A melhor, a maior... O rock dos anos 80, às voltas com seus 40 anos de existência, não tem um rei absoluto, mas muitos pretendentes com guardiães prontos para defendê-los de qualquer coisa que julguem ser uma injustiça. Uma matéria no Estadão, afirmando que a recente turnê dos Titãs iria alçá-los à condição de maior banda de sua geração, acendeu discussões acaloradas. Cada leitor trouxe seu grupo do coração, justificando escolhas com algum critério técnico e muita paixão.
Opine: das 4 bandas mais citadas por artistas, jornalistas e produtores, qual a sua preferida?
O fato é que fechar em torno de um nome da maior banda daquela era seria tarefa impossível sob qualquer ângulo. Cada uma, ou a maioria delas, desempenhou um feito importante. Os Titãs têm hoje a força agregada da memória afetiva, e o maior número de ouvintes do Spotify, mas os Paralamas indicaram o caminho da próxima década ao construir um rock mais brasileiro; a Legião ganhou uma dimensão messiânica de eterna atualização com a figura de Renato Russo; o Ira! conseguiu manter-se com um projeto sonoro de originalidade inigualável; e o RPM guarda os primeiros números astronômicos da história do pop brasileiro, com recordes de público em shows e lojas de discos.
Mas se os fãs do Ultraje a Rigor, Camisa de Vênus, Nenhum de Nós, Capital Inicial, Barão Vermelho e todas as outras que estavam por ali quiserem sustentar suas predileções, certamente, terão um ou dois argumentos sólidos.
O Estadão ouviu artistas, jornalistas e empresários do meio musical para saber, para eles, qual delas ficou como a grande banda dos tempos em que o Brasil redescobriu sua juventude, depois de anos de um regime militar esteticamente envelhecido e ranzinza. Mas que fique claro: não se trata aqui de uma enquete para a descoberta de um nome de ponta, com escolhas técnicas. O que se pediu foi: Qual a banda dos anos 80 que mais tocou em seu coração.
Roberto Medina (empresário criador do Rock in Rio e do The Town)
Barão Vermelho e Paralamas do Sucesso
De todas, as minhas são Barão Vermelho e Paralamas do Sucesso. Um vizinho de Herbert Vianna me trouxe uma fita cassete e eu acabei colocando o grupo no Rock in Rio de 1985. Eu estava assustado com o fato de eles, garotos, tocarem sem nada, cenário, nada. Mas foi só começarem Óculos que a Cidade do Rock veio abaixo. E sobre o Barão, não posso me esquecer do Cazuza, no mesmo Rock in Rio, cantando Pro Dia Nascer Feliz, que se tornou o hino da esperança com a volta da democracia. Essas duas bandas ficaram impressas em mim pra sempre.
Simone (cantora)
Barão Vermelho e Legião Urbana
São duas, Legião Urbana e Barão Vermelho. “Legião Vermelho”. Eu vinha de ouvir Rita Lee com os Mutantes e depois Tutti Frutti. Fiquei muito próxima ao Cazuza, que me trouxe O Tempo Não Para, e acabei lidando com o pessoal dos Titãs, Paralamas, muita gente. Mas meu coração fica com essas duas, Legião e Barão.
Lô Borges (compositor e cantor)
Legião Urbana
As letras de Renato e aquele som cru sempre me tocaram. Talvez o fato de serem de Brasília, uma cidade mais difícil de se viver, tenha ajuda Renato a se tornar esse compositor, esse letrista sublime. Eu amava Ainda é Cedo, Tempo Perdido, acho Índios uma obra prima.
Alguns colegas meus ouviam os roqueiros dos anos 80 com desdém. Um deles me disse uma vez, sobre os Titãs: “Muito homem pra pouco serviço.” Era nada. Era muito serviço.
Lô Borges
Nelson Motta (jornalista, biógrafo)
Titãs
Eles não são só uma banda de rock and roll. Eram, no início, brega, samba, punk, e desse caldo nasceu a banda, pra mim, já com um diferencial. Eram oito cabeças compondo, cantando, tocando... Se tornaram oito possibilidades de ótimos compositores. A força dos Titãs é o coletivo
Chris Fuscaldo (biógrafa, jornalista)
Legião Urbana
A Legião, para mim, é a maior banda dos anos 80. E foi a maior porque conseguiu um lugar, um espaço de ídolos que passou a manter uma relação um tanto messiânica, ou mitológica, com seus fãs. Renato já era pressionado com essa coisa do mito, a banda em atividade já tinha isso, e fazia shows em estádios grandiosos, como Mané Garrincha e o Maracanãzinho. Eu vejo a Legião realmente como banda que tinha um pouco mais de potencial do que as outras enquanto estava em atividade, mas também depois. As pessoas poderiam ter pulado para outras bandas com a morte de Renato Russo, muitas ficam pelo meio do caminho, mas a Legião só cresceu. Das que estão em atividade, os Titãs são os maiores.
