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Osesp lança temporada 2022 e prevê retorno total de público e agenda

Programação reúne ciclos dedicados a compositores como Villa-Lobos, Strauss e Sibelius, além de estreias de série de obras

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Foto do author João Luiz Sampaio

Mais de cem apresentações; 58 artistas convidados - 70% deles estrangeiros; expectativa de uma Sala São Paulo com 100% de ocupação; a volta da venda de assinaturas. A Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) anuncia hoje sua temporada 2022, na esperança de que, até lá, tudo volte a ser como antes - ou, pelo menos, mais próximo do “velho” do que do “novo” normal.

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“Precisamos manter nosso trabalho, mesmo sabendo que algumas coisas podem mudar”, diz Marcelo Lopes, diretor executivo da Fundação Osesp. “Com o passaporte da vacina, esperamos ter mais uma vez a casa cheia. Vamos vender assinaturas agora e os ingressos avulsos, apenas mais para frente. Assim, ficamos com cerca de 35% da lotação como manobra para voltar a fazer o distanciamento social na plateia caso a pandemia assim exija.”

Batizada de Vasto Mundo, a programação gira em torno da Semana de Arte Moderna, realizada em 1922 e que completa um século no próximo ano. Nela, um grupo de artistas de diferentes áreas - música, artes plásticas, literatura - apresentou obras que sinalizavam, em conjunto, a busca de um novo espírito que rompesse com a arte conservadora do século 19.

Osesp. Maestro Thierry Fischer fará 12 semanas de concertos. Foto: Isadora Vitti

Na temporada da Osesp, esse mote aparece com um olhar, por um lado, histórico, com a interpretação de obras de compositores ligados à ideia da arte nacional então proposta, como Heitor Villa-Lobos, Camargo Guarnieri e Francisco Mignone, símbolos do nacionalismo musical brasileiro. De outro lado, a programação se abre para o repertório de hoje.

“Os modernistas, segundo acima de tudo Mário de Andrade, entenderam nossa cultura como um campo aberto, ao mesmo tempo voltada para si e em diálogo com o mundo. Dessa perspectiva, pensando num arco de tempo de meio século expandido - de 1894 (ano de estreia do Prélude à l’après-midi d’un faune, de Debussy, tido como marco inaugural da modernidade) até 1954 (fundação da Osesp) -, reunimos 100+22 obras, entre sinfônicas, corais e de câmara, brasileiras e estrangeiras”, explica Arthur Nestrovski, diretor artístico da Fundação Osesp, responsável pela formatação da programação.

Assim, serão realizadas estreias latino-americanas de cinco compositores de fora do País, como Jörg Widmann, Roberto Sierra, Jimmi López, Thomas Adès e Jessie Montgomery. Na programação sinfônica, há apenas um brasileiro vivo: o compositor Marcos Balter. Mas autores homenageados, como Arrigo Barnabé e Rodolfo Coelho de Souza (que completam 70 anos em 2022), terão obras apresentadas pelo Quarteto Osesp e pelo Coro da Osesp, que também estreia obra de Valéria Bonafé.

Se a temporada da Osesp teve um tema em 2021, foi a necessidade de adaptação. Em 2020, a partir de setembro, a orquestra voltou a se apresentar e imaginou para este ano uma temporada ambiciosa. Restrições de viagem e a necessidade de quarentena, no entanto, afastaram alguns artistas internacionais do Brasil. E os concertos, e repertórios, precisaram ser ajustados mês a mês e, em alguns casos, semana a semana.

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O desafio não foi exclusivo da Osesp - e outras orquestras e teatros brasileiros passaram por situação semelhante. Ao contrário, por exemplo, dos grupos norte-americanos que, em sua maioria, resolveram cancelar todas as atividades e retornar apenas quando a vacinação estivesse avançada, o que começa a acontecer agora: o Metropolitan Opera House de Nova York e a Orquestra da Filadélfia, por exemplo, retomaram apenas na semana passada suas temporadas, depois de 18 meses sem concertos.

A manutenção das atividades fez com que a Osesp ganhasse experiência com seus protocolos sanitários, agora acompanhados da exigência do passaporte da vacina (apenas crianças com menos de 12 anos e pessoas com orientação médica para não se vacinar por problemas de saúde, desde que a comprovem, não precisam apresentar o documento). Condições, acredita a orquestra, suficientes para que as atividades voltem ao patamar anterior ao da paralisação por conta do coronavírus - está prevista, por exemplo, uma viagem aos Estados Unidos, para concerto no Carnegie Hall.

