Tony Bennett, voz emblemática da música americana, morre aos 96 anos

Causa não foi confirmada, mas ele foi diagnosticado com Alzheimer em 2016. Em oito décadas de carreira, ele foi intérprete de clássicos do pop dos EUA e arrebatou o público em parcerias que foram de Frank Sinatra a Lady Gaga

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Por Redação
Atualização:

AP | O cantor Tony Bennett morreu nesta sexta-feira, 21, aos 96 anos, nos EUA. A assessora de imprensa do cantor Sylvia Weiner, confirmou a morte de Bennett à Associated Press, dizendo que ele morreu na sua cidade natal, Nova York. Não houve uma causa específica, mas Bennett foi diagnosticado com a doença de Alzheimer em 2016. Ele faria aniversário em apenas duas semanas.

Ele foi um intérprete atemporal, com devoção a canções clássicas americanas e habilidade para criar novos paradigmas em músicas como “I left my heart in San Francisco”. Sua carreira de décadas lhe trouxe admiradores e parceiros que foram de Frank Sinatra a Lady Gaga.

Tony Bennett na 60º edição do Grammy Awards Foto: REUTERS/Andrew Kelly

O último dos grandes cantores de saloon de meados do século 20, Bennett costumava dizer que sua ambição ao longo da vida era criar “um catálogo de sucessos em vez de discos de sucesso”. Ele lançou mais de 70 álbuns, vencendo 19 Grammys, e desfrutou de um afeto profundo e duradouro de fãs e outros artistas.

Bennett tinha voz rica e duradoura

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Bennet não ficava contando sua própria história ao se apresentar; o cantor deixava as músicas falarem por ele - canções de Gershwins e Cole Porter, Irving Berlin e Jerome Kern. Ao contrário do amigo e mentor Sinatra, ele interpretava uma música em vez de encarná-la.

Se seu canto e sua vida pública não tinham o alto teor dramático de Sinatra, Bennett atraía com um jeito fácil e cortês e uma voz incomumente rica e duradoura - “Um tenor que canta como um barítono”, ele se definia.

“Gosto de entreter o público, fazendo-o esquecer os problemas”, disse ele à The Associated Press em 2006. “Acho que as pessoas (...) se sentem tocadas quando ouvem algo sincero e honesto e talvez com um pouco de senso de humor. (...) Gosto de fazer com que as pessoas se sintam bem quando me apresento.”

Bennett foi elogiado com frequência pelos colegas, mas nunca de forma mais significativa do que o que Sinatra disse em uma entrevista à revista Life de 1965:

Para mim, Tony Bennett é o melhor cantor do ramo. Ele me empolga quando o vejo. Ele me emociona. Ele é o cantor que consegue transmitir o que o compositor tem em mente, e provavelmente um pouco mais

Frank Sinatra

Artista atemporal, atrevessou gêneros e se adaptou ao tempo

Ele não apenas sobreviveu à ascensão do rock, mas resistiu por tanto tempo e tão bem que conquistou novos fãs e colaboradores, alguns jovens o suficiente para serem seus netos. Em 2014, aos 88 anos, Bennett quebrou o próprio recorde como o artista vivo mais velho com um álbum número 1 na parada Billboard 200 por Cheek to Cheek, projeto de duetos com Lady Gaga.

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Lady Gaga e Tony Bennet se juntam em segundo disco de parceria Foto: Instagram/ @ladygaga

Três anos antes, ele chegou ao topo das paradas com Duets II, com a participação de estrelas contemporâneas como Gaga, Carrie Underwood e Amy Winehouse - na última gravação dela em estúdio. O relacionamento com Winehouse foi registrado no documentário “Amy”, indicado ao Oscar, que mostrou Bennett incentivando pacientemente a jovem cantora insegura durante uma apresentação de Body and Soul.

O último álbum, o lançamento de 2021 Love for Sale, contou com duetos com Lady Gaga na faixa-título, Night and Day e outras canções de Porter.

Para Bennett, um dos poucos artistas a transitar facilmente entre o pop e o jazz, essas colaborações faziam parte da cruzada para expor novos públicos ao que ele chamava de Great American Songbook - Grande Livro da Música Americana, em tradução livre.

