Steve Albini, morto aos 61 anos, vítima de um ataque cardíaco, era verborrágico quando interessava, de opiniões imutáveis. Também ficava intencionalmente quieto, como se deixasse o interlocutor nervoso, com um silêncio que pesava toneladas.
A fama de resmungão, mas também de ser um sujeito de bom coração com as bandas novas, fizeram dele um dos pais do rock pesado moderno.
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Quem ama Pixies, Nirvana, PJ Harvey, The Breeders, e os dissidentes, de gerações posteriores, deve a estética das guitarras arrasadoras, altas a ponto de parecer gastar o tímpano, ao estilo de Albini.
Entre suas manias, ele detestava ser chamado de produtor, preferia ser tratado como “engenheiro de som”. Que assim seja: Steve Albini era muito mais do que produtor do Nirvana, Pixies e essa turma toda. Faz sentido. Albini não era arbitrário nas suas interações em estúdio, mas ele tinha um estilo próprio: quem o procurava para trabalhar sabia o que encontraria.
Foi por isso que Kurt Cobain buscou Albini para produzir o terceiro álbum da carreira do Nirvana. Depois de estourar com o segundo trabalho, Nevermind, e se tornar a banda punk mais popular do mundo, parte de Kurt queria voltar às raízes cruas, ruidosas e entorpecidas de raiva.
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Em 1988, Albini produzira Surfer Rosa, o álbum de estreia do Pixies, e um dos discos de cabeceira de Kurt Cobain. O líder do Nirvana admitiu que “Smells Like Teen Spirit”, hit máximo da sua banda, foi criado para tentar emular Black Francis e companhia.
O problema, entre aspas, é que Kurt superou qualquer popularidade do Pixies com esse álbum. E, de certa maneira, ele queria buscar a essência. Depois de passar pelo Brasil, em conturbada passagem em 1993, onde Kurt e banda gravaram algumas demos em um estúdio no Rio de Janeiro, a banda rumou para Minnesota para gravar com Albini.
Em 14 dias, In Utero estava pronto. Uma obra crua, intensa. O álbum pulsava a energia do caos emanada pelo trio, principalmente por Kurt. Injustiçado, Albini foi culpado pela gravadora pelo som cru e pouco comercial. Uma briga intensa nos bastidores, por fim, decidiu por um polimento no material criado em Minnesota a ser feito pelo veterano Bob Ludwig. Ainda depois, Scott Litt remixou os singles (All Apologies, Heart-Shaped Box e Pennyroyal Tea), para a fúria do produtor original.
Albini nunca levou a história numa boa, óbvio. Quando o entrevistei, em 2013, para celebrar os 20 anos de In Utero, cujo aniversário também incluiria o lançamento de uma versão mais próxima daquela de Albini, ele não parecia particularmente feliz. Era um sábado a tarde, também, o que pode ter contribuído na adorável rabugice do outro lado da linha telefônica.
Steve Albini morreu com 61 anos. E quase o vimos ao vivo, com a sua seminal, crua e tão-punk-que-não-tem-Spotify banda Shellac. Ele era parceiro de longa data dos curadores do festival catalão Primavera Sound - o Shellac era considerado uma instituição no tradicional festival realizado em Barcelona.
E Albini havia confirmado a presença do Shellac, assinado a carta de intenções. Quando se deixou a mesa de negociações e partiram para a burocracia de uma vinda para o Brasil, Albini desistiu.
A resposta oficial para o cancelamento foram “circunstâncias imprevistas”, mas a verdade é que tudo se tornou burocrático demais (emitir contratos, fazer visto de trabalho, comprar passagens, criar a logística…). E, quando se conhece Albini, é fácil abrir um sorriso ao pensar que ele simplesmente achou o processo complexo e preferiu ficar em seu estúdio, com o que mais gostava: assinando a engenharia de som de algum disco punk.