“Procurando um disco ou livro? Se não temos, acharemos!”. É essa a promessa ambiciosa que estampa a vitrine da Eric Discos, tradicional loja de discos de vinil em Pinheiros, bairro da Zona Oeste de São Paulo.
Quem se atrai e entra no lugar com um aviso de “desde 1978″ em mosaico na calçada, vê logo a promessa se cumprir. É como ter uma viagem no tempo e chegar à Londres dos anos 1970. Segundo o dono, o inglês Eric Crauford, de 78 anos, há 80 mil discos na loja.
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Nesta quinta-feira, 18, porém, dá para perceber que se está na São Paulo de 2024. Um enorme aviso com um QR Code divulgando o novo álbum da cantora Taylor Swift, The Tortured Poets Department, a ser lançado nesta sexta, 19, estampa um outdoor no exterior da loja.
Do outro lado da rua, rostos jovens riem com um enigma deixado pela cantora pop: o código leva a um vídeo de uma máquina de escrever que, segundos depois, digita a letra H. Cada cidade escolhida por ela recebeu uma letra, formando a frase “For a fortnight”. É uma divulgação de Fortnight, parceria com Post Malone, primeiro single do disco.
Ser escolhido como o único no Brasil a fazer a divulgação do lançamento foi uma surpresa para Eric. Conforme o inglês, o contato foi feito por uma agência de publicidade. “Eu estudei a oferta e aceitei. [...] Achei que teria também no Rio, em Manaus, porque é a Taylor Swift e, mundialmente, ela está em primeiro lugar, né?”, diz.
Eric afirma ter clientes do mundo todo e até visitas de grandes artistas nacionais e internacionais. Ele, que conta ser amigo de Supla, seu freguês, já recebeu nomes como U2 e Fatboy Slim. O clipe de Meu Talismã, hit de Iza, também foi gravado lá.
A loja ainda inspirou o filme Durval Discos, de 2002. O longa, dirigido por Anna Muylaert, foi ganhador de 7 prêmios no Festival de Cinema de Gramado no ano do lançamento.
‘Sempre acreditei no vinil e, agora, está voltando’
A Eric Discos surgiu por pura paixão. O proprietário chegou ao Brasil em 1972, chegou a trabalhar em bancos e ser professor de inglês, mas resolveu abrir a loja com a sua própria coleção de vinis. À época, Eric tinha 27 mil discos que colecionava desde os 9 anos de idade.
O estabelecimento foi atraindo interesse de amantes de música e curiosos. O local ostenta CDs colados no teto, quadros e livros raros de grandes nomes da música, além de vitrolas e bustos de artistas que vão de Raul Seixas a David Bowie.
O interesse por vinis caiu com o surgimento dos CDs. Ele aproveitou o período para aumentar sua coleção com pessoas que doavam discos à época. Hoje, 80% do sustento da loja vem dos vinis. Os outros 15% e 5% vêm de CDs e DVDs, respectivamente, segundo ele.
O dono celebra o interesse de jovens, inclusive os fãs de Taylor Swift, ávidos frequentadores do local nesta semana, pelos itens. “Eu nunca desisti de acreditar no vinil. Eu sempre soube, no meu coração, que iria voltar e, agora, está voltando”, diz.
‘Muitas pessoas que vieram pela Taylor compraram discos antigos’
Ter tantos frequentadores jovens é novidade para Eric, acostumado a clientes fiéis, que, de tempos em tempos, retornam ao local. No dia da visita do Estadão, Eric conta ter recebido um DJ que costuma voltar à loja para procurar por vinis de reggae e hip hop a cada 6 meses. “Mas esses dois rapazes, por exemplo, eu nunca vi”, afirma, apontando para dois jovens deixando a loja.
Fã de Beatles e Rolling Stones, ele diz que grande parte de sua coleção abrange discos dos anos 1950 e 1960 – os valores podem ultrapassar os R$ 1 mil, dependendo da raridade do vinil –, mas também vende discos novos. Com a divulgação da Taylor, muitos foram ao local procurando, esperançosos, pelo vinil do novo álbum da cantora mesmo antes do lançamento.
No site da gravadora da artista, Universal Music, a versão de The Tortured Poets Department em vinil pode ser encomendada por R$ 329,90. A previsão de estoque é apenas no dia 19 de julho. Eric afirma, porém, não ter recebido nenhuma proposta para a venda o novo álbum na loja.
“Pessoas estão vindo aqui [procurando o álbum] a cada minuto”, conta. “Eu gostaria de ter. Talvez eu compre uma quantidade legal, mas eu não tenho no momento.”
Para além do lançamento, a procura por versões físicas de todos os discos da artista já costuma ser muito alta, segundo ele. “Quando tem, sai imediatamente. [...] Se eu comprasse um lote hoje, amanhã já não teria nada”, afirma.
A divulgação serviu para que pessoas de outras parte de São Paulo – e até do Brasil – conhecessem a loja histórica e também se tornassem fregueses de Eric. “Muitas pessoas que vieram por causa desse álbum, compraram [discos do] Michael Jackson e essas coisas. Estou aberto há quase 50 anos, mas muitas pessoas não conheciam a loja”, diz.
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