A segunda temporada da série Unidade Básica, que estreia no domingo, 3, no canal Universal TV, começa com o médico interpretado por Caco Ciocler em uma ocupação na periferia da capital paulista pedindo desesperadamente para que as pessoas voltem para suas casas. Em um primeiro momento, parece que se trata de uma ação contra a covid-19, mas o local está ameaçado por outra epidemia, de tuberculose.
Dirigida por Caroline Fioratti e gravada entre fevereiro e março de 2019, portanto antes da pandemia, Unidade Básica 2 teve como ponto de partida a volta de epidemias que pareciam erradicadas, como sarampo e tuberculose, em decorrência da redução de investimentos no Sistema Único de Saúde (SUS). Diante do timing, o Universal TV vai transformar as chamadas da série em homenagens aos profissionais que estão hoje na linha de frente do combate à covid-19, mas que convivem em suas rotinas com outra luta inglória: a exigência de melhorar as estatísticas ampliando atendimentos em um sistema precário, sem deixar de tratar de cada caso como uma guerra pessoal pela vida.
“Agora, diante da pandemia, a população está entendendo a importância do SUS”, disse a criadora e protagonista da série Ana Petta. Ela conta que, devido à série, acabou se envolvendo com a comunidade médica do atendimento básico e que eles, hoje, cumprem o papel de desmentir diariamente nas comunidades o governo federal e convencer a população da importância do isolamento social. Em tempos de covid-19, são esses profissionais do SUS que organizam o isolamento nos locais mais complexos e em condições adversas, mapeiam as comunidades e fazem o primeiro cordão de isolamento.
Para Caco Ciocler, a pandemia resgatou três categorias que estavam sendo renegadas e desacreditadas: cientistas, artistas e profissionais da saúde. “Os cientistas voltaram a ter protagonismo, os artistas voltaram a ser valorizados, já que as pessoas estão recorrendo mais ao entretenimento. A classe média que está em casa está tendo mais contato com discos, livros, séries e filmes. E os profissionais da saúde são heróis que correm diariamente o risco de serem contaminados”, disse.
Diante dessa reflexão, o ator vai além no aspecto filosófico. “Estávamos muito atropelados pela velocidade produtiva, que leva a um raciocínio cada vez mais binário. A arte não é o lugar da certeza.”
Com quatro anos de distância em relação à primeira temporada, Unidade Básica 2 retoma o debate que é a espinha dorsal do roteiro: o embate desigual entre a pressão da máquina pública por estatísticas (ou seja, aumento de atendimentos sem novos investimentos) e o juramento médico de tratar cada paciente como uma guerra particular pela vida. Nos novos episódios, uma nova gerente é enviada para uma Unidade Básica de Saúde (UBS) com objetivo de melhorar os “números” da unidade, considerados ruins.
Realidade. Nesse contexto, o segundo episódio traz dois personagens recém-formados que descobrem a realidade da profissão. Segundo Caco, o universo da série o levou a ter contato com debates da categoria médica. Um deles, e talvez o mais intenso, é o dilema das novas gerações que se formam influenciadas pelo glamour das séries médicas enlatadas, nas quais os médicos são todos bem-sucedidos e ganham muito dinheiro.
Com roteiro de Newton Cannito e Marcos Takeda, a série traz Caco Ciocler em sua estreia na direção audiovisual. Produzida pela Gullane Filmes, Unidade Básica é inspirada em casos reais e o enredo se desenvolve nas dependências de uma UBS, onde histórias mostram como atua a medicina de família e o dia a dia de seus profissionais de saúde.
Com oito episódios, a nova temporada foi gravada em São Paulo e conta, além Ciocler e Ana Petta interpretando os protagonistas Dr. Paulo e Dra. Laura, com os atores Vinicius de Oliveira e Carlota Joaquina, que retornam com seus papéis da primeira temporada e ganham a companhia de Fabiana Gugli, Lina Mello e Gabriel Calamari. Laura volta à UBS com o objetivo de buscar um equilíbrio entre o humano e o científico ao mediar o conflito entre o não tradicional Paulo e a nova gerente, Cilene (Fabiana Gugli), que se interessa essencialmente pela produtividade.
“Eles (médicos do atendimento comunitário) sabem quem é diabético, hipertenso e atuam na ponta, na prevenção. Nos hospitais, já chega quem está doente”, comenta Ana Petta.
A segunda temporada também está mais feminina e feminista. A personagem de Ana Petta ganha protagonismo com a entrada em cena de assuntos como violência contra a mulher, aborto e doenças sexualmente transmissíveis. Segunda Ana, desde que começaram a criar o projeto, as duas amadureceram como feministas e ficaram mais atentas à urgência de se levar esses temas para a TV. “O que a pandemia nos mostra é que estas questões se agudizam no momento em que estamos vivendo”, afirma Helena Petta, que é médica infectologista formada pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (2004), com mestrado em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (2011).
A segunda temporada traz ainda um conjunto de vulnerabilidades enfrentadas pelos profissionais de saúde. “Nunca poderíamos imaginar lançar a nossa nova temporada em um momento como esse. Que cada episódio seja uma pequena homenagem aos profissionais de saúde, que estão na linha frente no combate da pandemia”, completa Ana. O projeto gerou ainda um livro sobre os bastidores da produção, Unidade Básica: a Saúde Pública Brasileira na TV. Escrita por Helena Petta, a obra será lançada pela Editora Hucitec ainda este ano. E uma terceira temporada da série já está sendo preparada e contará com um episódio sobre o início da pandemia do coronavírus.
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