Offspring: Noodles diz que é fã de Billie Eilish e reflete sobre cristalização do punk no mainstream

Prestes a se apresentar no Lollapalooza com sua banda, o guitarrista conversa com o Estadão sobre os 40 anos de carreira, os 30 anos do álbum ‘Smash’ e música pop

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Foto do author Damy Coelho

O Offspring tem bons motivos para comemorar. Fruto do cenário punk californiano, a banda celebra, neste 2024, 40 anos de estrada e 30 anos do álbum Smash, que os consagrou para o mundo. De lá para cá, foram 10 álbuns lançados e mais de 40 milhões vendidos. Ocupar uma posição de destaque neste Lollapalooza 2024 Brasil – eles tocam no dia 22 de março – reforça a importância da banda, comprovando que eles foram muito além de um hit de verão. Veja aqui todas as informações sobre o festival, que será realizado entre sexta, 22, e domingo, 24.

Offspring se prepara para show no Lollapalooza, em São Paulo. Banda tem hits como 'Come Out and Play (Keep 'Em Separated)', 'Self Esteem', 'Why Don't You Get a Job?', Pretty Fly (for a White Guy)' e 'The Kids Aren't Alright'. Foto: Daveed Benito/Offspring/Divulgação

Em entrevista ao Estadão, o guitarrista Kevin “Noodles” Wasserman reflete sobre a consagração do punk no mainstream e o consequente sucesso da banda, inesperado até para os próprios integrantes: o músico continuou trabalhando como zelador em uma escola enquanto o Offspring já estava onipresente nas rádios e na MTV. Ele não acreditava que pudesse viver de música – ao menos não fazendo aquele tipo de música.

Nunca pensamos que o punk nos levaria a tocar ao redor do mundo por 30 anos, sabe? Não imaginava que ainda estaríamos por aí.

Noodles, guitarrista do Offspring

Mas estão. Após o primeiro hit, a banda ganhou novos fãs e construiu uma carreira longeva. “O Smash foi muito importante para nós”, diz Noodles. “Entre ele e o Dookie, do Green Day [também lançado em 1994], houve uma mudança no cenário do rock no mainstream. É muito bom fazer parte disso.”

Offspring: Noodles (no canto, à direita) não vê problema no punk radiofônico Foto: Divulgação Offspring / Daveed Benito

O começo

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O Offspring teve início em 1984, e hoje é formado por Dexter Holland (vocal e guitarra), Noodles (guitarra e vocal), Todd Morse (baixo e vocal) e Brandon Pretzborn (bateria). Lançaram o primeiro disco em 1989, The Offspring, mas só conheceriam o sucesso em 1994, quando lançam o Smash pela gravadora Epitaph Records.

O disco foi um hit instantâneo, e tornou-se o mais vendido da história por uma gravadora independente. Logo emplacaram três singles na parada da Billboard – Come Out and Play (Keep ‘Em Separated), Self Esteem e Gotta Get Away – uma prova de que o punk dos anos 1990 estava se tornando popular em um cenário antes recheado de bandas de hard rock.

Para o guitarrista, ver bandas como o Offspring, que foram diretamente influenciadas pelo punk, alcançando tantas pessoas foi positivo. Pouco antes deles, o Nirvana abriria os caminhos.

Quando o Nirvana surgiu com o Nevermind [1991], eu pensei: ‘finalmente!’ Uma banda que compartilha a mesma visão de mundo que a nossa está atingindo o mainstream, obtendo reconhecimento. Para mim, era o melhor tipo de música, e todo mundo precisava conhecer. Era tão difícil quebrar esse limite, e eles finalmente conseguiram.

Noodles, guitarrista do Offspring

Três anos depois, seriam eles, com o Smash, e o Green Day, com o Dookie, que ajudariam a emplacar o punk nas paradas de rádio e da TV. As duas bandas influenciaram diretamente nomes do pop punk dos anos 1990 e 2000, junto ao Blink 182, que também é headliner desta edição do Lollapalooza.

Punk

Representado por nomes como Ramones e Sex Pistols e, pouco antes, MC5 e o The Stooges de Iggy Pop, o punk surge nos anos 1970 como um movimento contracultural e gênero musical de oposição ao sistema, sinônimo de uma juventude que se rebelava contra o status quo. As roupas pretas e rasgadas, as correntes, as músicas de três acordes com letras que denunciavam a hipocrisia social e política; tudo, da música à moda, era uma manifestação de identidade. A imprensa e os pais, assustados com tamanha rebeldia, taxaram aqueles jovens como ”vagabundos” ou, no máximo, adeptos de uma “moda passageira”.