Roberto de Carvalho (compositor, músico)
Titãs
Éramos mais próximos nos anos 80, quando eu e Rita Lee tínhamos o mesmo empresário que eles (Manoel Poladian). A força desta banda é muito grande, principalmente com relação ao discurso. Eles traziam uma agressividade com inteligência, algo que não era comum. Eu e Rita não estávamos com o pessoal do rock nos anos 80, continuávamos seguindo Gil, Caetano, Tom Zé, Gal, Simone... mas Rita sabia que havia aberto a avenida para que eles pudessem passar.
Ricardo Alexandre (jornalista, biógrafo)
RPM e Titãs
O que faz uma banda ser maior do que a outra é a forma como as pessoas as enxergam. Há momentos. Se formos considerar alguns números, o RPM foi a grande banda naquela época. O que é curioso, porque o som que faziam é a anti cartilha do que era considerado música fácil. No entanto, eles se beneficiaram das circunstâncias políticas e sociais daquela época.
Os Titãs, hoje, é a única banda que pode se beneficiar dos aspectos da nostalgia. Se a maior banda for constatada pelo público, os Titãs seriam então a maior. Eles representaram a chegada do pós punk nas gravadoras, a ascensão de São Paulo na cultura brasileira.
Rodrigo Melim (banda Melim)
Capital Inicial e Legião Urbana
Curto muito o som de várias bandas dos anos 80, mas as que me marcaram mais foram Legião Urbana e Capital Inicial. Acho que minha primeira lembrança é de estar com meu irmão mais velho, aprendendo a cantar Faroeste Caboclo. As primeiras músicas que aprendi a tocar no violão foram Tempo Perdido e Que País é Esse. Cantei Natasha também muitas vezes nos karaokês de Jurujuba, essas bandas foram muito importantes pra ascender a chama, o amor pela música e me inspiraram muito de várias maneiras.
Guilherme Arantes
Paralamas do Sucesso e Gang 90
A Gang 90, com Julio Barroso, abriu o caminho para que muitas delas pudessem passar depois, mas entendo que, das maiores, os Paralamas me impressionaram por trazer três músicos com muita qualidade técnica. O apuro de Herbert na guitarra, a bateria de João e o baixo de Bi Ribeiro eram tocados com maestria. Havia muita qualidade ali.
André Barcinski (documentarista, jornalista)
Ira!
A que mais se manteve fiel à proposta original de um som foi o Ira! Admiro muito esse grupo por isso.
André Forastieri (jornalista, ex-editor da Revista Bizz)
Paralamas do Sucesso
A trajetória mais criativa, para mim, é da os Paralamas. Começou com algumas gracinhas, mas eles logo incorporaram ritmos, temáticas e instrumentação de outros universos, até chegarem a um olhar muito brasileiro que influenciaria demais a geração dos anos 90. Eles fazem a transição.
Outro feito foi a conexão que só eles fizeram com outros países, como a Argentina. Eu achava sem graça à época, mas hoje reconheço a importância do que foi tudo isso.
André Forastieri
Ney Matogrosso (artista)
Titãs, Paralamas do Sucesso, RPM e Barão Vermelho
Para mim são quatro bandas, não consigo escolher só uma daquela geração. Titãs, Paralamas do Sucesso, RPM e Barão Vermelho. Apesar de todos dizerem que os Secos e Molhados haviam influenciado essa geração, eu não percebia assim. Acho que aquilo era uma outra linguagem.
Qual é a conclusão? As entrevistas não tiveram volume e nem formato de uma eleição, mas de ampliar a conversa. De qualquer forma, dá para visualizar, pelo número de citações, bandas que ficaram no coração dos entrevistados: Titãs (4), Legião Urbana (4), Paralamas (4), Barão Vermelho (3), RPM (2), Capital Inicial (1), Ira! (1), Gang 90 (1).
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