“Meu querido, em 20 dias eu completo 80 anos”, diz o capricorniano Edivaldo Souza, um nome dado pelos pais que não diz muito. O quase oitentão é conhecido há 45 anos pelo nome artístico de Edy Star. “Se amigas minhas não sabem quem é Elis Regina, como eu posso esperar que as pessoas se lembrem de quem eu sou?”, segue o artista nascido em Juazeiro, na Bahia.
É fato que Edy Star é uma figura que desapareceu do faro popular há algum tempo. Foi parceiro de Raul Seixas no lançamento de Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta Sessão das 10, um álbum de 1971 criado por Raulzito como resposta a Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, com a participação também de Sérgio Sampaio e Míriam Batucada. No ano seguinte, surgiu com o álbum Sweet Edy, a estreia na qual ele cantava canções de Gilberto Gil, Erasmo e o Roberto Carlos, Caetano Veloso, e Moraes Moreira e Galvão.
Sweet Edy ganhou uma reedição em 2012, pelo selo Joia Moderna, algo que fez Edy chorar ao ter um CD seu em mãos, logo após decidir voltar de vez a São Paulo depois de 18 anos morando na Espanha, como diretor artístico de um cabaré, em Madri.
+++ A estrela de Edy Star volta a brilhar com o relançamento de Sweet Edy
Edy nunca foi mainstream, caminhou na margem, sempre, embora sua importância para a música brasileira seja notável. Ajudou a introduzir o glam no rock nacional e foi um dos primeiros artistas brasileiros a revelarem a homossexualidade.
Há alguns anos de volta a São Paulo, Edy reviu a ideia de fazer um segundo disco em algumas ocasiões. “Às vezes, queria fazer um disco, noutras não”, explica ele, em uma das 13 ligações feita pelo Estado para o seu celular – as chamadas eram curiosamente interrompidas, seguidamente, após alguns minutos de conexão. Há 20 dias morador de um apartamento no encontro das Avenidas Duque de Caxias e São João, Edy ainda não tem telefone fixo e internet em casa. E caçoa disso: “Eles querem que eu comprove residência, mas como, se eu acabei de me mudar?”, diz. A cada nova ligação, ele ri mais da situação. “Tem que fazer galhofa”, diz. Já no fim da entrevista, Edy já retomava a fala como se a interrupção não existisse. “E não conhecia as pessoas, não me sentia bem. Até que surgiu essa oportunidade de gravar com o Zeca Baleiro”, conta.
Baleiro, na verdade, respondeu a um chamado do próprio Edy no Facebook, no qual anunciava que queria gravar um disco e buscava parcerias. Ambos já haviam feito alguns shows em conjunto desde que Edy passou a voltar ao Brasil para apresentações na Virada Cultural, desde 2009. Baleiro assina a produção e lança, pela sua gravadora, a Saravá Discos, Cabaré Star, o segundo disco de carreira de Edy, lançado 44 anos depois da sua estreia. “Embora o Zeca seja de uma geração posterior à minha, nós nos entendemos muito bem musicalmente”, relembra Edy.
Figura carismática, o artista reuniu um time invejável de participações para esse trabalho. Ney Matogrosso canta na divertida Peba Na Pimenta; Angela Maria e Zeca Baleiro participam dos vocais do tango sofridíssimo Dezessete Vezes, de autoria de Baleiro; Filipe Catto contrapõe, com agudos cristalinos, à rouquidão charmosa de Edy em Não Tenho Medo; Emílio Santiago, que morreu em 2013, havia emprestado sua voz para Ave Maria No Morro; e, por fim, há Caetano Veloso.
Caê surge direta ou indiretamente em três faixas. Em Se o Cantor Calar (de Zé Rodrix e Maria Lúcia Viana), ele divide os vocais com Edy. Depois, em Merda, uma música do próprio filho da Dona Canô, ele recita alguns versos. Por fim, É Edy quem desafia Caetano para um embate amigável.
Se, para um, A Bossa Nova É Foda, como cantado no disco Abraçaço, de 2013, Edy retruca com Rock’N’Roll É Fodaço, um rock impertinente de um artista que levou 44 anos para voltar a gravar, mas não perdeu a diversão jovial a cantar seu cabaré tropical, em pleno 2017. “Se não der risada, o que me resta?”, ele diz. E ri. E a ligação cai de novo.
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