“Nenhum país deu ao mundo uma música tão boa”, disse Bennett em uma entrevista de 2015 à revista Downbeat. “Cole Porter, Irving Berlin, George Gershwin, Jerome Kern. Essas músicas nunca morrerão.”

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I Left My Heart In San Francisco

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Ironicamente, a contribuição mais famosa veio por meio de dois desconhecidos, George Cory e Douglass Cross, que, no início dos anos 60, deram a Bennett a música de assinatura dele em um momento de baixa na carreira. Eles entregaram ao diretor musical de Bennett, o pianista Ralph Sharon, algumas partituras que ele guardou em uma gaveta da cômoda e esqueceu até estar fazendo as malas para uma turnê que incluía uma parada em São Francisco.

“Ralph viu algumas partituras na gaveta de camisas dele... e no topo da pilha havia uma música chamada I Left My Heart In San Francisco. Ralph achou que seria um bom material para San Francisco”, disse Bennett. “Estávamos ensaiando e o barman do clube em Little Rock, Arkansas, disse: ‘Se vocês gravarem essa música, serei o primeiro a comprá-la’.”

Lançada em 1962 como o lado B do single Once Upon a Time, a balada reflexiva tornou-se um fenômeno popular, permanecendo nas paradas por mais de dois anos e rendendo a Bennett os dois primeiros Grammys, incluindo o de disco do ano.

Ícone na cultura pop

Aos 40 e poucos anos, ele estava aparentemente fora de moda. Mas depois de completar 60, uma idade em que até mesmo os artistas mais populares costumam se contentar em agradar aos fãs mais velhos, Bennett e o filho e empresário, Danny, encontraram maneiras criativas de comercializar o cantor para a geração MTV.

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Ele fez aparições como convidado no programa de David Letterman e se tornou uma celebridade convidada de Os Simpsons. Ele usou uma camiseta preta e óculos escuros como apresentador com os Red Hot Chili Peppers do MTV Music Video Awards de 1993. O vídeo de Steppin’ Out With My Baby, do álbum de tributo dele a Fred Astaire, vencedor do Grammy, foi parar no badalado Buzz Bin da MTV.

Isso levou a uma oferta em 1994 para participar de um episódio do MTV Unplugged com os convidados especiais Elvis Costello e K.D. Lang. A apresentação da noite resultou no álbum Tony Bennett: MTV Unplugged, que ganhou dois Grammys, incluindo o de álbum do ano.

Bennett ganharia Grammys por tributos a vocalistas femininas (Here’s to the Ladies), Billie Holiday (Tony Bennett on Holiday) e Duke Ellington (Bennett Sings Ellington - Hot & Cool). Ele também ganhou Grammys por suas colaborações com outros cantores: Playin’ With My Friends - Bennett Sings the Blues e seu tributo a Louis Armstrong, A Wonderful World com K.D. lang, o primeiro álbum completo que ele gravou com outro artista. Ele comemorou seu 80º aniversário com Duets: An American Classic, com a participação de Barbra Streisand, Paul McCartney e Stevie Wonder, entre outros.

“Todos eles são gigantes do setor e, de repente, estão me dizendo: ‘Você é o mestre’”, disse Bennett à AP em 2006.

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Tony Bennett em 2019 Foto: Demetrius Freeman/Reuters

De volta às origens

Por muito tempo associado a São Francisco, na Califórnia, Bennett perceberia que seu verdadeiro lar era Astoria, uma comunidade da classe trabalhadora no bairro de Queens, em Nova York, onde ele cresceu durante a Grande Depressão. O cantor escolheu o antigo bairro como local para a escola pública de ensino médio estilo Fame, a Escola de Artes Frank Sinatra, que ele e a terceira esposa, Susan Crow Benedetto, uma ex-professora, ajudaram a fundar em 2001.

A escola não é longe do local de nascimento do homem que um dia foi Anthony Dominick Benedetto. O pai dele era um imigrante italiano que inspirou o amor por cantar, mas ele morreu quando Anthony tinha dez anos. Bennett deu crédito à mãe, Anna, por lhe ensinar uma lição valiosa enquanto ele a assistia em casa, sustentando três crianças como costureira fazendo trabalhos por encomenda depois que o pai dele morreu.

