Cyndi Lauper reconhece ‘demora’ para vir ao Rock in Rio: ‘Não percebi que eu podia’

Em entrevista franca ao ‘Estadão’, cantora exalta Brasil e Madonna, fala do espaço da mulher na música e explica aposentadoria. Ela se apresenta no festival nesta sexta, 20

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Foto do author Sabrina Legramandi
Atualização:
Foto: Angela Weiss/AFP
Entrevista comCyndi LauperCantora

Ela é tão incomum. Coincidência ou não, a expressão estampada na capa de seu álbum de estreia, She’s So Unusual, de 1983, acompanharia Cyndi Lauper por toda a sua trajetória. Foi desse disco que saiu seu maior hit, Girls Just Wanna Have Fun –, e desde então ela é reconhecida por seu “espírito rebelde”.

Aos 71 anos, a cantora se tornou um símbolo da luta pelo direito das mulheres e das pessoas LGBT+. Seu estilo excêntrico, com os cabelos coloridos, inspirou a moda e muitos artistas – ela não se cansa de elogiar a drag queen Chappell Roan, que despontou com Good Luck, Babe! neste ano. Ainda é impossível adivinhar com qual cor de cabelo Cyndi está, mas, um pouco também graças a ela, escolher roxo ou azul para os fios já não é tão incomum.

Em conversa com o Estadão, por telefone, a norte-americana nascida no Brooklyn demonstra ainda manter a sua essência: reflete sobre a pergunta pelo tempo que precisar e recusa respostas ensaiadas. Em certo momento, até interrompe a entrevista para falar sobre sua pug, que latia ao fundo. “Ela pensa que é grande e está no comando”, brinca.

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Cyndi volta ao Brasil após 13 anos. Ela sobe ao palco do Rock in Rio pela primeira vez nesta sexta, 20, na comemoração dos 40 anos do festival. A data, que recebeu o nome de Dia Delas, será dedicada apenas a atrações femininas. A cantora se apresentará no Palco Mundo, o mesmo que recebe Ivete Sangalo, Karol G e Katy Perry.

Apesar de estar escalada para o dia, a artista lamenta que ainda haja a categoria de “mulheres na música”. “Nós não dizemos ‘homens na música’”, argumenta. Justo. A sensação de que só havia espaço para uma mulher gigante na música atingiu sua carreira, marcada por comparações com Madonna desde que as duas lançaram seus respectivos álbuns de estreia no mesmo ano.

À reportagem, Cyndi Lauper se diz fã da cantora, aponta uma “demora” para finalmente cantar no Rock in Rio e tira a dúvida sobre seu show no festival, apontado como o último no País depois que ela anunciou sua turnê de despedida. “[O Rock in Rio] vai ser divertido, mas eu vou com a minha turnê depois disso”, promete - antes de embarcar para o Brasil.

É a sua primeira vez no Rock in Rio. Acha que demorou muito para que você finalmente se apresentasse no festival?

Sim, demorou muito. Mas eu estou feliz por estar fazendo isso. Estou realmente empolgada. Sempre quis fazer isso. Eu apenas nunca... Eu não sei, eu não percebi que eu podia.

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Qual a sua melhor lembrança no Brasil?

Meu Deus. Os últimos shows aí foram incríveis. Eu me apresentei com a [percussionista brasileira] Lan Lanh. Ela foi ótima. E, sabe, eu simplesmente sinto que quando fui à América do Sul e ao Brasil havia alguns lugares realmente adoráveis. Geralmente, só se vai a São Paulo. Mas, mesmo em São Paulo, nós fomos a museus. Foi lindo.

E você pretende voltar depois da sua aposentadoria, talvez apenas para uma visita?

O Rock in Rio não vai ser a última vez que irei para o Brasil. Neste ano estou em turnê. Então, depois, quero levar minha turnê de despedida ao Brasil, Argentina, acho... Mas, sabe, estou animada para fazer isso, porque é realmente lindo. A coisa do Rock in Rio é apenas um dos itens da minha lista de desejos que eu queria fazer.

