A Prefeitura de São Paulo pretende extinguir a Fundação Teatro Municipal. A informação foi confirmada ao Estado pelo secretário municipal de Cultura, André Sturm. Com isso, o contrato de gestão da organização social (OS) responsável pela gestão do espaço passará a ser feito diretamente com a secretaria, que deve incorporar parte da estrutura da fundação.
“Não faz sentido manter uma fundação apenas para administrar um contrato”, explica Sturm. A decisão depende de aprovação de uma nova lei pela Câmara Municipal, o que o secretário diz acreditar não ser um problema. “Há um trâmite legal a ser seguido, o que leva um tempo, mas não vemos motivos para objeções e nosso objetivo é que isso ocorra rapidamente”, diz.
A estrutura do Teatro Municipal de São Paulo abarca o teatro, seus corpos estáveis (orquestras, corais, corpo de baile), a Praça das Artes e as escolas de música e dança. A fundação foi criada em 2012, na gestão do ex-secretário Carlos Augusto Calil. É uma fundação pública e seu funcionamento depende de um contrato de gestão com uma organização social. É diferente do que acontece com a Osesp: a Fundação Osesp é privada, ou seja, é sua própria OS e firma um contrato de gestão diretamente com o governo do Estado.
O objetivo da fundação era dar mais independência ao teatro e a seus corpos estáveis, possibilitando por exemplo a contratação via CLT e maior agilidade na captação de patrocínios. Segundo explicações dadas por Calil na época, o foco do modelo era a descentralização, tendo em vista a multiplicidade de funções do Municipal. O estatuto da fundação prevê, por exemplo, cargos como o de diretor artístico, além da composição de conselhos artísticos, deliberativo e fiscal, responsáveis por ditar as propostas artísticas para o teatro. À OS caberia contratar os artistas e pagar os custos de produção. Críticas. O modelo de fundação pública, no entanto, foi alvo de polêmicas desde o início, assim como a relação entre ela e a organização social. Diretor artístico do teatro entre 2013 e 2016, o maestro John Neschling referiu-se a ele como símbolo de “um democratismo anacrônico, resultado de uma ideologia ultrapassada”. Na gestão anterior e na atual, tanto o diretor artístico como o regente foram contratados pela OS, esvaziando a estrutura prevista dentro da fundação e seus mecanismos de controle. As contratações, no entanto, foram determinadas diretamente pela secretaria, sem que a fundação participasse do processo e legando à OS apenas a tarefa de formalizar os contratos.
A decisão da secretaria acontece em meio à polêmica em torno do resultado do edital de seleção de uma nova OS para administrar o teatro: foi escolhido o Instituto Casa da Ópera, que tem ligações com o diretor artístico atual do Municipal, Cleber Papa. Segundo Sturm, o novo contrato será feito com a fundação e, com a extinção, migrará para a secretaria. Quanto à escolha do instituto, ele afirma que “o edital seguiu todos os trâmites legais”. “O fato (de que seja uma OS criada pelo atual diretor artístico do Teatro Municipal e até recentemente dirigida pela sua mulher) gera um ruído? Gera. Mas Cleber Papa não trabalha na secretaria. E se, como diretor artístico do Teatro Municipal, ele obviamente tem muitas informações sobre o que acontece lá dentro, o mesmo vale para todas as entidades interessadas, que sempre receberam as informações requisitadas.”Para Calil, fundação protege autonomia da instituição Secretário municipal de Cultura entre 2005 e 2012 e idealizador da Fundação Teatro Municipal, Carlos Augusto Calil diz lamentar “profundamente” a notícia do desejo da prefeitura de extinguir a entidade. “O modelo nunca foi de fato implementado”, diz ele. “A complexidade do teatro nunca foi entendida. A secretaria é frágil, pode acabar a qualquer instante, ser unida a outra secretaria. Por isso, as instituições precisam ter autonomia.”
Para Calil, o teatro não pode depender dos humores da secretaria, e seria essa a função da fundação. “Ela não existe para administrar um contrato e sim para garantir a independência da instituição. Além disso, a especificidade de um espaço com o Municipal é muito grande para poder ser administrada no nível de generalidade da secretaria”, diz.
“O Teatro Municipal tem uma configuração complexa, como nenhum outro teatro de ópera. Ele tem escolas, orquestras, corais. Não se trata apenas da produção de espetáculos: o que acontece no palco é resultado de um diálogo com uma busca pela formação de artistas e de público. Queríamos obrigar quem estiver à frente do teatro a enfrentar essa questão, de pensá-lo à luz de nossa época. Ignorar isso é voltar-se para dentro de si mesmo”, completa.Secretário é vaiado em abertura de festival de cinema O secretário municipal de Cultura André Sturm foi vaiado durante mais de 15 minutos na noite de quarta-feira, dia 26, na abertura do 12º Festival Latino-Americano de Cinema, realizado no Memorial da América Latina. Os presentes o receberam com palavras de ordem como “Não vai falar”, “golpista”, “fascista” e “descongela a cultura”. “Manifestar-se faz parte do jogo democrático, mas gritos e ofensas, não. Fui chamado de fascista, mas é característica do fascismo justamente impedir o contraditório”, diz Sturm. “Muito triste isso ocorrer num festival que propõe o diálogo”.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.