A Segunda Guerra Mundial parece uma fonte inesgotável de histórias, sendo a mais recente a superprodução em forma de minissérie Mestres do Ar, que lança seus dois primeiros episódios nesta sexta-feira, 26, no Apple TV+. Os outros sete estreiam semanalmente, também às sextas.
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Baseada no livro homônimo de Donald L. Miller, que será lançado no Brasil pela Bertrand Brasil ainda em janeiro com tradução de Milton Chaves Almeida, e produzida por Steven Spielberg e Tom Hanks, fala sobre combate aéreo.
É, portanto, um complemento para as séries Irmãos de Guerra (Band of Brothers, de 2001) e O Pacífico (2010) - também produzidas pela dupla -, que renderam um total de 14 Emmys à HBO, sua casa original, e cobrem a atuação, respectivamente, da Infantaria Paraquedista na Europa e dos fuzileiros navais no Teatro de Operações do Pacífico.
Mestres do Ar, criada por John Orloff (roteirista de Irmãos de Guerra), destaca a história do 100º Grupo de Bombardeio, cujo objetivo a partir de junho de 1943 era atingir a infraestrutura de guerra alemã, ganhando superioridade aérea sobre a poderosa Luftwaffe e preparando o terreno para a invasão da Normandia no chamado Dia D, dali um ano.
Como o 100º voava seus enormes aviões B-17, com dez homens cada, durante o dia, sem escolta em princípio, o número de baixas era enorme. Em quatro meses, das 36 equipes iniciais, restaram apenas duas. Dos componentes do grupo, 77% foram mortos, feridos ou capturados.
Já que o livro de Miller trata da Oitava Frota Aérea dos Estados Unidos em geral, onde o 100º Grupo estava inserido, Orloff usou mais de 300 fontes, de livros de memórias a reportagens e documentos do governo, para escrever os roteiros.
Entre os personagens estão os amigos Gale Cleven (Austin Butler, indicado ao Oscar por Elvis, de 2022), conhecido como Buck, e John Egan (Callum Turner), apelidado Bucky. Os dois são unha e carne, mesmo sendo muito diferentes: Buck é sério, e Egan gosta de brincar e beber.
“Dizem que, na guerra, sua personalidade expande dez vezes. Se você é introvertido, você fica ainda mais. E vice-versa”, disse Turner, em entrevista ao Estadão, por videoconferência. “Os nossos personagens querem mudar o mundo, são grandes pilotos e líderes e sabem que, juntos, podem ajudar”.
As personalidades podem ser yin e yang, mas estão sempre ancoradas nessa crença de salvar o mundo. O engraçado é que Austin e eu somos bem parecidos na vida real.
Callum Turner
Barry Keoghan (que concorreu ao Oscar de ator coadjuvante por Os Banshees de Inisherin, de 2022) é o Tenente Curtis Biddick, um sujeito sem meias-palavras que ajuda Cleven em sua chegada à Inglaterra. Robert Rosenthal (Nate Mann) é um advogado que se torna um dos grandes pilotos da turma. Há também o apoio de terra, como Ken Lemmons (Rafferty Law, filho do ator Jude Law), que aos 19 anos é responsável por reparar e colocar os B-17 avariados em ordem.
A série também inclui os Tuskegee, ou Caudas Vermelhas, que eram aviadores negros em um país ainda segregado. Eles não faziam parte da Oitava Frota Aérea, mas os aviões P-51 Mustang foram fundamentais no eventual sucesso da missão do 100º, quando passaram a escoltar os B-17. Entre os homens destacados estão Alexander Jefferson (Brandon Cook), Robert Daniels (Ncuti Gatwa) e Richard Macon (Josiah Cross).
O elenco passou por um “bootcamp”, um treinamento com a supervisão do consultor dos Fuzileiros Navais dos Estados Unidos, o capitão reformado Dale Dye. No treinamento, os atores ficaram em forma, aprenderam sobre a história do conflito, como era a operação do B-17 – os aviões não eram pressurizados nem tinham aquecimento.
A produção pesquisou B-17 reais, que ainda existem, além dos projetos originais desse tipo de avião para construir duas réplicas. Também foi feito o nariz de um avião, apoiado em uma suspensão que permitia diversos movimentos.
Para filmar as cenas de batalha no ar, foi usada a tecnologia que ficou conhecida como “Volume”, uma tela de LED em forma de ferradura que cerca os atores de imagens, em vez de uma tela verde. O recurso, utilizado em Avatar, O Mandaloriano e outros, transforma alguns dos combates em uma espécie de jogo de videogame que perde na comparação com as sequências de guerra de Irmãos de Guerra e O Pacífico.
Por sorte, como nas antecessoras e no filme O Resgate do Soldado Ryan (1998), que deu origem à parceria Spielberg-Hanks no ramo produções de Segunda Guerra, o foco aqui é a camaradagem entre os combatentes.
Eles precisavam confiar uns nos outros pois sua vida estava nas mãos do homem ao lado. Por isso eles são irmãos.
Austin Butler
No “bootcamp”, o elenco praticou outras coisinhas importantes para interpretar homens dos anos 1940. “Nós aprendemos etiqueta, tivemos aulas de dança”, contou Butler. “Assim, mesmo quem não tinha diálogos fazia parte daquele mundo que estávamos criando. Não queríamos nada contemporâneo, todos precisavam viver naquele período.”
As pessoas da época comportavam-se de maneira estoica, mesmo as mais extrovertidas. “A ideia de masculinidade era outra. Era tudo diferente, ninguém falava de seus sentimentos, nem homens nem mulheres”, disse Turner.
Até por causa disso e pela falta de recursos, trauma ou estresse pós-traumático não eram mencionados, embora existissem. “Mestres do Ar humaniza esses heróis”, disse Rafferty Law. “Eles eram jovens normais, com objetivos e aspirações, mas também vulneráveis.”
Os atores sentiram a responsabilidade de fazer justiça a esses rapazes que deram a vida para derrotar o nazismo e o fascismo na Segunda Guerra Mundial. “Esses homens tiveram de estar à altura do desafio, mesmo ainda sendo meninos na idade”, disse Barry Keoghan.
“Viam seus amigos embarcarem em aviões para nem sempre voltar e tinham de estar sempre comprometidos, honrados, para fazer tudo de novo no dia seguinte. Não tenho nem como comparar com a minha vida, porque temos muitos privilégios e sistemas de apoio, e eles, não.” O ator disse que pensou muito e não sabe se seria tão rápido quanto aqueles jovens foram ao se alistar para lutar.
Como o avô de Callum Turner, que foi para o combate aos 16 anos de idade. “Mas eu não sabia da história do 100º”, disse o ator. “E é por isso que devemos contar essas histórias. Esses homens se sacrificaram por nós.”
Para Raff Law, é importante que jovens de sua geração saibam o que aconteceu. “Precisamos entender a história para compreender o que está se passando hoje e celebrar essas pessoas que deram a vida pelo bem maior.”
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