Na manhã de segunda-feira, 8, o barítono inglês Roderick Williams falou em sua conta no Twitter de uma sensação estranha. “A coroação parece um conto de fadas de um outro mundo”, escreveu, com uma foto da Alameda Santos, na região central de São Paulo.
“É essa mesma a sensação”, ele brinca, durante conversa um dia depois com o Estadão. No sábado, cantou na Abadia de Westminster enquanto o Rei Charles III era coroado. E, desde segunda, está em São Paulo onde, nos dias 11, 12 e 13, interpreta o papel de Mefistófeles em A Danação de Fausto, do compositor francês Hector Berlioz, com a Osesp, na Sala São Paulo.
“Eu na verdade nem consegui ver direito a coroação. Do meu lugar, só deu para ver o rei e a rainha entrando e saindo da abadia. Ainda vou precisar sentar em frente a uma televisão para ver tudo o que aconteceu”, ele brinca. E completa, em seguida. “De certa forma, estar aqui, no palco, ensaiando com a orquestra... É estranho o que vou dizer, mas isso é o meu trabalho de verdade. Cantar na coroação foi incrível, mas algo nada corriqueiro. O que eu faço é estar no palco, cantando.”
Isso, desde a infância. Nascido em 1965 no norte de Londres, filho de pai escocês e mãe jamaicana, ele começou a cantar em coro ainda na infância, seguindo com a prática na adolescência e mesmo depois de formado, quando começou a trabalhar como professor.
“Há algo em se cantar em um coral que é muito especial. Quando se fala em educação musical, há uma primeira barreira, que é o preço de um instrumento. Mas a voz é de graça. E no coro, não importa o quão diferente as pessoas sejam, elas precisam cantar e soar juntas”, ele explica.
Pouco depois de completar 20 anos, ele passou por um momento de decisão, quando resolveu apostar na carreira de cantor solista. Sua trajetória tem, desde então, sido ligada em especial ao repertório de canções inglesas. Ele gravou, por exemplo, todas as canções de Ralph Vaughan Williams, ao lado de discos dedicados a Britten, James MacMillan, Sir Hubert Parry – a lista parece interminável.
Mas também há discos dedicados a canções francesas e alemãs, Schubert em especial. O que não significa um interesse menor pelo repertório de ópera. “É uma impressão errada que as pessoas têm do meu trabalho. Na verdade, não apenas faço ópera, como quem me ouve cantar canções costuma achar minha interpretação dramática, operística.”
Berlioz não chamou sua Danação de Fausto de ópera, mas, sim, de lenda dramática – a mistura de gêneros musicais foi uma das marcas do trabalho do compositor. Mas isso não significa que a obra não seja operística.
“A questão com Berlioz é que o mundo dele é um mundo próprio. Há o Barroco, o Classicismo, o Romantismo, e Berlioz. Também componho e às vezes ouço algo que ele escreveu e me dou conta de que jamais teria imaginado aquilo. Sua música existe de certa forma apenas no mundo da imaginação.”
A Danação de Fausto
Osesp. Dias 11 e 12, às 20h30; dia 13, às 16h30. Sala São Paulo. Praça Julio Prestes, 16, tel. (11) 3777-9721. De R$ 50 a R$ 258.
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