O disco 1000 Palms, o terceiro do Surfer Blood, soa solar à primeira audição. Na segunda e terceira também. Isso não significa que as circunstâncias através das quais o álbum fora gravado sejam tão iluminadas quanto os versos cantados por John Paul Pitts ao longo dos 37 minutos de som, lançado no Brasil pela gravadora independente carioca LAB 344.
Ao contrário, as guitarras suaves que pontuam o disco com uma atmosfera tropical choram pela ausência. Quando tinha 17 anos, o guitarrista Thomas Fekete foi diagnosticado com um tipo raro câncer. Lutou e venceu a doença. Embarcou na estrada com o Surfer Blood ao longo de 6 anos e dois discos. Depois do o período de gravação e pós-produção, um mês antes do lançamento de 1000 Palms, a doença voltou. “Há alguns meses, fiz uma grande cirurgia para remover um enorme tumor do meu abdômen”, escreveu o músico de 24 anos, em abril do ano passado. “Fui diagnosticado com uma forma rara e agressiva de câncer chamado sarcoma, que infelizmente se espalhou. Há alguns dias, meus médicos informaram que ele havia chegado aos meus pulmões e à minha coluna vertebral.” Fekete precisou se ausentar da banda mais uma vez, para novamente batalhar pela própria vida, por meio da quimioterapia e de um tratamento alternativo.
O Surfer Blood não parou. “Thomas tem sido uma pessoa muito positiva com relação a doença dele”, explicou Pitts, ao Estado, por telefone. “É uma luta muito dura e longa contra isso.” A banda segue em turnê com o novo álbum e faz o possível para ajudar à custear o tratamento de Fekete, com shows para angariar fundos e a criação de uma leilão com discos e raridades de outras bandas do cenário indie, como Yo La Tengo, Guided By Voices, Cults, Real Estate, The Pains of Being Pure at Heart, Lou Barlow, The Ghost of a Saber Tooth Tiger, entre outros. Todo o dinheiro é doado para o músico.
1000 Palms também marca o reerguimento do Surfer Blood como banda independente, depois de 5 anos de contrato com a gravadora Warner Music e um disco lançado por ela, Pythons. A banda diz ter sido abandonada pela major e viu seu prestígio cair depois da arrebatadora estreia, com Astro Coast, de 2010. Sensação vindo da Flórida, o grupo decepcionou com o insosso Pythons, produzido por Gil Norton, responsável por grandes discos do Pixies.
O Surfer Blood precisou voltar a se adaptar ao ambiente independente e trabalhar com recursos limitados. No processo, perdeu ainda o baixista Kevin Williams, substituído por Lindsey Mills, colega de colegial da turma. Williams decidiu deixar a banda – e com ela, o sonho de viver de rock – para aceitar um emprego em Austin, no Texas. “Ele queria um pouco mais de estabilidade. Posso entendê-lo”, diz Pitts. “Tento levar as coisas um dia por vez. Sabe, sinto que as coisas estão ficando mais fáceis. Tenho escrito muita música. Vamos ver até onde isso vai nos levar.” Por mais sombrio, Pittz não consegue deixar de ser otimista. “Sempre improvisamos muito. E, para a nossa sorte, sempre conseguimos cair com os dois pés no chão”, garantiu.
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