Nadia Murad, Nobel da Paz, fala, no Brasil, sobre a violência sexual que sofreu

A ativista iraquiana participou do Fronteiras do Pensamento, em São Paulo

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Por Alice Ferraz

Segundo o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein, “os limites do mundo são os limites da linguagem de cada um, o mundo é definido e recebe significado pelas palavras que escolhemos”. A importância da máxima de Wittgenstein que coloca a forma como nos comunicamos em destaque como vetor de mudança se fez clara no discurso da ativista Nadia Murad, Prêmio Nobel da Paz que esteve em São Paulo para o ciclo de conferências Fronteiras do Pensamento, que nos últimos 16 anos reuniu grandes pensadores para discussão de assuntos da atualidade.

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Iraquiana da comunidade étnico-religiosa yazidi, Nadia teve sua história contada para o grande público pela primeira vez no 60 Minutes, programa de TV mais visto dos Estados Unidos, quando foi entrevistada em um campo de refugiados no Iraque.

Na época, Nadia conseguiu abrigo entre 12 mil refugiados, depois de ter fugido do cativeiro em que sofreu todo tipo de abuso e violência sexual por parte de terroristas que invadiram sua aldeia, matando parte de sua família.

A iraquiana Nadia Murad, de 30 anos, ganhou o Prêmio Nobel da Paz Foto: Greg Salibian/Fronteiras do Pensamento

Apesar do medo de expor o que tinha vivido e ter sido alertada de que falar sobre violência sexual seria perigoso, Nadia decidiu mesmo assim contar sua história. Diante da repercussão dessa primeira experiência, percebeu a força da comunicação e decidiu usar sua voz para tentar salvar sua família e comunidade, tornando-se ativista dos direitos humanos.

Nadia conseguiu em um programa que beneficiou mulheres e crianças refugiadas se mudar para a Alemanha onde vive e é responsável, entre outros feitos, pela criação do chamado Código Murad, um guia desenvolvido em parceria com o Centro de Direitos Humanos da Universidade Berkeley, na Califórnia.

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Nesse documento é oferecida uma solução prática, tendo em vista o cuidado e a importância da veracidade das narrativas oferecidas por sobreviventes a jornalistas que divulgam as histórias para portais de notícias ao redor do mundo.

O código destaca os principais problemas na abordagem de sobreviventes de violência sexual, como as repetidas e desnecessárias entrevistas realizadas por entrevistadores não qualificados com métodos ineficazes prejudiciais e causadores de novos traumas para os sobreviventes.

“Muitas vezes, a pergunta do entrevistador coloca a vítima como culpada. Dessa forma, existe uma deturpação da narrativa. As mulheres vítimas de violência sexual são estigmatizadas e a única forma de evitarmos essa violência é escutarmos as histórias dos sobreviventes. Conversar sobre a violência sexual contra as mulheres e de como ela é usada como uma arma de guerra para destruir comunidades e famílias é essencial. Não podemos simplesmente passar para o próximo assunto sem termos resolvido esse”, explica.

Na mesma invasão em que Nadia foi escravizada houve também o assassinato de sua mãe pelos sequestradores do Estado Islâmico, que a consideraram “velha demais para ser abusada sexualmente”.

Em seus agradecimentos pelo Nobel da Paz de 2018, Nadia dedicou o prêmio à mãe: “Eu penso em minha mãe e me sinto incrivelmente honrada e humilde por ser sua filha. Compartilho também esse prêmio com yazidis, iraquianos, curdos e outras minorias perseguidas e com as incontáveis vítimas da violência sexual em todo o mundo”.

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Fernando Schüler, curador e um dos fundadores do Fronteiras do Pensamento, convidou Nadia Murad para o evento que, em 2023, se propõe a abordar temas como Entre o Caos e a Ordem e apontar caminhos para superar as incertezas da contemporaneidade. Mais quatro painéis estão programados até outubro de 2023.

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