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A despeito dos julgamentos, o punk conquistou outros jovens ao redor do planeta, o que abriu ainda mais os olhos do mercado. Aos poucos, estava nos desfiles de moda, no cinema, era presença constante nas rádios e TV. Nos anos 1990, o punk era cool.

E isso enfureceu parte dos fãs. Porém, Noodles vê o sucesso da banda como reflexo do que a juventude da época queria ouvir. “Quando fizemos sucesso, já tínhamos 10 anos de estrada... Acho que foi uma questão do momento certo para a coisa acontecer”.

Para o músico, uma vantagem dessa onda punk noventista foi possibilitar que outras bandas influentes despertassem o interesse de um público mais jovem, como o Bad Religion e Pennywise. Apesar disso, ele lamenta que os Ramones não tiveram o merecido reconhecimento enquanto estavam na ativa.

Eu sei que os Ramones foram relevantes aí no Brasil antes de chegarem a ser sucesso comercial aqui nos Estados Unidos. Hoje, todo adolescente daqui tem uma camisa da banda [risos]

Ramones em entrevista coletiva no Maksoud Plaza, em São Paulo, em 1987. Foto: Juvenal Pereira / Estadão

Legitimamente punk

O punk sempre travou uma batalha interna sobre qual seria o “som legítimo” que o classificaria. Nessa disputa, as bandas mais radiofônicas dos anos 1990 perdiam prestígio entre os fãs mais conservadores, mas ganhavam em popularidade.

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Nas letras, o discurso de nomes como o Offspring ainda era combativo porque falava sobre uma juventude que não conseguia se ver representada entre os intelectuais ou os populares. Que gostava de andar de skate para curar o tédio de uma vida sem lazer, que ironizava o american way of life e não via perspectiva no futuro, como reflete a letra de The Kids Aren’t Alright, do disco Americana (1998):

Quando éramos jovens, o futuro era tão promissor/ A antiga vizinhança era tão viva/ E toda criança naquela rua inteira seria bem-sucedida / Agora a vizinhança está desmoronando / As crianças cresceram, mas suas vidas estão exaustivas/ Como pode uma pequena rua engolir tantas pessoas?”

Dessa forma, o Offspring se consagrou no cenário rock ‘n roll, assim como outras bandas de sua geração.

Hoje o punk pode não ser forte nas rádios – apesar de sobreviver no streaming – mas se reflete em atitudes que sempre estarão em alta entre os jovens, como a rebeldia e a identificação com algo que os represente. Está no revival pop punk de Olivia Rodrigo, na forma como os jovens se vestem ou até nos selos de “parental advisory: explicit content” (aviso aos pais: conteúdo explícito), usado para classificar álbuns com palavrões e outras polêmicas que poderiam ofender a moral vigente, onipresentes em capas do Offspring ou Green Day.

O selo, que outrora simbolizava o que os pais não deveriam deixar os filhos ouvirem, hoje é sinônimo daquilo que é mais descolado: em um ato de rebeldia contra uma censura musical, virou estampa de camiseta. Hoje, figura até em álbuns da Taylor Swift. Os fãs, adoram.

”Então o ‘Folklore’ é o primeiro álbum da Taylor Swift com o rótulo ‘Parental Advisory Explicit Content’ na capa. Me sinto f****.”

Sobre os novos sons que a juventude consome, Noodles elege sua favorita: “Adoro a Billie Eilish. Tem muitos artistas fazendo boa música pop hoje em dia”.

Lollapalooza

Atualmente, o Offspring trabalha com o álbum Let The Bad Times Roll, lançado em 2021, mas o público deve cantar junto os hits que consagraram o grupo durante as últimas décadas, inclusive do álbum que celebra seus 30 anos. Para Noodles, isso não é, nem de longe, um problema. Ele não se sente um nostálgico, mas gosta de ver pais se divertindo com seus filhos nos shows cantando antigos hits, mostrando que o som deles permanece forte entre gerações distintas.

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“Toda vez que tocamos o Smash nos shows, as músicas me parecem boas e ainda atuais, talvez por isso eu as sinta ainda muito próximas de mim. Mas, olhando em retrospecto, quando o álbum foi lançado e como nossas vidas mudaram depois disso… é meio maluco mesmo tudo o que aconteceu.”

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