Para tanto, a orquestra aposta alto no número de convidados e concertos. Maneira de marcar o retorno em grande estilo. “Sim e não”, diz o diretor artístico Arthur Nestrovski. “Sim, porque na prática será um esperado retorno a uma condição pelo menos semelhante ao que se tinha antes das restrições impostas pela pandemia. Não, porque todas as temporadas são pensadas em grande estilo. Se não houver imprevistos - e cabe lembrar que a pandemia não acabou -, 2022 será um ano tão bom, se não melhor, do que 2019.”

A programação oficial começa nos dias 10, 11 e 12 de março, quando o diretor musical Thierry Fischer rege obras de Villa-Lobos e Jean Sibelius. Os dois compositores terão destaque na temporada. O brasileiro será tema de Viva Villa!, com diversas obras espalhadas pela agenda. E o finlandês Sibelius foi a escolha do maestro para 2022: desde sua chegada ao grupo, no final de 2019, escolhe um compositor por ano, do qual rege série de peças. Além dos dois autores, Fischer vai também reger peças de Richard Strauss, escolhidas, segundo Nestrovski, “tendo em vista o desenvolvimento da orquestra”.

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Ainda em março, nos dias 24, 25 e 26, Alexander Shelle rege e Javier Perianes é o solista em programa com a estreia latino-americana de Coincident Dances, de Jessie Montgomery, e do Concerto para piano, de Jimmy López. Em maio e junho, respectivamente, outros grandes pianistas da atualidade: Kirill Gerstein, que toca o Concerto para Piano de Thomas Adès; e Alexander Melnikov, com o Concerto n.º 2 de Prokofiev. Também em junho, o compositor, oboísta e maestro Heinz Holliger e a soprano Juliane Banse fazem recital com o Quarteto Osesp e programa com a Osesp.

No final de junho, começo de julho, o pianista canadense Jan Lisiecki faz recital solo, dedicado a Chopin, e apresentação com a orquestra, tocando o Concerto n.º 1 do compositor. E, no final de julho, Giancarlo Guerrero rege a Missa Dilígite de Camargo Guarnieri, e a Cantata Criolla, de Antonio Estévez.

Em agosto, chega a São Paulo o regente e clarinetista Jörg Widmann, compositor visitante da programação, ao lado de Holliger, Jimmi López e Arrigo Barnabé, para recitais com o Quarteto Osesp e concertos com a orquestra. Setembro tem como destaque o pianista Cédric Tiberghien, tocando Ravel; em novembro, Thierry Fischer se une ao pianista Andreas Haefliger, que toca o Concerto para Piano - Gran Toccata, de Dieter Amman. O encerramento do ano será, em dezembro, com a Nona Sinfonia de Beethoven, antecedida pela estreia da peça encomendada ao brasileiro Marcos Balter.

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Além das apresentações sinfônicas, a temporada organiza outras séries, dedicadas à música coral e de câmara. Será para o Quarteto da Osesp, por exemplo, que Arrigo Barnabé vai escrever um Quinteto com Piano, celebrando seus 70 anos. Valéria Bonafé, por sua vez, vai escrever peça para o Coro da Osesp. E há ainda outra encomenda de obra, ao violinista Luiz Amato, que vai integrar uma série dedicada especialmente ao violino, o instrumento em foco, uma das novidades da programação de 2022: dela, vão participar artistas como Luiz Fílip, Emmanuele Baldini (spalla da Osesp), Priscia Rato, Baiba Skride e 12 violinistas da própria Osesp, em repertório diversificado, que inclui ainda as sonatas para violino solo de Isaÿe, “obra-prima modernista”, afirma Nestrovski.

“A dimensão da influência da Semana de Arte Moderna é tão grande que fica até difícil estimar a importância das questões levantadas pelos modernistas”, diz o diretor artístico. O empenho em se aprofundar na realidade brasileira, o desejo de inovação técnica, o reconhecimento de potências originais na nossa cultura: tudo isso já estava em jogo para eles. A antropofagia de Oswald de Andrade e demais modernistas, sua audácia de metabolizar o que é estrangeiro em nossos próprios termos e para nossos propósitos, faz parte desse mesmo quadro. Vivemos hoje tempos de conturbação sistêmica - ecológica, política, sanitária -, com todo o outro leque de problemas. E o Modernismo decerto não basta como quadro geral de compreensão do mundo, mas a inspiração de seu legado permanece. Muito do melhor de nós nasceu ali.”

