silêncio nos pontos de calma; que sensibilidade nos solos de madeira, e que segurança nos metais em massa. Resurrexit, de Mason Bates, causa menos impressão, mas a orquestra merece crédito por continuar a gravar algumas das obras que encomenda. — David Allen
Cage² - Bertrand Chamayou, piano preparado (Erato)
A invenção de John Cage de métodos para preparar pianos com objetos como parafusos, feltro e borracha nos anos 1940 representa uma das grandes inovações na música do século 20. As sonatas e interlúdios são a principal obra desse período; menos conhecido é um grande conjunto de peças curtas para dança dos anos 1940 e 50. Elas formam a base para esta excelente gravação do intrépido pianista francês Bertrand Chamayou, que reproduz um programa ao vivo que ele criou com a dançarina e coreógrafa Élodie Sicard.
Chamayou obtém uma variedade caleidoscópica de timbres de seu Steinway preparado; compare o som plano e duro de Mysterious Adventure e Primitive com as ressonâncias do tipo gamelan de The Unavailable Memory Of. Algumas dessas obras consistem em apenas uma única linha de música, e uma das conquistas notáveis de Chamayou é o uso de um senso de ritmo leve e preciso para manter tais peças em movimento. Em outros lugares, é possível ouvir a simplicidade de uma canção (A Valentine Out of Season) e algumas harmonias estridentes (In the Name of the Holocaust).
Essas peças possuem uma amplitude de apelo maior que a música posterior de Cage, orientada pelo acaso. No entanto, como cada piano reage de forma diferente à preparação, a música muda na performance, e é por isso que ele viu o piano preparado como um primeiro passo em direção à indeterminação. Esses métodos, Cage escreveria mais tarde, “me levaram ao prazer das coisas conforme elas chegam, conforme acontecem, em vez de como são possuídas, guardadas ou forçadas a ser.” — David Weininger
John Alden Carpenter: Complete Ballets - Boston Modern Orchestra Project; Gil Rose, maestro (BMOP/sound)
Gil Rose e seu audacioso conjunto do Projeto de Orquestra Moderna de Boston conseguiram: este lançamento deliciosamente espirituoso de balés de John Alden Carpenter é o 100º a surgir na BMOP/sound, a gravadora do conjunto. É uma conquista surpreendente, tanto pelo arrecadamento de fundos e pelo trabalho administrativo envolvido em trazer cada uma das gravações à vida quanto pela coragem artística e realização técnica que marcam a produção musical em todas elas.
Grande parte do foco da BMOP tem sido em compositores contemporâneos. John Harbison foi o tema de seu primeiro lançamento há 16 anos, e desde então nomes como Andrew Norman, Vijay Iyer, Ellen Taaffe Zwilich e Lisa Bielawa receberam atenção cuidadosa e dedicada. Igualmente satisfatório, porém, tem sido a crença de Rose em alguns dos compositores do século 20 cuja música outras orquestras escolheram esquecer: Lukas Foss, Walter Piston, Irving Fine e assim por diante.
Esse aspecto da BMOP é celebrado aqui, em performances maravilhosamente comprometidas de Krazy Kat, The Birthday of the Infanta e Skyscrapers, todas escritas entre 1917 e 1926 e brilhantemente infundidas com ecos do jazz que Carpenter pensava ser um ingrediente essencial na música de sua época. Skyscrapers, escrita inicialmente a pedido de Sergei Diaghilev, é especialmente fina, uma representação escandalosa dos americanos modernos no trabalho e no lazer. Como todo lançamento da BMOP, este merece ser ouvido. - David Allen
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