Cyndi Lauper explica decisão de se aposentar. Foto: Evan Agostini/Invision/AP

Mas por que essa decisão de se aposentar agora?

Bem, eu não estou realmente me aposentando. Estou me aposentando de aviões, trens, automóveis, fazer e desfazer malas. É disso que estou me aposentando. E estou escrevendo...

Você sempre foi esse ‘espírito rebelde’ e você falava dos direitos das mulheres e das pessoas LGBT+ quando ainda não era tão comum. Acha que tivemos um verdadeiro progresso? E há mais espaço para as mulheres na música agora?

Bem, existem muitas mulheres na música e sempre houve, e estou muito feliz em ver uma quantidade maior agora. Mas uma questão é: por que se diz ‘mulheres na música’? Não dizemos ‘homens na música’. Não dizemos: ‘Quantos homens na música você conhece agora?’. Pois é. Nunca fazemos essa pergunta. Precisamos nivelar as coisas e simplesmente dizer que há muitos jovens artistas e que eles estão cantando e escrevendo sobre o tempo em que vivem - porque essa é a nossa função. Escrever e pensar sobre o tempo em que vivemos, inspirar as pessoas e cantar. Acho que os cantores são ‘curandeiros’. O som de uma voz humana é muito reconfortante para as pessoas. E curativo.

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As pessoas sempre a colocaram como rival da Madonna. E, hoje em dia, a história tem se repetido com outras cantoras jovens. Por que as pessoas continuam fazendo isso?

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Eu não sei. Eu acho que isso é besteira. Sempre fui fã da Madonna. Quando ela lançou Like a Prayer, a garota católica da escola se revelou em mim. É só a ‘velha guarda’ que faz isso. Eles têm que colocar mulheres contra mulheres. A verdade é que não fazem isso com homens, fazem? Ninguém escreve um artigo dizendo: ‘Oh, Shawn Mendes e Ed Sheeran... Qual deles eu gosto mais?’. Isso é comparar alhos com bugalhos, não é? Ninguém é igual. Você tem que soltar os freios da sua mente, ouvir o que você gosta e entender que a música é curativa e alegre. E ela eleva as pessoas, seja você homem ou mulher.

E ‘garotas só querem se divertir’...

E elas ainda querem. Você não? Sabe, começamos uma fundação chamada Girls Just Wanna Have Fundamental Rights (Meninas Só Querem Ter Direitos Fundamentais, em português) para arrecadar dinheiro para clínicas que oferecem abortos seguros e legais, além de cuidados pré-natais, pós-natais e exames de câncer. Isso é muito, muito importante. No ano passado, arrecadamos US$ 155 mil.

Cyndi Lauper promete trazer turnê de despedida para o Brasil após Rock in Rio. Foto: Angela Weiss/AFP

Agora falando da música ‘Girls Just Wanna Have Fun’, ela se tornou viral no TikTok e a Geração Z continua cantando. Acha que o significado da canção mudou hoje?

Não mudou. Ela sempre significou que todas nós deveríamos ter a oportunidade de ter uma vida alegre. Todas as meninas, de todas as cores, de todas as crenças. Todas nós. Somos metade do planeta. Se todas nós nos unirmos – porque a irmandade é uma coisa poderosa –, Deus sabe o que faríamos... Não, espera... Deusa sabe o que faríamos. Nós poderíamos fazer grandes contribuições para o mundo. Nós fazemos, na verdade. Mas juntas... o que não poderíamos fazer juntas?!

Espero que você tenha uma ótima experiência com o Rock in Rio e o Brasil...

Mal posso esperar. Vai ser divertido. Mas eu vou voltar com a minha turnê mundial depois disso. Ainda não tenho datas para anunciar, mas terei. Eu prometo, porque sei que tenho muitos fãs no Brasil que são fantásticos. Um deles, no meu último aniversário, conseguiu reunir pessoas que eu não via há muito, muito tempo e as filmou dizendo ‘feliz aniversário’ para mim. E foi tão incrível. Acho que o nome dele era Rodrigo. Quero agradecer aos meus fãs no Brasil porque eu os amo.

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