Marcelo Fromer ligava o rádio às cinco da tarde todos os dias para descobrir se Sonífera Ilha estava entre as músicas mais pedidas nas emissoras. Saía escutando uma a uma e, se sentisse falta dela em algum lugar, ligava para a gravadora para saber o que estava acontecendo. O Titãs havia acabado de lançar a música e Fromer, guitarrista da banda, estava entusiasmado para vê-la chegar ao público.
Há 20 anos, no dia 13 de junho de 2001, Marcelo Fromer morria após ser atropelado por uma moto em São Paulo, mas a presença entusiasmada do músico permanece viva entre as pessoas que conviveram com ele. A cena do guitarrista procurando a música nas rádios aconteceu no ano de 1984 e é lembrada pelo amigo e companheiro de banda, Tony Bellotto, como se fosse ontem. “Ele tinha uma energia catalisadora que animava todos nós”, conta Bellotto.
Guitarrista e compositor, Marcelo Fromer é o responsável por músicas como Televisão e Massacre, do álbum Televisão (1985), AA UU e Homem Primata, do Cabeça Dinossauro (1986), mas a principal influência do músico para o Titãs é a vontade insaciável de criar e continuar com o projeto. Segundo Bellotto, depois da morte do guitarrista, não foram raras as vezes em que a banda pensava, diante de uma situação em que não sabia para onde ir, o que Fromer faria.
Essa influência não está restrita entre os músicos. Fromer deixou três filhos – duas mulheres e um homem – e, segundo a filha Alice Fromer, a pergunta “o que o meu pai faria nesta situação?” é algo que ela carregou desde que o músico morreu. Ela tinha apenas 7 anos em 2001, mas o tem na memória como alguém que estava sempre presente para ouvir o outro e ajudar. “O jeito que ele estava presente para ouvir o outro é algo que eu levo muito para a minha vida”, disse ao Estadão.
Aos 27 anos de idade, Alice se tornou pedagoga e trabalha com crianças com idade média de 7 anos – a idade que ela possuía quando o pai morreu. No contato com as crianças, ela costuma reviver brincadeiras que fazia com o pai. Entre as brincadeiras mais vívidas na memória de Alice, estão as tardes em que Fromer a levava à horta de casa para fazê-la adivinhar, de olhos fechados, o cheiro dos temperos.
Segundo a filha do músico, a presença dele na infância através destas brincadeiras acabaram por se sobrepor à ausência da morte. “É estranho quando eu digo que ‘não tenho pai’ porque sinto que ele está presente de todas muitas formas na minha vida. Está presente de algum modo”, conta.
Fã dos tropicalistas, Jorge Mautner, Jards Macalé e Luiz Melodia, do new wave e do punk, Fromer uniu estas influências com os outros oito integrantes do Titãs para formar uma banda que tivesse liberdade de criar e se divertir. “O sonho de todo adolescente é ter uma banda de rock famosa, e nós conseguimos essa realização com o Titãs”, lembra Bellotto. Quando o guitarrista morreu precocemente aos 39 anos, a banda sentiu o baque ao perceber que a vida também era áspera.
O músico Sérgio Britto, companheiro de Marcelo Fromer no Titãs, conta que foi a primeira vez que os integrantes haviam perdido alguém próximo. “Pela primeira vez havíamos perdido alguém tão próximo e da nossa idade. Foi muito difícil superar aquilo”, contou.
Fromer era visto como “o melhor amigo de cada um dos Titãs” e, contou Sérgio Britto, talvez a banda não tivesse durado tanto se não fosse a capacidade do guitarrista em conciliar conflitos. Marcelo não hesitava em sair de casa durante a madrugada para ajudar um amigo que estivesse mal, se fosse preciso.
Essa presença perdura e, até hoje, duas décadas depois da sua morte, não parece que ele se foi. “Caramba, já faz 20 anos?”, se surpreendeu Tony Bellotto ao ouvir a motivação para esta reportagem.
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