 A Osesp também realiza novas gravações em 2022. Antes da abertura da temporada, o grupo grava Pequenos Funerais Cantantes e a Sinfonia n.º 2 - Dos Orixás, de Almeida Prado. A regência será do maestro Neil Thomson

Já com Giancarlo Guerrero serão gravados os concertos de Francisco Mignone para violino, fagote e clarinete, com solos de Baldini, Alexandre Silvério e Ovanir Buosi. E o violoncelista Antonio Meneses e o maestro Isaac Karabtchevsky seguem com a gravação da obra para violoncelo e orquestra de Villa-Lobos. Todas essas obras serão lançadas pelo selo Naxos. E, pelo Selo Digital Osesp, está previsto registro da Nona Sinfonia de Beethoven. 

Destaques da programação

  • Viva Villa!: O compositor brasileiro terá diversas obras apresentadas ao longo do ano, incluindo sinfonias, choros, bachianas, peças de câmara e corais, como A Floresta do Amazonas.
  • Strauss & Sibelius: Jean Sibelius é o compositor escolhido pelo diretor musical Thierry Fischer, que vai reger diferentes obras suas. Ao mesmo tempo, ele vai se dedicar a um ciclo Richard Strauss.
  • Homenagens: A orquestra vai comemorar os 70 anos de Arrigo Barnabé, estreando obra de câmara encomendada para a ocasião. 
  • Convidados: A lista de músicos convidados inclui nomes como Andreas Haefliger, Heinz Holliger, Juliane Banse e Jörg Widman.

Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO

Câmbio e inflação são desafios para 2022

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A Fundação Osesp perdeu R$ 50 milhões em receitas com as paralisações e restrições de atividades em 2020 e 2021. A estimativa é do diretor executivo da instituição, Marcelo Lopes.

“Metade desse valor tem a ver com a venda de ingressos, que, durante boa parte do período, com o cancelamento dos concertos, não aconteceu. E a outra tem a ver com o patrocínio. Sem programação, não há despesa, então não posso usar o dinheiro de patrocínio que está no caixa. Ou seja, ele está lá, mas não pode virar receita para a instituição”, explica Lopes.

Em 2020, a Osesp trabalhava com uma previsão orçamentária de R$ 100 milhões, mas o valor ficou em R$ 76 milhões. Em 2021, de uma previsão de R$ 110 milhões, chegou-se ao valor de R$ 85 milhões. Durante a pandemia, o grupo reduziu salários em 15%. 

Para 2022, o orçamento trará alguns desafios. Os principais deles, o câmbio e a inflação. “O orçamento não está totalmente fechado ainda, mas com as variações no câmbio, que tornam mais caros os artistas de fora, e a inflação, nossa estimativa é de um custo de R$ 125 milhões. Só com a inflação, nossa despesa em folha de pagamento precisaria aumentar em R$ 6,5 milhões”, diz Lopes.

O repasse do governo estadual deve ficar em torno de R$ 57 milhões, de acordo com o contrato de gestão. “A opção é investir pesado na busca de recursos da iniciativa privada. Reforçamos nosso departamento de captação, por exemplo. E contamos também com a receita que vem do aluguel da sala para eventos, que esperamos volte a acontecer.”

Outros custos estão relacionados com o Festival de Verão, que será realizado a partir de janeiro em Campos do Jordão. E com o plano de transmissão de concertos pela internet.

Segundo Lopes, todos os programas apresentados pela Osesp em 2022 serão transmitidos, às sextas-feiras, além de oito concertos da série Matinais, da qual participam outros grupos, nas manhãs de domingo.

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A orquestra investiu, no primeiro semestre, na compra de equipamentos 4K para realizar as transmissões, com câmeras controladas de forma remota.

“A grande questão é como rentabilizar, criar um plano de negócios em torno das transmissões. Esse é o desafio ainda da internet. Talvez a gente consiga conceber um plano de assinaturas online, por exemplo, ou rentabilizar o nosso acervo.”

Segundo Lopes, todos precisaram entender, durante a pandemia, como medir a presença na internet, que tem dinâmicas específicas. “Um concerto nosso de sexta-feira chegou a ter 12 mil espectadores, mas cada um se comporta de uma maneira diferente. Com o tempo, no entanto, fomos percebendo que se desenvolvia um hábito de não assistir ao vivo, mas, sim, no final de semana, como se fosse um ritual, sempre no mesmo horário. E algo muito especial, quando a sala reabriu, foi ver um público novo, que conheceu a orquestra e a sala nas transmissões digitais e, quando foi possível, quis ir conhecer tudo aquilo de perto.”

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