Mundo pop: o que valeu e o que não valeu em 2000

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Por Agencia Estado
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Numa medição estritamente estatística, lógica, matemática, o ano 2000 não deixa grande saldo para o mundo pop. O esgotamento de fórmulas e as repetições marcaram a temporada. Da série "por que o ano 2000 não vai deixar saudade", segue uma pequena lista de argumentos: 1. No Brasil, o pop rock foi marcado pela volta dos que não foram: Capital Inicial, Kiko Zambianchi, Ira! e outros fantasmas; 2. No mundo, viveu-se a explosão das teen-bands e dos rappers farsescos, como Five, ´N Sync, Christina Aguilera, Westqualquer coisa, Eminem e Kid Rock; deles, a cantora Britney Spears, entre virginal e apimentada, parece sobressair-se com mais destaque; 3. Em junho, um dos maiores festivais de rock da Europa termina em tragédia, o Roskilde Festival, na Dinamarca, com nove mortes (relatório concluído na semana passada mostra que uma das causas foi a parca qualidade do som, que causou os primeiros protestos e o conseqüente tumulto); 4. Em julho, o maior revés já sofrido pela onipotente indústria fonográfica (o sistema Napster de rastreio e troca de músicas pela Internet) é tirado da rede por decisão judicial. 5. O estádio de Wembley, cenário de partidas memoráveis de futebol e de shows históricos, vive seu derradeiro jogo em outubro e sai de cena para sempre; oportunistas como sempre, os irmãos Gallagher, do Oasis, registram lá uma das últimas boas apresentações de rock no álbum Familiar to Millions, recém-lançado; 6. Os Beatles ainda não contam tudo. Sai a megabiografia Beatles Anthology, escrita presumivelmente para contar "a história dos quatro fantásticos em suas próprias palavras", e que não conta nada além do já sabido; no fim do ano, porém, no relançamento de seu disco "All Things Must Pass", George Harrison vai um pouco adiante e queixa-se de ter sido pouco valorizado no auge do quarteto. 7. No final de outubro, o Napster trai seu princípio libertário e alia-se à empresa alemã Berteslmann, gestora da gravadora BMG que, em seguida, associa-se com outra gigante, EMI. O que era de graça passará a ser cobrado. 8. Morre nos Estados Unidos o veterano desenhista de quadrinhos Carl Barks, de 99 anos, que deu vida aos personagens Pato Donald e Tio Patinhas, de Disney. 9. E o ano culmina com o anticlimático casamento de Madonna e Guy Ritchie: não queremos vocês por perto, mas também não os queremos longe, dizem os astros-pombinhos à "asquerosa" mídia que os persegue. A ex-material girl agora é uma zelosa mãe de família. Agora, numa medição nem um pouco criteriosa, baseada em princípios meramente subjetivos, conheça outra pequena série de motivos que fizeram o último ano do século valer a pena: 1. No Brasil, a febre revisitadora trouxe de volta à pauta do dia a maravilhosa banda dos anos 80 Fellini, que, redescoberta, tocou no Abril Pro-Rock e teve seu disco Amor Louco relançado; 2. O mundo teen acordou de sua histórica letargia e ignorou solenemente o novo disco das insuportáveis Spice Girls; no Brasil, os pagodeiros de laboratório atingem a saturação e vêem suas vendas de discos caírem vertiginosamente; 3. O Instituto Moreira Salles relança, em abril, o livro Paranóia, de Roberto Piva, editado originalmente em 1963 e um elo entre a poesia brasileira e a beat generation, um livro que recupera a primeira ambição de descrever a "paisagem de morfina" de São Paulo e que conecta a linguagem da metrópole com o som do jazz de Coltrane e Miles Davis; 4. O Free Jazz Festival enfim trouxe ao Brasil o patrimônio do rock alternativo, a banda nova-iorquina Sonic Youth, que fez shows memoráveis no Rio e em São Paulo; 5. O guitarrista Carlos Santana ganha nove prêmios Grammy com o bom álbum Supernatural e - 30 anos depois de sua célebre apresentação em Woodstock - torna-se o primeiro artista latino a alcançar destaque ímpar dentro do fechado mercado da música norte-americana; 6. O filme X-Men, baseado no mais vendido gibi do planeta, mostra como se pode fazer com talento e imaginação uma boa adaptação dos comics, algo que há muito não se conseguia; 7. As peças A Vida É Cheia de Som e Fúria, de Felipe Hirsh (baseada no livro Alta Ansiedade, de Nick Hornby) e A Vida não Vale um Chevrolet, de Mário Bortolotto, saldam uma velha dívida do teatro para com a cultura pop e os signos da contemporaneidade; 8. O paulistano Marco Antonio da Silva, o Marky Mark, de 27 anos, que começou animando festas nas danceterias Sound Factory e Toco, na zona leste, torna-se o mais badalado DJ brasileiro na cena dos clubes europeus, e toca até na República Checa; 9. São lançadas três caixas de discos que valem um inventário do rock no século inteiro. A primeira é Box of Pearls - The Janis Joplin Collection, que reúne todos os CDs da cantora texana Janis Joplin, mas o CD-bônus Rare Pearls. A segunda é The Jimi Hendrix Experience, contendo quatro CDs de Jimi Hendrix (1942-1970), o maior dos guitarristas, morto há 30 anos. E a terceira foi Bowie at the Beeb, lançada na Inglaterra pela Virgin Records e que reúne gravações do camaleão Bowie realizadas entre maio de 1968 e maio de 1972. 10. O cartunista paulistano Lourenço Mutarelli lança o álbum O Rei do Ponto, segunda parte de sua trilogia sobre o detetive Diomedes, e põe os quadrinhos brasileiros num nível jamais alcançado em relação à produção internacional.

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