Os novos episódios de O Rei da TV, série inspirada na vida de Silvio Santos, chegaram recentemente ao Star+. Diferentemente da 1ª temporada, que se dividia entre a juventude do apresentador e a época que antecedeu sua cirurgia na região da garganta, desta vez o foco se dá em um Silvio mais idoso - que o público acompanha nas últimas três décadas.
Isso acaba dando uma maior sensação de proximidade. Boa parte das histórias foram acompanhadas ‘ao vivo’ pelos espectadores, ou já relembradas à exaustão na internet (atenção - spoilers): sua participação na disputa presidencial de 1989, o sequestro de sua filha, Patricia Abravanel (e o seu próprio, pouco depois), o escândalo do Banco Panamericano...
A série segue sem apelar para imitadores caricatos de personagens como Faustão (Herton Gustavo Gratto), Gugu (Paulo Nigro) e o próprio Silvio Santos (José Rubens Chachá), mais preocupada com o foco às histórias do que em causar uma sensação de ‘nossa, ficou igualzinho’ ao público.
Enquanto as cenas passadas nas décadas de 1980 e 1990 se desenvolvem com agilidade, o mesmo não se pode dizer das referentes a 2010, que ao longo de toda a 2ª temporada demoram a mostrar o curto período que envolveu o momento em que o protagonista fica sabendo de um rombo no banco de seu grupo, por meio do telefonema de uma jornalista, e seu encontro com o então presidente Lula (por sinal, apesar da presença de figuras políticas na história, O Rei da TV não toma grandes partidos entre os nomes retratados, focando mais na relação de boa vizinhança de Silvio com os nomes que passaram pelo cargo durante a existência do SBT). Quando se compara as ‘duas metades’ da série, fica alguma sensação de ‘enrolação’ nesse sentido.
A ‘liberdade criativa’ e a ‘licença poética’ continuam a todo vapor. Na trama, o sequestro de Patrícia Abravanel acontece na mesma semana em que o Domingo Legal entrevista falsos integrantes do PCC, em que Silvio recebe material do Big Brother Brasil (o qual ‘adaptaria’ à Casa dos Artistas, sem adquirir os direitos, levando a problemas judiciais) e em que Gugu troca a emissora pela Record. Na realidade, todos fatos que ocorreram com anos de diferença, praticamente sem ligação um com o outro.
Gugu Liberato, inclusive, segue retratado como um homem frio e calculista nos bastidores. Em determinado momento, quando todos os funcionários do SBT acompanham o sequestro do patrão pela TV, Gugu pega suas coisas e vai embora da emissora, sem olhar para trás ou se preocupar com o amigo que corre risco de vida. Praticamente um vilão, ainda que O Rei da TV não tenha espaço para alguém ser categorizado como tal.
Assim como na 1ª temporada, também há claras insinuações de que Silvio Santos traiu suas esposas, ainda que não seja exibida sequer uma cena de beijo. Michelly (Giselle Itié), apontada como amante do apresentador na ficção, por exemplo, é uma atriz mexicana trazida para protagonizar uma novela do canal, mas parece mais ter sido inspirada em Sula Miranda, que sofreu com acusações semelhantes na vida real.
Em 2022, a própria cantora abordou o tema no podcast Piunti Entrevista: “Estreei no SBT, fiquei seis meses, porque depois em seguida aconteceu ‘o boato’. O povo acha que você conseguiu o programa por outros motivos... Saiu o boato de que eu era o pivô da separação do Silvio Santos [com Iris Abravanel]. Enfim, óbvio, acabei saindo do SBT. Graças a Deus ele e a família sabem que não foi esse o motivo”.
O Rei da TV é uma série interessante para se assistir, especialmente para quem gosta ou acompanhou a TV brasileira dos anos 1990 e 2000. Porém, o uso de nomes verdadeiros, seja de personagens, programas ou emissoras, pode levar algumas pessoas a imaginar se tratar de uma série biográfica, o que não é o caso.
Havendo dúvida se determinado fato aconteceu ou não, pode ser útil uma pesquisa na internet. Afinal, se nem toda ‘versão oficial’ é verdadeira, o mesmo vale para fofocas de bastidores.
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