“Nós éramos muito pobres”, disse Bennet em uma entrevista à AP em 2016. “Eu a via trabalhando, e de vez em quando ela pegava um vestido e jogava por cima do ombro e dizia: ‘Não me deixe trabalhar com um vestido ruim. Só vou trabalhar com vestidos bons.’”

Tony Bennett serviu ao exército durante a Segunda Guerra

Ele estudou arte comercial no ensino médio, mas teve que desistir para ajudar a família. O então adolescente conseguiu um emprego como copista para a agência agência AP, atuava como garçom cantor e competia em shows amadores. Soldado da infantaria de combate durante a Segunda Guerra Mundial, ele serviu como bibliotecário para a Rede das Forças Armadas após a guerra e cantou com uma banda do exército na Alemanha ocupada.

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Bennett aproveitou a G.I. Bill (lei que fornecia uma série de benefícios para alguns dos veteranos da Segunda Guerra Mundial) para frequentar o American Theatre Wing, que mais tarde se tornou o The Actors Studio, uma associação de atores, diretores de teatro e roteiristas em Nova York.

Treinamento vocal era constante na vida do intérprete

As aulas de atuação o ajudaram a desenvolver o discurso e aprender a contar uma história. Ele aprendeu a técnica vocal do Bel Canto, que o ajudou a sustentar e estender o alcance da voz. E levou a sério o conselho da treinadora vocal, Miriam Spier.

“Ela disse: por favor, não imite outros cantando porque você só será parte do coro de quem quer que você esteja imitando, seja ele Bing Crosby ou Frank Sinatra, e não vai desenvolver um som original”, lembrou Bennett em uma entrevista de 2006 à AP. “Ela disse para imitar os músicos que você gosta, descubra como eles falam. Fui particularmente influenciado por músicos de jazz como [o pianista] Art Tatum e [os saxofonistas] Lester Young e Stan Getz.”

Trajetória e oportunidades que levaram ao estrelato

Em 1947, Bennett gravou a primeira música, Fascinating Rhythm, para uma pequena gravadora sob o nome artístico de Joe Bari. No ano seguinte, ele ganhou notoriedade quando ficou em segundo lugar no programa de rádio Arthur Godfrey’s Talent Scouts, atrás de Rosemary Clooney.

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A grande chance de Bennett veio em 1949, quando a cantora Pearl Bailey o convidou para se juntar à apresentação em um clube de Greenwich Village. O comediante americano Bob Hope apareceu uma noite e ficou tão impressionado que ofereceu ao jovem cantor uma vaga para abrir shows no famoso Paramount Theatre, onde adolescentes desmaiavam por Sinatra. Mas Hope não gostou do nome artístico e achou que o nome verdadeiro era muito longo para a placa de divulgação.

“Ele pensou por um momento, e então disse, ‘vamos te chamar de Tony Bennett’”, escreveu o cantor na autobiografia The Good Life, publicada em 1998.

Em 1950, Mitch Miller, o diretor da divisão de músicas pop da Columbia Records, assinou com Bennett e lançou a canção The Boulevard of Broken Dreams, um pequeno hit. Bennett estava quase sendo dispensado pela gravadora em 1951 quando alcançou o primeiro lugar das paradas pop com a música Because of You. Mais sucessos se seguiram, como Rags to Riche, Blue Velvet e Cold, Cold Heart, de Hank Williams, a primeira canção country a se tornar um sucesso pop internacional.

Bennett frequentemente entrava em conflito com Miller, que o forçava a cantar baladas no estilo de Sinatra e canções obscuras. Mas Bennett se aproveitou do novo formato em álbuns, começando em 1955 com Cloud 7, que tinha uma pequena combinação de jazz liderada pelo guitarrista Chuck Wayne.

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Bennett alcançou o público do jazz com álbuns inovadores como The Beat of My Heart de 1957, um disco de um nível que o emparelhou com mestres da percussão do jazz como Chico Hamilton e Art Blakey. Ele também se tornou o primeiro cantor branco a gravar com a Count Basie Orchestra, lançando dois álbuns em 1958. Sinatra faria o mesmo mais tarde.

Tony Bennett deixa a esposa, Susan, as filhas Johanna e Antonia, os filhos Danny e Dae e nove netos.

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