Morre Chuck Berry, lenda do rock and roll, aos 90 anos

Guitarrista havia anunciado um novo disco ainda para este ano

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Chuck Berry morreu. Parte do rock and roll, a essência de um gênero que já se transformou tanto desde que o sujeito de 1,87 m, nascido em St. Louis, no estado norte-americano do Missouri, empunhou a guitarra pela primeira vez, se vai com ele. São duas despedidas de uma só vez – o que torna o adeus ainda mais difícil. 

Chuck Berry Foto: RENATO LUIZ FERREIRA/AE

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A causa da morte ainda é desconhecida. Berry tinha 90 anos e sua saúde não era das melhores, revelara seu filho, Charles Jr., há alguns meses, à revista Rolling Stone dos Estados Unidos. “O que posso dizer? Ele é um homem de 90 anos de idade”, disse o filho. “E, como grande parte dos homens com essa idade, ele tem dias bons e dias ruins. Em um passado não tão distante, ele sofreu com uma pneumonia. Está se recuperando, sim, mas o processo hoje em dia é algo muito mais lento.” 

A notícia da morte de Berry surgiu no fim da tarde de ontem, com um comunicado publicado pela página de Facebook da polícia do município de St. Charles, onde Berry e a mulher, Themetta Berry, moravam, também no Estado de Missouri. Ao chegarem na casa do guitarrista, encontraram-no já sem vida. Os brigadistas tentaram revivê-lo, sem sucesso. Berry foi declarado morto às 13h26. “A família pede por privacidade neste momento de sofrimento”, diz o comunicado, por fim. 

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Berry, ao completar 90 anos, em outubro do ano passado, encheu o coração dos fãs de alegria. Enquanto o mundo celebrava o aniversário do músico, ele anunciava um novo disco. Não seria um álbum qualquer. Chuck, como o trabalho seria chamado, seria o primeiro com músicas inéditas em 38 anos – desde Rock It, do longínquo ano de 1979. Ao revelar seus planos – Chuck sairia em algum momento de 2017 –, Berry anunciou que o trabalho seria dedicado à mulher, a quem ele carinhosamente chamava de Toddy. “Minha querida, estou ficando velho. Trabalhei nesse disco por muito tempo. Agora, poderei descansar”, disse a lenda. 

Talvez na época a frase não tivesse tanto peso, mas o recado era claro. Berry celebrava a vida nonagenária e os mais de 60 anos de carreira com a guitarra pendurada nos ombros em um tom de despedida. O disco tinha ainda a participação dos filhos dele, Charles Berry Jr. e Ingrid Berry, na guitarra e gaita, respectivamente. Ainda não foi informado se o álbum chegará às lojas ou se será engavetado. 

Tratava-se de algo esperadíssimo pelo mundo do rock and roll, contudo. Há quase 40 anos, não se ouvia uma música inédita de Berry. Como suas mãos então com 90 anos de idade manuseariam a sua melhor amiga, a guitarra, na criação de novos riffs? Sobre o que Berry cantaria no fim da vida? 

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Esperava-se tudo de Berry, embora uma geração inteira tenha nascido e se criado no rock sem a presença de um novo disco do guitarrista nas lojas. Ele representava o que de mais selvagem e rebelde o rock poderia ter durante a década de 1950, quando surgiu, ousado e arisco, a dançar com a guitarra nas mãos e cantar sobre garotas, sexo, carros velozes e o que mais pudesse interessar aos jovens da época. 

Fundiu o country com o blues e criou um estilo próprio que pode ser ouvido de forma clara em canções como Johnny G. Goode. Berry, negro vindo de um Estado sulista, enfrentou o racismo com o queixo erguido. Era arisco, por conta disso. Em suas turnês, viajava sozinho, à parte do restante da banda contratada para acompanhá-lo. Tornou-se ainda mais amargo depois de ficar preso por dois anos por um crime que ele disse não ter cometido – ele foi acusado de transportar uma mulher de um estado para outro para prostituição. 

Filho de carpinteiro, Berry trabalhou em uma montadora de automóveis e se especializou como cabeleireiro até seguir o caminho da música. Aprendeu a tocar blues ainda adolescente, mas foi só ao conhecer a lenda do gênero Muddy Waters, quem lhe apresentou Leonard Chess, presidente da gravadora Chess Records. A história de Berry começa ali – segundo ele conta na autobiografia publicada pela primeira vez em 1987 –, quando ele transforma uma canção country, Ida Red, com sua forma única de tocar guitarra, em na roqueira Maybellene. Assim assinou seu primeiro contrato. 

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Maybellene chegou ao posto de quinta música mais tocada nos Estados Unidos e definiu um estilo para Berry. A partir dali, ele o desenvolveu. Vieram canções como Roll Over Beethoven, You Never Can Tell, No Particular Place to Go, Sweet Little Sixteen. Nelas, a impressão digital de Berry está por todos os lados, num ritmo sempre ansioso pela próxima batida e uma guitarra estalada. 

Aliando isso à forma de se portar no palco, com o famoso passo do pato, no qual caminha com os joelhos curvados, tornou-se um herói para os roqueiros que vieram depois dele, de Keith Richards a Eric Clapton. Em 1986, Berry ingressou no Hall da Fama do Rock and Roll. Na cerimônia, justificou-se a presença do músico ali dessa forma: “Enquanto nenhum indivíduo pode ser considerado o inventor do rock and roll, Chuck Berry é aquele que chega mais próximo de ser essa figura que uniu todas as peças que criaram o rock como conhecemos”. 

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