Eu estava na 6.ª série quando chegamos a um período na aula de História do Brasil chamado ditadura. Lembro que o que mais me chamava a atenção eram as fotos de jovens com cartazes e policiais com cassetetes. Pensava sempre “por que será que estão batendo em pessoas que pintaram cartazes?”. Depois foram as músicas que me ensinaram tanto: Apesar de Você, Pra não dizer que não falei das Flores, O Bêbado e a Equilibrista, É proibido proibir, Cálice, Opinião, Que as Crianças cantem livres e tantas outras.
Na semana passada, tivemos prefeito mandando recolher gibis no Rio de Janeiro. Na anterior, tivemos o cancelamento da peça do grupo A Motosserra Perfumada, censurada pelo atual (eles passam) diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte.
No fim de semana, uma peça do grupo Clowns de Shakespeare foi tirada de cartaz na Caixa Cultural Recife. Na coluna anterior, eu escrevi sobre lançamentos na música brasileira, enaltecendo que devemos falar das nossas conquistas, e tirar o foco dessas maluquices.
Mas as loucuras não param e o momento me parece urgente. Então, vamos cantar mais alto. Que músicas marcarão este momento que vivemos?
Flutua, da Johnny Hooker e Liniker (pois ninguém vai poder querer nos dizer como amar), é hino. Já vi essa música várias vezes em shows e sempre é o momento catártico de cantar chorando e colocando pra fora toda a indignação.
Valhacouto, canção composta por Douglas Germano e Aldir Blanc – aliás, esse disco todo do Douglas é trilha de 2019 e aproveito para grifar mais uma vez para que todos escutem Escumalha. O álbum anterior dele: Golpe de Vista, também entra aqui.
Nessa lista, tem também Menino Mimado, do Criolo. E um lançamento recente do Emicida, a música AmarElo com participação da Majur e Pabllo Vittar e sample de Sujeito de Sorte de Belchior – juntando duas épocas tão distantes e infelizmente agora próximas.
Uma música muito forte, também retrato de hoje, recém-lançada, e que merece ser mais espalhada é Samba Estranho, com Moacyr Luz & Samba do Trabalhador e participação de Chico Alves (compositor da canção ao lado de Moacyr): “Nesse sonho ruim que eu me via nem a poesia falava por nós”. A música também relembra outros tempos com versos de A Flor e o Espinho e Juízo Final.
O sonho estranho está quase um pesadelo.
Imagina a tristeza de ver fiscais entrando numa Bienal para confiscar livros por conta de um beijo. Imaginou? Tristeza sem fim, né? Mas que forte que é todos os exemplares já estarem vendidos.
Para cada retrocesso, uma pequena esperança.
Música da semana - Meu primeiro amor
Primeiro single lançado do novo disco do Lucas Santtana com participação de Duda Beat.
“Nasci menino longe da cidade/No semiárido lá do sertão/Não tinha água tão pouco comida/Até que Lula veio e deu a mão” canta a menina nessa canção de amor que não deixa de lado a situação política do nosso país. Belíssima.
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